2 Dezembro 2016

O mundialmente famoso artista chinês Ai Weiwei juntou forças à Amnistia Internacional para mobilizar centenas de milhares de pessoas por todo o globo com o objetivo de inundar a Casa Branca com mensagens de apoio a Edward Snowden, numa ação integrada na Maratona de Cartas, a maior campanha anual da organização de direitos humanos.

“Um mundo onde ninguém defende os ativistas e aqueles que denunciam abusos e violações de direitos humanos é um mundo onde ninguém assume riscos para defender o interesse público ou expor os abusos cometidos pelos governos. As pessoas têm de se unir para defender o tipo de sociedade em que querem viver”, exorta Edward Snowden, que, em 2013, divulgou a alguns órgãos de comunicação social uma série de documentos que tornaram conhecidos os programas de vigilância maciça e ilegal feita por agências de serviços secretos aos cidadãos em todo o mundo.

Por ter feito esta revelação – de enorme interesse público – é acusado de “traição” nos Estados Unidos e, não existindo nenhuma garantia de lhe ser prestado um julgamento justo no país natal, o ex-administrador de sistemas da Central Intelligence Agency (CIA) e antigo consultor da Agência de Segurança Nacional norte-americana (NSA) vive atualmente em exílio na Rússia. “Ao revelar a verdade sobre as práticas de vigilância global maciça, Edward Snowden deu início a uma das maiores batalhas de direitos humanos do século XXI. Sem ele, o mundo continuaria na ignorância sobre uma colossal invasão de privacidade. E, com o que ele fez, assistimos agora a um emergente movimento global que luta pelos direitos humanos online”, frisa o secretário-geral da Amnistia Internacional, Salil Shetty.

“O preço de expor um abuso de poder não pode ser o exílio. O Presidente [dos Estados Unidos, Barack] Obama tem de ouvir as vozes que ecoam pelo mundo inteiro em apoio a Snowden. Estas pessoas querem viver num mundo onde conseguem manter privados os detalhes íntimos das suas vidas e onde ninguém é perseguido por expor abusos de direitos humanos”, prossegue.

O secretário-geral da Amnistia Internacional reitera que “Snowden agiu claramente no interesse público tanto das pessoas nos Estados Unidos como de todo o mundo”. “As autoridades norte-americanas nunca sequer o deviam ter acusado. Ao perdoá-lo, o Presidente Obama pode terminar o seu mandato [na Casa Branca] a romper com um pérfido padrão de chefes de Estado norte-americanos que põem o sigilo governamental acima dos direitos humanos”, sublinha ainda.

A Amnistia Internacional considera, desde o início do caso, que Edward Snowden agiu no interesse público na denúncia de práticas ilegais pelo Estado e sustenta que ninguém deve ser acusado por revelar informações sobre violações de direitos humanos. Conjuntamente, a American Civil Liberties Union, a Human Rights Watch e a Amnistia Internacional lançaram, em setembro passado, a campanha global PardonSnowden.org, com uma petição (nos Estados Unidos e no mundo inteiro) que insta o Presidente Obama a emitir um perdão a Snowden antes de terminar o seu mandato, em janeiro próximo.

Edward Snowden enfrenta a possibilidade de ser condenado a uma pena de décadas de prisão, ao abrigo de leis de espionagem que datam da I Guerra Mundial e que equiparam o ato de denúncia no interesse público à venda de informações secretas a inimigos estrangeiros dos Estados Unidos. Sem a garantia de um julgamento justo e uma defesa legal assente no argumento de interesse público, Snowden não tem nenhuma outra escolha senão a de permanecer no limbo na Rússia.

Ai Weiwei apoia a campanha de direitos humanos

Ai Weiwei criou novos 11 retratos da sua famosa série LEGO, um para cada um dos casos da edição de 2016 da Maratona de Cartas (são quatro que estão a ser trabalhados pela Amnistia Internacional Portugal). A partir desta sexta-feira, 2 de dezembro, até dia 16, o artista chinês junta-se a centenas de milhares de apoiantes e ativistas da Amnistia internacional que, a partir de todo o mundo, enviam mensagens em defesa de vítimas de abusos de direitos humanos e instam à ação líderes mundiais como o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, e o Presidente da indonésia, Joko Widodo.

