27 Julho 2016

O Presidente da Indonésia, Joko Widodo, porá a sua governação do lado errado da história caso permita que o país avance com uma nova série de execuções, avalia a Amnistia Internacional a dias de serem executadas pelo menos 14 pessoas que foram condenadas à pena de morte.

A Amnistia Internacional apurou que as 14 execuções podem ser feitas ainda antes do final desta semana e incidem sobre quatro cidadãos indonésios e dez de outras nacionalidades, incluindo um indiano, um natural do Zimbabwe, um senegalês, um sul-africano e cinco nigerianos.

“Esperava-se que a era do Presidente Widodo representasse um novo começo para os direitos humanos na Indonésia. Infelizmente, poderá antes presidir ao maior número de execuções nesta era democrática no país, num momento em que a maior parte do mundo já virou as costas a esta prática cruel”, frisa o vice-diretor da Amnistia Internacional para o Sudeste Asiático e Ásia-Pacífico, Josef Benedict.

A organização de direitos humanos recolheu relatos de que mais de uma dezena de presos que se encontram no corredor da morte podem ser executados até ao final da semana, muitos deles condenados por crimes relacionados com o narcotráfico. A Amnistia Internacional expressa profunda apreensão pelo facto de que alguns destes presos que vão enfrentar pelotões de execução foram condenados em julgamentos manifestamente injustos e que não submeteram pedidos de clemência ao Presidente.

Num relatório publicado no ano passado, a Amnistia Internacional reportou 12 casos em que foi negado aos arguidos acesso a aconselhamento jurídico quando foram detidos e em várias outras etapas dos seus processos. Algumas destas pessoas denunciaram ter sido submetidas a tortura e outros maus-tratos sob tutela da polícia e que foram forçadas a “confessar” os crimes de que eram acusados. Estas alegações não foram até à data investigadas pelas autoridades.

Vários países, como o Paquistão, já apelaram ao Governo indonésio para não avançar com esta terceira vaga de execuções. As autoridades paquistanesas pediram clemência à Indonésia para que não seja feita a execução do cidadão paquistanês Zulfiqar Ali, operário têxtil, que denunciou ter sido torturado sob custódia policial e que passou mais de uma década num corredor da morte indonésio, condenado por um crime de narcotráfico. Durante o período de prisão preventiva, foi recusado a Zulfiqar Ali contactar com a embaixada do Paquistão e só lhe foi permitido acesso a advogado cerca de um mês após a sua detenção.

“Como o caso de Zulfiqar demonstra, a lei internacional foi e está a ser repetidamente violada nos casos de pena de morte, desde o momento das detenções, ao longo dos julgamentos e na fase de recursos judiciais. Independentemente do que se pense sobre a pena capital, não se pode tomar decisões sobre a vida de ninguém com base em procedimentos tão cheios de falhas”, critica Josef Benedict.

O vice-diretor da Amnistia Internacional para o Sudeste Asiático e Ásia-Pacífico avança ainda que “a comunidade internacional deverá ficar alarmada com a reposição das execuções, e os países devem fazer-se ouvir em defesa daqueles que enfrentam a pena de morte na Indonésia”.

A decisão em retomar as execuções é também controversa no país, com oposição já expressa por líderes religiosos e deputados.

A Indonésia tem um forte historial de luta pelos direitos dos seus cidadãos que enfrentam a pena de morte em outros países, sendo essa posição não sustentada consistentemente no seu próprio território, onde o Presidente Widodo argumentou que a pena capital é precisa como fator dissuasor dos crimes de narcotráfico.

“Não existem provas nenhumas para sustentar a argumentação do Presidente Widodo. A pena de morte não é dissuasora da prática de crime. Executar pessoas não vai livrar a Indonésia das drogas. A pena capital não é nunca solução, e irá causar danos à posição da Indonésia no mundo”, sublinha Josef Benedict.

O perito da organização de direitos humanos aponta ainda que “se o presidente Widodo quer seriamente um lugar para a Indonésia no mundo e de liderança na região, não pode continuar a ignorar as suas obrigações de direitos humanos”. “E o primeiro passo nessa direção tem de ser a declaração de uma moratória às execuções visando libertar a Indonésia da injusta punição de uma vez por todas”, remata.

“Confissões” sob tortura e julgamentos injustos

As últimas execuções que ocorreram na Indonésia datam de janeiro e de abril de 2015, quando seis e oito pessoas, respetivamente, foram mortas por pelotão de execução. Durante a governação do anterior Presidente Susilo Bambang Yudhoyono o país executou 21 pessoas, entre 2005 e 2013.

Pelo menos quatro presos nos corredores da morte na Indonésia foram transferidos para a ilha-prisão de Nusakambangan nas semanas recentes, onde foram feitas 13 das 14 execuções ocorridas em 2015. Os presos no corredor da morte foram condenados por crimes relacionados com o narcotráfico e alguns deles não tiveram um julgamento justo.

Em casos que foram analisados pela Amnistia Internacional, alguns presos denunciaram que a polícia os torturou, incluindo para os forçar a fazer “confissões”. A muitos não foi permitido acesso a advogado quando foram detidos e em outras fases processuais.

No relatório “Flawed Justice: Unfair Trials and the Death Penalty in Indonesia”, publicado pela Amnistia Internacional em outubro de 2015, são destacados 12 casos de presos nos corredores da morte na Indonésia que ilustram as falhas manifestas como a justiça é aplicada no país e da qual resultam flagrantes violações de direitos humanos.

A Amnistia Internacional opõe-se à pena de morte em todos os casos sem nenhuma exceção, independentemente da natureza ou circunstâncias do crime, do apuramento de culpa ou inocência ou quaisquer outras características do indivíduo ou do método usado pelo Estado para proceder à execução.

 

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