27 Fevereiro 2015

 

Relatório Anual 2015 Amnistia Internacional

 

Sucessos globais

  • Ao fim de mais de duas décadas de campanha, 2014 assistiu a entrada em vigor do Tratado sobre o Comércio de Armas Convencionais, assinado por 130 países e ratificado por 62. Este tratado fornece um enquadramento para a limitação das transferências internacionais de armas e munições e – se concretizado – irá ajudar a salvar muitos milhares de vidas.
  • Em dezembro de 2014, 117 países votaram a favor de uma resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas para adotar uma moratória às execuções com vista à abolição da pena de morte a nível global. Desde a votação da resolução anterior de similar conteúdo, em dezembro de 2012, a Guiné Equatorial, a Eritreia, as Fiji, o Níger e o Suriname alteraram o seu voto para uma posição favorável à moratória; Bahrein, Birmânia, Tonga e Uganda moveram-se da oposição para a abstenção.
  • A publicação em dezembro de 2014 do sumário de um relatório da Comissão de Serviços Secretos do Senado norte-americano sobre o programa de detenções da Central Intelligence Agency (CIA) expôs não apenas os detalhes chocantes dos abusos cometidos mas também a extensão da cumplicidade de países europeus naquele programa, os quais tiveram a funcionar nos seus territórios centros de detenção secretos ou de alguma outra forma prestaram ajuda às autoridades norte-americanas nas transferências ilegais, desaparecimentos forçados, tortura e outros maus-tratos de dezenas de pessoas.

Médio Oriente e Norte de África

  • Em fevereiro de 2015, as autoridades egípcias libertaram Peter Greste, um dos três jornalistas da rede noticiosa Al-Jazira que se encontravam então presos há mais de um ano com base em acusações forjadas. A Amnistia Internacional continua a apelar pela libertação definitiva dos dois outros jornalistas que foram detidos com Peter Greste: Mohamed Fahmy e Baher Mohamed.
  • Em janeiro de 2015, a Palestina ativou o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (TPI). Uma investigação do TPI irá ajudar a romper a cultura de impunidade que tem perpetuado o ciclo de crimes de guerra e de crimes contra a humanidade cometidos por ambos os lados no conflito israelo-palestiniano.
  • Em janeiro de 2014, o Parlamento marroquino votou de forma unânime uma iniciativa legislativa que preencheu uma lacuna persistente nas leis do país, garantindo assim que homens que violam raparigas menores de 18 anos não se escapam à punição com a promessa de casar com as vítimas.
  • A Tunísia adotou uma nova Constituição em fevereiro, que inclui muitas garantias de direitos humanos. E, em maio, foi libertado o prisioneiro de consciência Jabeur Mejri, que passou dois anos na prisão por ter publicado online artigos e cartoons considerados ofensivos para o Islão, apesar de a sua sentença e condenação não terem sido anuladas.

Ásia-Pacífico

  • Milhares de sobreviventes de tortura, raptos e outros abusos no Sri Lanka receberam uma nova esperança em março com o voto em sede da ONU a aprovar uma investigação independente aos crimes cometidos pelas forças de segurança do Estado e por grupo armados durante a guerra civil.
  • Em dezembro, pouco após o lançamento do relatório da Amnistia Internacional que lançou luz sobre o uso da tortura pela polícia nas Filipinas, o Senado daquele país anunciou a abertura de um inquérito ao recurso generalizado à tortura por parte das forças policiais.
  • Em novembro, 30 anos depois de mais de meio milhão de pessoas em Bhopal terem sido envenenadas num dos maiores acidentes industriais do mundo, o Governo da Índia acordou em usar dados clínicos e científicos para rever o pedido de indemnização de muitos milhões de dólares contra a empresa Union Carbide.
  • No Camboja, o tribunal especial para os Khmer Vermelho condenou à prisão perpétua por crimes contra a humanidade Nuon Chea, o antigo número dois do comando do regime dos Khmer Vermelho, e Khieu Samphan, o ex-presidente do Kampuchea Democrático (o estado dos Khmer Vermelho).
  • Na Malásia, as execuções de Chandran Paskaran e de Osariakhi Ernest Obayangbon foram temporariamente suspensas em fevereiro e também em março.
  • Num ano em que a Amnistia Internacional visitou o Vietname pela primeira vez em mais de duas décadas, foram libertados pelo menos sete prisioneiros de consciência naquele país.
  • Em abril, o Tribunal Supremo da Índia consagrou o reconhecimento legal dos transgéneros. O tribunal decretou que as autoridades do país têm de reconhecer a autoidentificação das pessoas transgénero como masculino, feminino ou transgénero, e prestarem-lhes apoio especial na educação e no emprego.

