24 Fevereiro 2016

Relatório Anual 2016 Amnistia Internacional

O ano de 2015 ficou marcado por um ataque global às liberdades, que deixou os direitos humanos e as leis e sistemas que os protegem em elevado risco. Mas houve também ganhos, em todas as regiões do globo, no exercício dos direitos humanos e na reparação devida àqueles que foram vítimas de abusos.

Sucessos globais

A Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou em dezembro a Resolução sobre os Defensores dos Direitos Humanos, com o apoio de mais de 190 organizações não-governamentais (ONG), incluindo a Amnistia Internacional. Numa altura em que os defensores de direitos humanos estão sob crescente pressão no contexto da cada vez maior repressão da sociedade civil em muitas partes do mundo, esta resolução exorta à responsabilização pelos ataques perpetrados contra estas pessoas e insta os Estados a libertarem todos quantos estão detidos arbitrariamente por exercerem os direitos fundamentais de liberdade de expressão e de reunião pacífica.

Três países aboliram a pena de morte em 2015: em janeiro, Madagáscar aboliu a pena capital para todos os crimes; seguiram-se as ilhas Fiji em fevereiro; em março, o Suriname removeu também a pena de morte de toda a sua legislação.

África

  • Ao fim de muitos anos de pressão da Amnistia Internacional e seus apoiantes e ativistas, a empresa subsidiária da Shell na Nigéria anunciou, em janeiro, o acordo de pagamento de uma indemnização no valor de 55 milhões de libras (cerca de 70,1 milhões de euros) aos agricultores e pescadores da região de Bodo, cujas vidas foram devastadas por dois enormes derrames de petróleo, em 2008 e 2009.
  • O Presidente da Zâmbia, Edgar Lungu, comutou a pena capital a todas as 332 pessoas que se encontravam nos corredores da morte na Prisão de Segurança Máxima de Mukobeko, em Kabwe, para prisão perpétua, em julho.
  • O nigeriano Moses Akatugba, que se encontrava no corredor da morte, foi perdoado em maio ao fim de quase dez anos na prisão. Fora torturado para confessar um crime que diz não ter cometido. Mais de 800 000 ativistas da Amnistia Internacional enviaram petições às autoridades nigerianas reivindicando justiça.
  • No Sudão, o Tribunal de Recurso anulou em outubro a condenação de Ferdous al-Toum, uma adolescente que fora dada como culpada em instância inferior por “vestir-se de forma indecente ou imoral” e condenada a 20 chicotadas e a uma multa de 500 libras sudanesas (cerca de 74 euros). Crê-se que a decisão judicial no recurso se deve, em parte, à pressão e ativismo internacional.
  • Os últimos quatro arguidos do caso dos “bloggers da Zona 9” na Etiópia, visados com acusações de terrorismo pelo que escreveram e publicaram, foram absolvidos em outubro. Os primeiros cinco arguidos no caso foram libertos ainda em julho.

Américas

  • As conversações de paz na Colômbia entre o Governo e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) continuaram a fazer significativos progressos ao longo do ano, aumentando as expetativas de que o conflito armado no país, que se arrasta há 50 anos, possa terminar em breve. A Amnistia Internacional continua a monitorizar os aspetos de direitos humanos nestes desenvolvimentos no país.
  • Carmen Guadalupe Vásquez recebeu finalmente indulto e foi liberta da prisão em El Salvador, em fevereiro. Fora condenada em 2007 a uma pena de 30 anos de prisão sob acusações forjadas e depois de ter sofrido um aborto espontâneo quando tinha 18 anos. O tribunal condenou-a considerando-a culpada de interrupção voluntária da gravidez, o que é proibido em todas as circunstâncias em El Salvador.
  • No México, Claudia Medina viu serem-lhe anuladas em fevereiro as últimas acusações pendentes contra ela. Claudia Medina fora torturada e forçada a fazer uma confissão falsa em 2012. Apoiantes e ativistas da Amnistia Internacional tomaram ação no mundo inteiro em defesa desta mulher mexicana que foi um dos casos em foco na campanha STOP Tortura da organização de direitos humanos.
  • Ao fim de 13 anos de detenção na prisão militar norte-americana de Guantánamo sem jamais lhe serem formuladas acusações nem ser levado a julgamento, Shaker Aamer, foi liberto, em outubro. Foi uma das primeiras pessoas a serem levadas para o infame centro de detenção, em 2002, e o último que fora residente no Reino Unido a permanecer em Guantánamo. Apoiantes e ativistas da Amnistia Internacional fizeram campanha pela sua libertação ao longo de mais de dez anos.
  • O prisioneiro de consciência e graffiter cubano Danilo Maldonado Machado foi liberto da prisão, em Havana, em outubro. Esteve preso durante quase um ano por ter pintado os nomes “Raúl” e “Fidel” em dois porcos. Espera-se que a sua libertação marque o início de uma nova abordagem no país à liberdade de expressão e dissidência.