“Participo nesta campanha para dar o meu apoio a pessoas que sofreram e estão a sofrer por dizerem ou fazerem coisas que não agradam aos seus governos. Como artista, a liberdade de expressão é essencial para o meu trabalho e sei, pela minha própria experiência, o que acontece quando tal entra em conflito com o que as autoridades querem e como o apoio global é importante quando o Estado nos tenta silenciar. Permitir que as pessoas se expressem livremente é o que determina a diferença entre uma sociedade moderna e uma sociedade bárbara”, explica Ai Weiwei.

No ano passado, foram enviadas por pessoas em mais de 200 países e territórios mais de 3,7 milhões de cartas, emails, mensagens de telemóvel, faxes, tweets e outras mensagens na Maratona de Cartas – em defesa de outras pessoas e comunidades, do México à Birmânia (Myanamar) –, fazendo desta campanha a maior iniciativa coletiva de direitos humanos no mundo.

Em 2016, a Maratona de Cartas volta a pôr em destaque casos de indivíduos e comunidades em risco de abusos de direitos humanos ou que vivem já numa situação de violação dos seus direitos – em Portugal são quatro os casos:

  • Mahmoud Abu Zeid/“Shawkan”, fotojornalista egípcio, foi detido quando cobria uma manifestação na capital do país, Cairo, a 14 de agosto de 2013, e na qual registou a intervenção brutal por parte das forças de segurança. Foi torturado na prisão e é visado com nove acusações forjadas que o põe em risco de ser condenado à pena de morte caso seja dado como culpado. O seu julgamento tem sido repetidas vezes adiado ao longo dos últimos três anos e meio e contraiu hepatite C, não lhe tendo sido permitido acesso a nenhum tratamento médico na prisão. A Amnistia Internacional insta as autoridades egípcias a anularem todas as acusações contra “Shawkan” e a o libertarem imediatamente.

  • Eren Keskin, advogada e ex-diretora de um jornal na Turquia, é uma muito conhecida voz crítica das autoridades turcas e firme defensora dos direitos da minoria curda no país. Devido ao seu ativismo e trabalho na defesa dos direitos humanos é consistentemente intimidada pelo Estado e já foi visada em mais de cem processos, tendo mesmo sido presa durante seis meses por ter escrito “Curdistão” num artigo. Está em risco permanente de ser julgada e condenada a longas penas de prisão pelo simples exercício da liberdade de expressão e ativismo. A Amnistia Internacional exorta as autoridades turcas a anularem todas as acusações contra Eren Keskin e a se absterem de a deterem e condenarem.

  • Edward Snowden, ex-administrador de sistemas da CIA e antigo consultor da NSA, divulgou em 2013 a alguns órgãos de comunicação social uma série de documentos que tornaram conhecidos os programas de vigilância maciça e ilegal feita pelas agências de serviços secretos aos cidadãos por todo o mundo – mobilizando as pessoas e empresas de tecnologia a uma maior consciencialização do direito à privacidade e de proteção dos dados privados. É acusado nos EUA de “traição”, não existindo nenhuma garantia de lhe ser prestado um julgamento justo no país natal, e vive em exílio na Rússia. A Amnistia Internacional urge a que Edward Snowden seja perdoado e reconhecido como tendo agido em defesa do interesse público.

  • Annie Alfred, criança malawi com albinismo, vive em constante situação de risco e medo apenas por ter nascido com características hereditárias de pigmentação que fazem com que a sua pele e cabelos sejam claros. O Malawi regista um aumento drástico no número de raptos e homicídios de pessoas com albinismo, cujas partes do corpo são usadas em práticas rituais devido a crenças de que trazem riqueza e boa-sorte e que os seus ossos contêm ouro. A Amnistia Internacional exige às autoridades do Malawi que protejam as pessoas com albinismo e que os perpetradores de crimes contra elas sejam julgados e punidos.

“A Amnistia Internacional mobiliza as pessoas a assumirem a injustiça como uma afronta pessoal e há muito poucas formas tão diretas de agir como a de pegar numa caneta e escrever uma carta para dizer a alguém que deu mostras de coragem que também estamos com ela ou para alertar alguém que tem poder e autoridade de que as estamos a observar”, sublinha Salil Shetty. “Esta nossa campanha envia a mensagem ao mundo de que as pessoas estão prontas para confrontar os abusos de poder, onde quer que estes ocorram. É nosso dever trazer as injustiças à luz, de forma aos governos não poderem olhar para o lado”, remata o secretário-geral da Amnistia Internacional.

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