29 Setembro 2009

Um novo relatório da Amnistia Internacional revela que, apesar da presença das forças de segurança das Nações Unidas nos campos de refugiados no leste do Chade, as mulheres e raparigas refugiadas do Darfur, Sudão, enfrentam diariamente um elevado risco de violação sexual e de outras formas de agressão, tanto no interior, como no exterior, dos campos.

Em No Place for Us: Violence Against Women in Eastern Chad, a Amnistia Internacional documenta violações sexuais e outros tipos de violência contra mulheres e raparigas nos campos de refugiados. Os ataques são levados a cabo por aldeões que vivem nas proximidades e por membros do Exército Nacional do Chade. 
 

“A violação sexual que inúmeras mulheres experienciaram no Darfur continua a assombrá-las no leste do Chade”, afirmou Tawanda Hondora, Directora Adjunta do Programa para África da Amnistia Internacional. 

“Estas mulheres fugiram do Darfur esperando que a comunidade internacional e as autoridades do Chade lhes oferecessem protecção e segurança. Essa protecção provou ser uma ilusão e elas continuam a ser atacadas”. 

O relatório afirma que as raparigas refugiadas também são vítimas de assédio sexual por parte dos professores das escolas do campo onde se encontram. Algumas raparigas alegaram que o professor as ameaçava com notas baixas se estas se recusassem a ter relações sexuais, o que levou algumas alunas a abandonar a escola.  

“Muitas pessoas sabem que as mulheres que se aventuram no exterior dos campos de refugiados do leste de Chade para recolher lenha e água enfrentam assédio e violação sexual”, disse Tawanda Hondora. “O que as pessoas não percebem é que dentro do campo também existe pouca segurança para as mesmas mulheres. Elas enfrentam o risco de violação e outros tipos de violência pelas mãos de familiares, de outros refugiados e do staff das organizações humanitárias, cuja função é providenciar-lhes assistência e apoio”. 

À Détachement Intégré de Sécurité (DIS ou Unidade de Segurança Interna), uma força policial do Chade apoiada pela MINURCAT – Missão das Nações Unidas na República Centro Africana e Chade, foi dada a responsabilidade específica de garantir a segurança dentro e em redor dos campos de refugiados, estando agora plenamente implantada, com mais de 800 funcionários em 12 campos de refugiados no leste do Chade. 

No entanto, os membros da DIS têm sido alvo de violência e alguns dos seus oficiais cometeram violações dos direitos humanos eles próprios. 

A maioria das mulheres e raparigas refugiadas não sentem que a Unidade de Segurança Interna tenha feito muito para diminuir a insegurança que enfrentam. 

“A Unidade de Segurança Interna passa muito tempo a proteger-se a si mesma. Até os soldados das Nações Unidas têm de protegê-los. Ninguém tem tempo para nos proteger”, disse uma mulher entrevistada pelos investigadores da Amnistia Internacional no campo de refugiados de Gaga. 

Os perpetuadores das violações sexuais e de outros actos de violência contra as mulheres e raparigas no leste do Chade raramente são levados a tribunal. Tal acontece mesmo quando as sobreviventes apresentam queixa das violações sexuais ou outras agressões das quais foram vítimas às autoridades do Chade, à Unidade de Segurança Interna ou aos líderes do campo de refugiados. 

“A cultura de impunidade profundamente enraizada no leste do Chade – especialmente no que diz respeito à violação sexual e outras agressões contra a mulher – tem de acabar imediatamente,” afirmou Tawanda Hondora. 

O uso de métodos tradicionais de resolução de litígios para a “negociação” de acordos, nos casos de violação e outros tipos de violência contra as mulheres e as raparigas, ajuda a perpetuar a impunidade e promove a violência. 

Uma jovem de 13 anos do campo de refugiados de Farchana foi violada por um enfermeiro que trabalhava para uma organização que gere os centros de saúde no campo. Ficou grávida devido à violação e deu à luz em Janeiro. O trabalhador humanitário aceitou a responsabilidade da gravidez e realizaram-se negociações após as quais foi acordado o casamento e o pagamento do dote à família. Mais tarde o enfermeiro viria a fugir. Apesar da reclamação apresentada junto de oficiais do Chade, até Maio de 2009 não parece ter havido qualquer esforço para encontrar o fugitivo, nem teve início qualquer processo legal ou acusação. 

A Amnistia Internacional afirmou que não é possível saber o número exacto de mulheres e raparigas que foram vítimas de violações sexuais e outras formas de violência dentro e fora dos campos de refugiados do leste do Chade, uma vez que as mulheres raramente apresentam queixa, principalmente devido ao medo do estigma, por vezes oriundo dos próprios membros das suas famílias, e a traumas. 

“Mulheres casadas que foram violadas são frequentemente evitadas ou abandonadas pelo marido, enquanto as raparigas e as jovens mulheres que foram violadas encontram frequentemente dificuldade em casar. Como resultado, a maioria das mulheres e raparigas escolhe manter o silêncio sobre a violação sexual de que foi vítima, de modo a evitar as consequências sociais negativas – o que significa que os perpetuadores saem impunes”, disse Tawanda Hondora.  

A Amnistia Internacional apelou ao Governo do Chade e à Comunidade Internacional para que sejam tomadas medidas efectivas e imediatas para lidar com a violação generalizada e sistemática, além de outras formas de violência contra mulheres e meninas refugiadas do Darfur no leste do Chade. 

“Deve ser posto em prática um plano esclarecedor e abrangente que deixe claro que violações e violência sexual são crimes inaceitáveis e deve ser aplicada legislação pertinente prevista no Chade”, afirmou Tawanda Hondora. “O plano deve contemplar o espectro de circunstâncias que colocam mulheres e raparigas em risco de violação sexual e outras formas de violência dentro e fora do campo de refugiados. Deve ainda contar quais as medidas que as autoridades nacionais e internacionais podem tomar para proteger mulheres destes terríveis crimes”.  

 

Nota:
-O leste do Chade abriga aproximadamente 260.000 refugiados do Darfur, a maioria são mulheres e crianças e muitas delas encontram-se nesta zona há mais de cinco anos. Os refugiados residem em 12 campos diferentes, espalhados ao longo da fronteira entre o Chade e o Darfur. 

-Durante os últimos seis anos, mais de 142.000 mulheres e raparigas fugiram da insegurança e das violações generalizadas aos direitos humanos na região problemática do Darfur, no Sudão, procurando segurança e protecção no vizinho Chade.

– A MINURCAT – Missão das Nações Unidas na República Centro Africana e Chade foi implementada no leste do Chade em Setembro de 2007, com o objectivo de contribuir para a protecção dos refugiados. 

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