17 Abril 2020

Milhões de pessoas estão em risco de fome, nos países da África Austral, devido às regras impostas para conter a propagação da pandemia de COVID-19. O alerta foi dado, hoje, pela Amnistia Internacional, que pede aos governos da região que adotem, de forma urgente, medidas de proteção social para garantir o direito à alimentação.

“A maioria das pessoas vive em precariedade – o que significa que não pode ficar em confinamento durante uma semana e muito menos um mês, pois não tem meios financeiros de poupança”

Deprose Muchena, diretor para a África Oriental e Austral da Amnistia Internacional

Para enfrentar esta situação, podem ser atribuídos subsídios a quem vive em situação de pobreza ou fornecidos géneros àqueles que não conseguem ter meios de subsistência alimentar.

“Com a desigualdade e o desemprego tão elevados na África Austral, a maioria das pessoas vive em precariedade – o que significa que não pode ficar em confinamento durante uma semana e muito menos um mês, pois não tem meios financeiros de poupança”, lembra o diretor para a África Oriental e Austral da Amnistia Internacional, Deprose Muchena.

Grande parte das pessoas vive da economia informal. Por exemplo, são vendedores ambulantes ou executam trabalhos manuais. Sob o atual regime de bloqueio, estas funções são consideradas não-essenciais e os trabalhadores estão proibidos de laborar. O resultado é a ausência de rendimentos para satisfazer necessidades básicas, como a compra de comida.

Embora as viagens aos supermercados sejam permitidas, quem é encontrado a circular nas ruas está a ser criminalizado e, às vezes, atacado pelas forças de segurança.

Uso ilegal da força

Em toda a região, polícias e militares foram mobilizados para monitorizar a circulação nas ruas e garantir que as medidas de combate à COVID-19 implementadas pelos governos estão a ser cumpridas. No entanto, há relatos de uso de força desproporcional, incluindo espancamentos e outras formas de humilhação pública, como obrigar as pessoas a gatinharem. Em alguns casos, os efetivos são acusados de entrar em casas e agredir os moradores.

“Atualmente, muitos estão a ser forçados a escolher entre cumprir as medidas de isolamento e passar fome ou sair para terem acesso a alimentos e serem punidos por isso”

Deprose Muchena, diretor para a África Oriental e Austral da Amnistia Internacional

Na Zâmbia, pessoas foram espancadas indiscriminadamente nas ruas. O porta-voz da polícia, Esther Katongo, afirmou na televisão nacional que os agentes estão a adotar uma estratégia de “bater” e “deter” qualquer transeunte. “Batemos, batemos, depois detemos. Quem consegue escapar, tem sorte”, disse na entrevista.

No Zimbábue, as forças de segurança invadiram o mercado de Sakubva, em Mutare, ao amanhecer do dia 3 de abril, fazendo com que mais de 300 vendedores de vegetais fugissem e deixassem os produtos para trás. A polícia realizou o ataque, apesar de o setor agrícola ter sido apontado como um serviço essencial durante o estado de emergência de 21 dias. Mais tarde, os alimentos foram destruídos e os vendedores ainda não foram compensados ​​. De acordo com o Programa Alimentar Mundial, cerca de 4,3 milhões de pessoas precisavam urgentemente de ajuda no país, antes da pandemia.

Em Moçambique, a emissora de televisão local STV também registou casos de polícias acusados ​​de tirar proveito do atual momento para invadir e roubar lojas. Em Angola, vários incidentes com violência policial foram relatados desde que as forças de segurança foram mobilizadas para as ruas com o objetivo de garantir o cumprimento público da resposta nacional contra a COVID-19.

Meios de subsistência ameaçados

Mulheres, crianças e outros grupos vulneráveis, como as pessoas com deficiência, estão a ser especialmente afetados pelas medidas restritivas.

“Sem o apoio do governo, pode ser uma questão de vida ou de morte para aqueles que vivem em situação de pobreza. Atualmente, muitos estão a ser forçados a escolher entre cumprir as medidas de isolamento e passar fome ou sair para terem acesso a alimentos e serem punidos por isso”, expõe Deprose Muchena.

Em Alexandra, uma cidade a norte de Joanesburgo, na África do Sul, as ruas foram tomadas a 14 de abril por habitantes que diziam ter fome. Depois de algumas organizações não-governamentais terem prometido distribuir comida, formou-se uma fila. Uma mulher afirmou à estação televisiva eNCA: “Queremos comida. Não vamos a nenhum sítio. Ficaremos aqui até ao meio dia. O vírus pode estar aqui, não nos importamos”. Outra mulher acrescentou: “Queremos comer. Temos fome. As medidas devem ser suspensas. Queremos voltar a trabalhar. Vendemos tomates e batatas, mas agora é impossível e temos de ganhar a vida. Queremos comida, queremos comer”.

Em Madagáscar, um dos países mais pobres do mundo, crescem as preocupações em relação ao acesso à alimentação. O preço dos produtos básicos aumentou e há receios de que cresça a tensão nas ruas, à medida que as pessoas estão cada vez mais apreensivas com os seus meios de subsistência. Por exemplo, trabalhadores de triciclos protestaram contra o bloqueio na cidade de Tamatave, no nordeste do país, tendo sido registados confrontos com a polícia. Todos vivem de salários diários.

De acordo com relatos da imprensa, no Botswana, trabalhadores e pequenas empresas do setor informal estão a enfrentar consequências económicas devastadoras. Entre os mais afetados estão motoristas de autocarros, pessoas que lavam carros, vendedores ambulantes e de rua que não conseguem ter fontes de rendimento. Aproximadamente 20 por cento da população está desempregada e sem a necessária proteção social.

 

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