15 Julho 2015

 

O Burkina Faso vive atualmente uma crise generalizada em todo o país de casamentos forçados e precoces, de gravidezes indesejadas e de uma praticamente nula educação sexual que reduz milhares de raparigas e mulheres a cidadãs de segunda classe, alerta a Amnistia Internacional, instando as autoridades – e os candidatos às eleições presidenciais e legislativas de 11 de outubro – a encontrarem soluções urgentes.

Neste contexto, a Amnistia Internacional lança esta quarta-feira, 15 de julho, a campanha O Meu Corpo, os Meus Direitos no Burkina Faso, a qual decorre já também em El Salvador e na Irlanda. Agora, naquele país da África Ocidental, a organização de direitos humanos promove, a par dos esforços de campanha, um manifesto que insta os candidatos no próximo ciclo eleitoral no país a assumirem o compromisso de tomarem uma posição mais firme sobre os casamentos forçados e os casamentos precoces e a tornarem mais fácil para as mulheres e raparigas acederem a métodos contracetivos e a serviços e informação de saúde reprodutiva.

“Uma rapariga a crescer hoje em dia no Burkina Faso enfrenta muitos obstáculos que a impedem de realizar os seus sonhos e esperanças de vida. Ela pode ser forçada a casar pela própria família e mesmo que tenha meios para comprar métodos contracetivos, o parceiro pode recusar-se a usá-los ou não lhe permitir que ela os use”, explica o diretor regional da Amnistia Internacional para a África Ocidental e Central, Alioune Tine. “As autoridades do país negligenciam os direitos das mulheres e raparigas há demasiado tempo. Corrigir este erro e derrubar as barreiras com que as mulheres e raparigas se deparam tem de ser um objetivo central na campanha de qualquer candidato eleitoral”, defende este perito.

A igualdade de género está consagrada e protegida pela Constituição e outras leis no Burkina Faso mas, na prática, a mutilação genital feminina, os casamentos forçados e precoces e a violência doméstica são generalizados no país. Mulheres e raparigas contaram à Amnistia Internacional que as decisões sobre gravidez e casamento são frequentemente tomadas pelos homens da família. Em consequência, apenas 17% das mulheres no Burkina Faso usam métodos contracetivos e mais de 2.000 mulheres morrem durante o parto todos os anos.

Barreiras no acesso à saúde sexual e reprodutiva e a contracetivos

É extremamente comum no Burkina Faso os homens proibirem as mulheres de usarem métodos contracetivos, com ameaças violentas.

Therese, uma mulher de 23 anos que vende fruta no mercado e tem três filhos, reportou à equipa de investigadores da Amnistia Internacional: “Depois de o meu segundo filho ter nascido comecei a tomar as minhas pílulas às escondidas; tomo a pílula porque é mais barato para mim do que outros métodos. O meu marido não sabe. Ele pensa que os contracetivos causam doenças e ameaça fechar-me em casa se eu ficar doente por isso”.

Outros obstáculos para as mulheres acederem a métodos contracetivos passam pelos elevados custos e pela falta de acesso a uma educação sexual abrangente. Mariama, de 24 anos e com três filhos, descreveu como a falta de educação pode conduzir a gravidezes indesejadas: “Quando tive sexo e fiquei grávida pela primeira vez, eu não sabia que podia ficar grávida por ter sexo. Não sabia nada sobre contraceção. Depois de o meu primeiro filho nascer, fiquei grávida logo a seguir. Não usei nenhum contracetivo porque ainda não sabia o que fazer”.

Taxas alarmantes de casamentos forçados e precoces

A Amnistia Internacional sustenta que o próximo Governo eleito no Burkina Faso terá de dar resposta às alarmantes taxas de casamentos precoces no país, nomeadamente com uma reforma da legislação nacional que garanta que as leis que proíbem os casamentos precoces são cumpridas – incluindo com sanções para as famílias que forcem as raparigas a casar contra vontade.

O Burkina Faso tem a sexta mais alta taxa de casamentos precoces em África, com 52% das raparigas no país a estarem casadas aos 18 anos e quase metade delas já com filhos naquela idade.

Atente-se na história de Malaika, que fugiu de casa porque os pais a queriam obrigar a casar. Quando foi apanhada pela polícia, disseram-lhe que tinha de voltar para junto da mãe e do pai. Eis o que a jovem contou à Amnistia Internacional: “Tinha 15 anos e os meus pais queriam que casasse com um homem velho de 75. Ele é mais velho até que o meu pai e já tem três mulheres e filhas da minha idade. No dia em que me iam apresentar a esse homem, disse aos meus pais que não concordava com a escolha que eles tinham feito e que queria continuar a estudar. Os meus pais responderam-me que eu tinha de casar com o homem que eles tinham escolhido e que eu não tinha nenhuma outra opção se não a de o aceitar”.

“A Amnistia Internacional insta todos os candidatos presidenciais e às eleições legislativas que assinem o manifesto de direitos humanos e se comprometam a fazer mudanças significativas que permitam às mulheres e raparigas tomarem elas mesmas decisões fundamentais sobre os seus corpos e sobre os seus direitos sexuais e reprodutivos”, frisa Alioune Tine.

O diretor regional da Amnistia Internacional para a África Ocidental e Central avança ainda que “quem quer liderar o país para o futuro tem de pôr fim a esta discriminação contra a geração jovem”. “A infância é encurtada e raparigas e mulheres veem ser-lhes roubado o direito de tomarem decisões sobre as suas vidas e sobre os seus corpos. Hoje em dia no Burkina Faso, as mulheres e raparigas não são sempre livres de escolherem quando casam nem com quem, nem quando têm filhos nem quantos – e isto tem de mudar”, remata.

 

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