África

  • Meriam Ibrahim, uma mulher cristã condenada à morte no Sudão quando se encontrava grávida, numa sentença que a declarou culpada de apostasia (renegação da fé), e que teve de ter o parto acorrentada numa cela, acabou por ser libertada em junho.
  • Em maio, a Comissão Africana dos Direitos do Homem e dos Povos adotou uma resolução histórica instando à proteção dos direitos de todos os indivíduos, independentemente da sua orientação sexual ou identidade de género ou da perceção feitas destas orientação e identidade.
  • Seis anos depois de dois derrames de petróleo terem destruído os modos de subsistência na área de Bodo ao longo do Delta do Níger, um processo legal no Reino Unido forçou a Shell a fazer finalmente o pagamento de um acordo extrajudicial de indemnização à comunidade afetada no valor de 55 milhões de libras (mais de 75 milhões de euros).
  • Em setembro, foi mobilizada uma força de paz para a República Centro Africana e o TPI abriu investigações preliminares a crimes cometidos no país previstos na lei internacional.
  • Em agosto, a discriminatória Lei Anti-homossexualidade no Uganda foi declarada nula e sem efeitos. E em dezembro, no Botswana, um tribunal superior no país anulou a recusa dada pelo Departamento de Trabalho e Assuntos Internos ao pedido de registo de uma organização de defesa dos direitos dos membros da comunidade lésbica, gay, bissexual, transgénero e intersexual (LGBTI), num acórdão que considerou que aquela recusa constituía uma violação dos direitos constitucionais dos requerentes.
  • Em fevereiro, o TPI rejeitou o recurso de Thomas Lubanga Dyilo, dado como culpado de crimes de guerra na República Democrática do Congo em 2012. O TPI, já em março, declarou Germain Katanga, líder de um grupo armado daquele mesmo país, como culpado de crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
  • Em junho, o TPI confirmou as acusações de crimes contra a humanidade formuladas contra o antigo Presidente da Costa do Marfim Laurent Gbagbo, e em dezembro confirmou as acusações de crimes contra a humanidade e crimes de guerra cometidos na República Democrática do Congo contra Bosco Ntaganda, líder de uma das fações do grupo armado M23.
  • No início de 2015, Dominic Ongwen, um dos líderes do Exército de Resistência do Senhor (LRA, na sigla em inglês), entregou-se a forças norte-americanas no terreno e foi transferido para o TPI, onde será julgado por crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
  • Em dezembro, o Tribunal Africano para os Direitos do Homem e dos Povos determinou que o Burkina Faso violou o direito de liberdade de expressão de Issa Lohé Konaté, na sequência da condenação do jornalista e editor de um jornal a 12 meses de prisão por ter publicado artigos que criticavam o procurador público.
  • Em julho, um artigo que teria permitido a violadores escaparem-se a serem julgados casando com as suas vítimas foi retirado da proposta de reforma do Código Penal em Moçambique.
  • Numa decisão histórica, o Tribunal Constitucional da África da Sul decidiu que as alegações de tortura cometidas no Zimbabwe por e contra cidadãos desse país têm de ser investigadas pelos Serviços de Polícia sul-africanos. Este foi um exemplo da aplicação, na prática, do princípio da jurisdição universal.

