2 Julho 2020

É já nesta sexta-feira, dia 3 de julho, que decorre, em Istambul, a última audiência do longo e injusto julgamento de um grupo de 11 ativistas e defensores de direitos humanos, incluindo dois antigos responsáveis da Amnistia Internacional Turquia, cuja acusação foi inteiramente sustentada em falsas acusações de terrorismo.

Ao longo das últimas 11 audiências, as acusações feitas contra todos os arguidos foram repetida e categoricamente refutadas, inclusivamente através de provas providenciadas pelo próprio Estado. A acusação fracassou repetidamente na apresentação de quaisquer provas que substanciassem as alegações feitas, que procuravam transformar atividades legítimas de defesa dos direitos humanos em atos ilegais ligados a terrorismo.

“Desde o início, este julgamento teve motivações políticas, como muitos outros contra defensores dos direitos humanos, jornalistas, advogados, académicos e ativistas”

Idil Eser, antiga diretora-executiva da Amnistia Internacional Turquia

Três anos depois, é esperado um veredicto no caso destes 11 ativistas e defensores dos direitos humanos, que podem enfrentar até 15 anos de prisão. A Amnistia Internacional defende que só a absolvição garante justiça e acredita que a forte mobilização e ação conjunta feita ao longo destes anos, em Portugal e por todo o mundo, possa surtir efeito e que as autoridades turcas compreendam que o mundo está atento.

“Desde o início, este julgamento teve motivações políticas, como muitos outros contra defensores dos direitos humanos, jornalistas, advogados, académicos e ativistas”, afirma Idil Eser, antiga diretora-executiva da Amnistia Internacional Turquia, que está entre os defensores dos direitos humanos em julgamento.

“Estes processos visam silenciar quem está no banco dos réus e enviar uma mensagem para o resto da sociedade: ao lutar pelos direitos humanos ou falar a verdade, as pessoas estão por sua conta e risco. Esperamos o melhor, mas estamos prontos para o pior”, partilha Idil Eser.

O processo

Após mais de 14 meses na prisão, o ex-presidente e agora presidente honorário da Amnistia Internacional Turquia, Taner Kılıç, foi libertado sob fiança, em agosto de 2018.

Oito dos restantes acusados passaram quase quatro meses atrás das grades, antes de serem libertados, em outubro de 2017.

Contudo, milhares de outras pessoas têm sido vítimas da profunda e abrangente repressão da dissidência da Turquia, permanecendo na prisão.

“A sentença é importante, não apenas para estas 11 pessoas e para as suas famílias, mas para todos aqueles que valorizam os direitos humanos, na Turquia e não só”

Nils Muižnieks, diretor para a Europa da Amnistia Internacional

Na décima sessão do julgamento, em novembro de 2019, foi solicitada a absolvição de cinco dos 11 ativistas e condenações para os restantes seis.

“A sentença é importante, não apenas para estas 11 pessoas e para as suas famílias, mas para todos aqueles que valorizam os direitos humanos, na Turquia e não só. Não importa onde vive, não importa qual é o governo que o governa, mas, um dia, talvez seja necessário que os seus direitos sejam defendidos”, lembra Nils Muižnieks, recém-nomeado diretor para a Europa da Amnistia Internacional.

“Os olhos do mundo vão estar no tribunal, em Istambul. Qualquer decisão que não seja a absolvição dos 11 ativistas provocaria arrepios na espinha daqueles que acreditam no ativismo pacífico da sociedade civil. Mas, aconteça o que acontecer com os nossos amigos e colegas envolvidos no caso Büyükada, continuaremos a lutar por justiça para todos na Turquia”, garante Nils Muižnieks.

Mobilização em Portugal

Desde 2017, a Amnistia Internacional Portugal tem desenvolvido diversas ações de advocacia política e mobilização pública.

O Parlamento português, em sessão plenária no dia 7 de julho desse ano, aprovou por unanimidade uma declaração em que era expressa preocupação pelas detenções de Taner Kılıç, Idil Eser e dos outros defensores de direitos humanos na Turquia.

A organização fez também várias ações de visibilidade e mobilização, tendo prendido a grades, de forma simbólica, todos os presidentes da Amnistia Internacional Portugal, em frente ao edifício da Assembleia da República, organizado vigílias por estes ativistas, realizado projeções em espaços públicos e dinamizado várias petições.

Contexto

O presidente da direção da Amnistia Internacional Turquia, Taner Kılıç, foi detido a 6 de junho de 2017 e, três dias depois, era-lhe decretada prisão preventiva com base em acusações infundadas de ligações ao movimento Gülen.

A 5 de julho de 2017, a então diretora-executiva da Amnistia Internacional Turquia, Idil Eser, foi detida, juntamente com outros nove defensores de direitos humanos e peritos em segurança e informação digital, durante um workshop que decorria em Büyükada, na província de Istambul.

Numa audiência a 26 de outubro desse mesmo ano, o juiz aceitou o requerimento do procurador para que Taner Kiliç fosse incluído como arguido neste caso, que inicialmente visava apenas os “10 de Istambul”.

Em novembro de 2019, o Ministério Público da Turquia pediu condenações contra Taner Kılıç, por “pertencer a uma organização terrorista”, e Idil Eser, Özlem Dalkıran, Günal Kurşun, Veli Acu e Nejat Taştan, por “ajudarem conscientemente e voluntariamente um organização terrorista”. Quanto a Nalan Erkem, İlknur Üstün, Şeyhmus Özbekli, Ali Gharavi e Peter Steudtner, foi solicitada a absolvição.

Na última audiência, em fevereiro, sete dos defensores dos direitos humanos e os respetivos advogados apresentaram as declarações finais de defesa.

Na sessão agendada para esta sexta-feira, dia 3 de julho, os restantes quatro arguidos e as suas defesas também vão apresentar as declarações finais, antes de ser anunciado o veredicto.

Nos últimos três anos, mais de dois milhões de pessoas pediram justiça pelos 11 ativistas. Entre as personalidades que assinaram cartas abertas estão: Edward Snowden, Catherine Deneuve, Ai Weiwei, Angélique Kidjo, Anish Kapoor, Peter Gabriel, Zoë Kravitz, Nazanin Boniadi, Don Cheadle, Marisa Tomei, Adam McKay, Paul Haggis, Joshua Malina, Fisher Stevens, Claire Danes, Ben Stiller, Whoopi Goldberg, Mike Farrell, Eva Orner, Peter Sarsgaard, Tim Roth, Kathy Najimy, Mark Ruffalo, Zach Galifianakis, Bruce Cohen, Shira Piven, Mike White, Tim Kring, James McAvoy, Francois Morel, Elif Shafak, Bianca Jagger, Juliet Stevenson, Juliette Binoche, Jane Birkin, Isabelle Huppert e Tanita Tikaram.

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