20 Fevereiro 2019

62 pessoas, incluindo ativistas do Movimento Independentista de Cabinda (MIC), foram detidas, de forma arbitrária e ilegal, pelas forças de segurança angolanas, entre os passados dias 28 de Janeiro e o primeiro dia deste mês na província de Cabinda, em Angola. As detenções aconteceram em três momentos distintos mas demonstram, todos eles, que as autoridades angolanas ainda têm um longo caminho a percorrer no respeito pelos direitos humanos.

No dia 28 de Janeiro, oito ativistas do MIC foram detidos pelas forças de segurança angolanas em suas casas por estarem a preparar panfletos em antecipação da manifestação pacífica, marcada para o dia 1 de fevereiro, que assinalou os 134 anos da assinatura do Tratado de Simulambuco.

Um dia depois, a 29 de Janeiro, mais vinte pessoas, incluindo membros da família e colegas dos oito militantes, foram detidos por estarem a manifestar-se, de forma ordeira e pacífica, em frente ao Serviço de Investigação Criminal em Cabinda, exigindo a libertação dos jovens.

Apesar das 28 detenções, no dia 1 de fevereiro acabou por se realizar a manifestação para comemorar a assinatura do Tratado de Simulambuco e reiterar o apelo de independência de Cabinda em relação a Angola. Durante o protesto, também se pediu a libertação dos 28 elementos detidos, mas de nada resolveu. Pior, a polícia acabou por prender mais 34 manifestantes. Nos dias seguintes, o Ministério Público angolano requereu a sua detenção pré julgamento acusando-as dos crimes de associação criminosa, rebelião, ultraje ao Estado, resistência e distúrbios públicos.

A repressão das autoridades aos manifestantes pacíficos em Cabinda põe em causa os direitos à liberdade de expressão e reunião pacífica em Angola e como tal, a Amnistia Internacional apela a que as autoridades libertem imediata e incondicionalmente as pessoas detidas exclusivamente por exercerem pacificamente seus direitos à liberdade de expressão e reunião pacífica.

 

O caso de José Fernando Lelo

Esta não é, contudo, uma situação nova em Angola. A Amnistia Internacional tem acompanhado, há vários anos, casos de pessoas detidas e intimidadas em Cabinda pelo governo devido ao seu trabalho de ativismo e defesa dos direitos humanos.

Em novembro de 2007 o jornalista José Fernando Lelo foi detido, no seu local de trabalho nos arredores de Cabinda, e mantido 90 dias numa prisão militar em Luanda, sem que fosse formalmente acusado.Foi acusado de se ter reunido com militares com a intenção de planearem uma rebelião e, de forma ilegal, julgado num tribunal militar (o que nunca deveria ter acontecido, pois não pertencia às Forças Armadas).

O tribunal não conseguiu fazer prova do suposto encontro e baseou a sua sentença em declarações de militares obtidas sobre tortura. Em setembro de 2008, Fernando Lelo foi, assim, condenado a 12 anos de prisão por “atentar contra a segurança nacional” e “incitar a rebelião”. Acabou por ser libertado a 21 de agosto de 2009.

 

E a detenção de outros quatro ativistas

Em janeiro de 2010 foram detidos quatro ativistas angolanos devido a um ataque à seleção de futebol do Togo em Cabinda que teve como consequência a morte de duas pessoas e vários feridos. Os quatro homens, incluindo os prisioneiros de consciência Francisco Luemba e Raul Tati, foram condenados a penas de prisão de entre três e seis anos pelo Tribunal Provincial de Cabinda na sequência do ataque de Janeiro, acusados de “outros atos contra a segurança do Estado”.

Na altura, Muluka-Anne Miti, investigadora para a Angola da Amnistia Internacional, foi assertiva na sua defesa: “Estes homens devem ser libertados a menos que sejam acusados de um crime reconhecível e que tenham um julgamento justo”. Os ativistas acabaram por ser libertados em final de dezembro do mesmo ano.

 

 

 

© Nichole Sobecki for The Washington Post/Getty Images

 

Apelos da Amnistia a Angola e Portugal

No âmbito das eleições em Angola em agosto de 2017, a Amnistia Internacional apelou a que o novo presidente guiasse o país para fora da espiral de opressão que manchou os 37 anos do governo de José Eduardo dos Santos. Deprose Muchena, diretor do escritório regional da Amnistia Internacional na África Austral, relembrou que “durante décadas, os angolanos viveram num clima de medo, em que qualquer protesto tinha como resposta a intimidação, a prisão e o desaparecimento forçado”.

As críticas ao governo foram consideradas como um crime contra a segurança e usadas para deter ativistas e opositores. As leis criminais sobre a difamação foram também utilizadas regularmente para silenciar os críticos do Governo, em particular os jornalistas e académicos, enquanto a Lei dos Crimes contra a Segurança do Estado foi utilizada para justificar detenções arbitrárias dos que mostraram qualquer forma de dissidência.

Tendo em conta que Portugal é um país com ligações históricas a Angola, a Amnistia Internacional reiterou, na cerimónia realizada pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, a 7 de fevereiro de 2018, para assinalar os três anos de mandato de Portugal no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (CDHONU), que Portugal poderia ter feito mais durante o mandato no triénio 2015-2017 para pressionar à abolição da pena de morte na Guiné Equatorial e para se promover o respeito dos direitos humanos em Angola e Moçambique.

O clima de perseguição e intimidação de qualquer pessoa que se demonstre crítica do governo tem de cessar. Angola deve respeitar o trabalho de ativismo e defesa de direitos humanos no seu país.

 

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