Américas

  • Em junho, a comunidade indígena Sawhoyamaxa, do Paraguai, pôde voltar às suas terras ancestrais ao fim de mais de 20 anos de campanha, quando o Presidente do país, Horacio Cartes, promulgou uma lei que confirmou a devolução de mais de 14 mil hectares de terras àquela comunidade.
  • Em outubro, o prisioneiro de consciência e vítima de tortura Ángel Amílcar Colón Quevedo foi libertado de uma prisão mexicana ao fim de cinco anos de detenção pré-julgamento.
  • Em janeiro de 2015, 53 prisioneiros políticos cubanos foram libertados, parte deles imediatamente antes e outra parte logo após os Estados Unidos e Cuba terem anunciado que iriam restabelecer laços diplomáticos.
  • Um tribunal da Guatemala deu Pedro García Arredondo, antigo detetive-chefe da Polícia Nacional guatemalteca, como culpado de orquestrar um incêndio na embaixada de Espanha na Cidade da Guatemala (capital do país) em que morreram 37 pessoas em 1980. Em janeiro, Arredondo foi condenado a 90 anos de prisão pelos crimes de homicídio, homicídio na forma tentada e crimes contra a humanidade. O antigo chefe de polícia da Cidade da Guatemala Erwin Sperisen foi também dado como culpado de vários homicídios por um tribunal suíço.
  • No Brasil, o relatório final da Comissão Nacional da Verdade, publicado em dezembro, constituiu um marco histórico nos esforços do país em concretizar justiça pelos crimes contra a humanidade e outras violações cometidas durante a ditadura militar que governou o país entre 1964 e 1985.
  • No Haiti, um tribunal de recurso reverteu uma decisão judicial inferior de 2012 que determinava que o antigo Presidente Jean-Claude Duvalier não podia ser acusado de crimes contra a humanidade. Apesar de Duvalier ter morrido no ano passado, esta decisão de recurso, tomada em fevereiro, permitiu que prosseguissem as investigações aos crimes cometidos durante o regime do antigo chefe de Estado, de 1971 a 1986.
  • Na Colômbia, uma nova lei, aprovada em junho, poderá contribuir para levar perante a justiça e responsabilizar criminalmente suspeitos de crimes de violência sexual cometidos no contexto de conflito armado – caso seja devidamente posta em prática. Esta nova legislação abre um novo caminho na Colômbia ao definir os crimes de violência sexual no contexto dos crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
  • Em janeiro de 2015, foi dado um perdão em El Salvador a uma mulher condenada a 30 anos de prisão por crimes relacionados com a gravidez após ter sofrido um aborto espontâneo. Outras 16 salvadorenhas que foram detidas e condenadas pela mesma altura com base em acusações similares permanecem porém na prisão.
  • O Chile deu um passo muito importante na direção de descriminalizar o aborto, com o anúncio feito em junho de reformas à lei do aborto em casos em que a gravidez resulte de uma violação, a vida da mulher esteja em risco na gravidez e em que o feto não seja viável.

Europa e Ásia Central

  • Em setembro, a União Europeia deu arranque a procedimentos por infração contra a República Checa por violação da legislação europeia anti discriminação (a Diretiva de Igualdade Racial) num caso que respeita à discriminação de crianças da comunidade cigana no acesso à educação no país.
  • Uma proposta de legislação em Espanha que criaria uma série de obstáculos no acesso à interrupção da gravidez de forma legal e segura e, assim, poria em risco as vidas de mulheres e raparigas foi afastada.
  • Em abril, o Tribunal Europeu de Justiça deliberou que a diretiva europeia de retenção de dados, que requeria que os Estados armazenassem dados de telecomunicações dos cidadãos, era ilegal e que aquela prática violava o direito fundamental dos cidadãos à privacidade.
  • Ao fim de três anos na prisão, o ativista bielorrusso de direitos humanos Ales Bialiatski foi libertado em junho.
  • Um número crescente de países reconheceram direitos iguais aos casais do mesmo sexo e, pela primeira vez desde 2010, a parada de Belgrado foi autorizada a realizar-se, em setembro, no que constituiu uma importante vitória para a comunidade LGBTI na Sérvia.
  • Em junho, o Reino Unido foi forçado a revelar uma política seguida secretamente pelo Governo em que era justificada a vigilância de todos os utilizadores de Facebook, de Twitter, do YouTube e do Google no país. Isto deu-se na sequência de um processo legal – o qual aliás ainda está em curso – em que organizações de direitos humanos estão a tentar que seja judicialmente determinada a verdadeira extensão dos programas de vigilância e monitorização do Governo britânico à atividade online dos cidadãos.
  • Em julho, ao fim de dois anos de ter sido preso pelo seu papel nos protestos contra o Governo generalizadamente pacíficos na Praça Bolotnaia, em Moscovo, a capital russa, Mikhail Kosenko foi libertado de uma unidade psiquiátrica fechada, apesar de a sentença que lhe fora pronunciada não ter sido anulada.

 

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