Ásia-Pacífico

  • O Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas adotou, em outubro, uma resolução crucial que fornece às vítimas do conflito armado no Sri Lanka a expectativa de finalmente obterem verdade e justiça. Esta resolução reconhece que foram cometidos crimes terríveis por ambas as partes envolvidas no conflito.
  • O Supremo Tribunal da Índia derrubou a Lei de Tecnologias da Informação, em março, a qual tinha sido usada para acusar e levar a julgamento várias pessoas, incluindo ativistas e críticos do Governo apenas por expressarem as suas opiniões online. A decisão do Supremo constitui uma vitória fundamental para a liberdade de expressão na Índia.
  • O Parlamento da Mongólia aprovou, em dezembro, um novo Código Penal, no qual fica abolida a pena de morte para todos os crimes. Estanova legislação entra em vigor em setembro de 2016.
  • Ao fim de mais de dois anos de pressão e ações de campanha por parte de apoiantes e ativistas da Amnistia Internacional, o líder comunitário Tun Aung foi liberto em Myanmar (Birmânia) em janeiro. Esteve preso 17 anos, tendo sido condenado por ter tentado acalmar multidões durante os motins de 2012. A Comissão Nacional de Direitos Humanos de Myanmar indicou que as petições e cartas enviadas pela Amnistia Internacional a levou a investigar e avaliar este caso.
  • As autoridades chinesas libertaram cinco ativistas de direitos das mulheres, sob fiança, em abril, após a campanha #FreeTheFive, por todo o mundo, clamar pela sua libertação. Wei Tingting, Wang Man, Wu Rongrong, Li Tingting e Zheng Churan tinham sido detidas por organizarem planos para lançar uma campanha contra o assédio sexual para assinalar o Dia Internacional da Mulher.
  • O ativista Filep Karma foi finalmente liberto da prisão na Indonésia, em novembro. Estivera encarcerado durante mais de uma década, após ter erguido a bandeira da independência da Papuásia-Nova Guiné durante um evento político em 2004. Apoiantes e ativistas da Amnistia Internacional fizeram campanha pela libertação de Filep Karma, no que se inclui o envio de 65 000 mensagens de apoio assinadas durante a Maratona de Cartas de 2011.

Europa e Ásia Central

  • A Irlanda tornou-se em maio no primeiro país no mundo a aprovar por referendo a igualdade total no casamento civil para as pessoas do mesmo sexo. “Esta decisão envia aos membros da comunidade lésbica, gay, bissexual, transgénero e intersexual [LGBTI], em todo o lado, que eles, as suas relações e famílias são importantes”, congratula-se o diretor executivo da Amnistia Internacional Irlanda, Colm O’Gorman.
  • O Governo norueguês comprometeu-se, em abril, a mudar a lei que se aplica às pessoas que querem mudar legalmente de género. Este anúncio seguiu-se a uma campanha da Amnistia Internacional a favor de John Jeanette Solstad Remø, uma mulher transgénero a quem não foi permitido mudar de género legalmente sem passar antes por um tratamento médico compulsório.
  • Um tribunal italiano decretou em maio que a transferência de famílias das comunidades ciganas para um campo etnicamente segregado fora de Roma era ilegal. Esta sentença histórica seguiu-se a anos de campanha da Amnistia Internacional, ao lado de outras ONG, para parar os desalojamentos forçados, segregação e discriminação contra os membros das comunidades ciganas.
  • Bashir Suleymanli e Orkhan Eyyubzade, muito críticos do Presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev, foram libertos em março no âmbito de um perdão presidencial. A Amnistia Internacional fazia campanha pela sua libertação, assim como por outros 20 prisioneiros de consciência naquele país.
  • Leyla Yunus, uma das mais notáveis defensoras de direitos humanos no Azerbaijão, foi liberta em dezembro. Fora condenada em agosto por “fraude” e outros supostos crimes relacionados com o trabalho que desenvolve na ONG Instituto Paz e Democracia.

Médio Oriente e Norte de África

  • Num marco importante em matéria de responsabilização, ao fim de décadas de violações de direitos humanos cometidas pelas forças israelitas e por grupos armados palestinianos no contexto de conflitos, o Tribunal Penal Internacional iniciou um exame preliminar aos acontecimentos nos Territórios Palestinianos Ocupados desde junho de 2014. Esta iniciativa pode abrir caminho a investigações formais a alegados crimes de guerra e outros crimes cometidos por todos os lados e, assim, ajudar a combater a impunidade enraizada.
  • Num outro importante passo para obter responsabilização, a Comissão Verdade e Dignidade, criada após a Revolução de Jasmim de 2011 na Tunísia para investigar violações passadas de direitos humanos, começou a ouvir testemunhos de vítimas de abusos e violações cometidas durante o regime do antigo Presidente Zine al-Abidine Ben Ali.
  • O diretor do Centro Sírio para os Media e Liberdade de Expressão, Mazen Darwish, cuja ONG documenta violações de direitos humanos na Síria, foi liberto da prisão em agosto, pouco tempo após outros dois ativistas – Hussein Ghrer e Hani al-Zitani – terem também sido postos em liberdade. Os três foram detidos com base em acusações forjadas de terrorismo na Síria e passaram três anos e meio na prisão.
  • Os jornalistas Mohamed Fahmy e Baher Mohamed, da rede noticiosa Al-Jazira, foram libertos em setembro ao abrigo de um perdão concedido por decreto presidencial que abrangeu 100 pessoas no Egito, incluindo vários ativistas pacíficos. Os jornalistas estavam detidos desde 2013 e foram condenados por difundirem “notícias falsas”, a par do jornalista australiano Peter Greste, também da Al-Jazira e o qual fora liberto no início do ano.
  • E no Bahrein, o proeminente ativista de direitos humanos Nabeel Rajab foi perdoado pelo rei e liberto da prisão por razões médicas, após ter cumprido três meses de uma pena de seis meses de prisão. Ficou, porém, proibido de viajar para fora do país e continua a ser visado com outras acusações, por comentários que terá feito ou partilhado no Twitter, e pelas quais pode ser condenado a dez anos de prisão.

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