19 Maio 2020

Numa altura em que responsáveis de governos de todo o mundo participam na reunião anual da Organização Mundial da Saúde (OMS) para tomar importantes decisões sobre a resposta à pandemia de COVID-19, a Amnistia Internacional alerta para as terríveis condições que os profissionais de saúde enfrentam na região das Américas. A organização exorta ainda os Estados Unidos da América a tomarem ações rápidas e decisivas para garantir o financiamento contínuo à OMS.

“Como a América Latina ainda enfrenta as semanas mais mortíferas, é vital que todos os países se reúnam para garantir que o financiamento da saúde não seja prejudicado”

Erika Guevara-Rosas, diretora para as Américas da Amnistia Internacional

No relatório agora divulgado, The cost of curing: Health workers’ rights in the Americas during COVID-19 and beyond (“O custo da cura: Direitos dos trabalhadores da saúde nas Américas durante a COVID-19 e no futuro”) é documentada a forma como os profissionais da linha da frente têm de trabalhar, frequentemente, sem condições de segurança e com equipamentos de proteção insuficientes. Quando denunciam estas situações, correm o risco de sofrer represálias por parte das autoridades ou das entidades empregadoras. Alguns são mesmo alvo de ameaças de morte e ataques físicos.

“Nestes tempos difíceis, devemos muito aos trabalhadores de limpeza, médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, porteiros e epidemiologistas de hospitais e lares pelo trabalho incansável que fazem para nos manter em segurança. Mas agradecer não é suficiente. Os governos devem tomar medidas para garantir que os seus direitos básicos e a sua segurança não sejam colocados novamente em risco de uma forma tão aterradora”, afirma a diretora para as Américas da Amnistia Internacional, Erika Guevara-Rosas.

“Esta pandemia não tem fronteiras e os Estados Unidos da América devem apoiar uma solução global, juntando-se a outros países para financiar a Organização Mundial da Saúde de forma a garantir que a sua capacidade técnica e especializada”

Erika Guevara-Rosas, diretora para as Américas da Amnistia Internacional

“Nas Américas estão cerca de metade das pessoas no mundo que testaram positivo para a COVID-19, existindo mais de dois milhões de casos confirmados. Como a América Latina ainda enfrenta as semanas mais mortíferas, é vital que todos os países se reúnam para garantir que o financiamento da saúde não seja prejudicado neste momento crucial. Esta pandemia não tem fronteiras e os Estados Unidos da América devem apoiar uma solução global, juntando-se a outros países para financiar a Organização Mundial da Saúde de forma a garantir que a sua capacidade técnica e especializada seja estabelecida onde for mais necessário”, nota a mesma responsável.

A Amnistia Internacional realizou 21 entrevistas aprofundadas em países como Estados Unidos da América, Só em duas foi referido que os equipamentos de proteção individual eram “adequados” ou “quase adequados”. Nas restantes apontaram-se preocupações sobre a falta desses equipamentos, as baixas médicas, os períodos de descanso e o apoio à saúde mental no trabalho.

As diretrizes da OMS sobre a gestão dos equipamentos de proteção definem que os trabalhadores de limpeza dos hospitais devem aceder a estes de forma mais efetiva em comparação com muitos outros profissionais, incluindo médicos e enfermeiros, que não tenham contato direto com doentes de COVID-19. No entanto, a Amnistia Internacional constatou que muitos não usufruem das devidas condições de segurança, além de receberem salários baixos e terem parcos benefícios de segurança social.

Um médico das Honduras relatou a existência de casos de trabalhadores que não tinham luvas para limpar áreas expostas a doentes com COVID-19. Um funcionário de 70 anos, que ganhava pouco mais de cinco dólares por dia numa empresa privada de limpeza contratada por um hospital público na Cidade do México, revelou que sofreu um corte salarial de 16 por cento, depois de ter pedido para não limpar determinadas zonas da unidade, uma vez que faz parte dos grupos de risco.

Medo de represálias

Vários profissionais de saúde revelaram ter medo de represálias por denunciarem condições inseguras de trabalho. Entre os casos relatados à Amnistia Internacional, há quem tenha sido despedido ou enfrente processos disciplinares.

Tainika Somerville, uma assistente de enfermagem certificada de um lar de idosos pertencente a uma empresa privada de Chicago, foi demitida depois ter denunciado a falta de equipamentos de proteção, num direto na rede social Facebook. A imprensa dos Estados Unidos da América e do Canadá tem denunciado que estas instalações são o epicentro de várias mortes relacionadas com a COVID-19.

Na Nicarágua, os profissionais de saúde correm um risco particular, uma vez que o governo subestimou a escala da pandemia. O Observatório Civil da COVID-19 adiantou à Amnistia Internacional que alguns trabalhadores foram despedidos por usar equipamentos de proteção individual no local de trabalho. Por vezes, eram obrigados a retirá-los à força.

Apesar de o vice-presidente da Nicarágua ter anunciado, a 28 de abril, que poderiam ser usados equipamentos de proteção individual e que iriam entrar em vigor as normas de distanciamento social, o governo de Daniel Ortega tem continuado a minimizar o impacto da pandemia. A Organização Pan-Americana da Saúde já alertou para as medidas desadequadas implementadas no país, enquanto a Comissão Interamericana de Direitos Humanos levantou preocupações sobre as demissões injustas de profissionais de saúde que se manifestaram.

Informação controlada e violência contra profissionais

Restrições à liberdade de expressão também afetaram o direito à saúde e o acesso das pessoas à informação.

“É impossível proteger a saúde de mais de mil milhões de pessoas que vivem nas Américas se os governos insistirem em silenciar quem denuncia os problemas”

Erika Guevara-Rosas, diretora para as Américas da Amnistia Internacional

Na Venezuela, onde as autoridades prenderam jornalistas por publicar notícias sobre a pandemia, os dados oficiais apontam para apenas 541 pessoas infetadas com COVID-19 e dez óbitos – o que parece revelar um problema de subnotificação.

“É impossível proteger a saúde de mais de mil milhões de pessoas que vivem nas Américas se os governos insistirem em silenciar quem denuncia os problemas, os jornalistas e os profissionais de saúde que corajosamente erguem as suas vozes para alertar para as condições inseguras de trabalho e exigir, com razão, uma resposta adequada e responsável à situação de pandemia”, refere Erika Guevara-Rosas.

Os profissionais de saúde também sofrem de estigmatização, ataques físicos, ameaças de morte e, em alguns casos, são proibidos de utilizar transportes públicos, em países como Colômbia, México e Bolívia. Neste último, há relatos de situações em que os trabalhadores foram apedrejados na rua.

Embora alguns governos tenham respondido a estes ataques com declarações públicas rápidas e ações de consciencialização para apoiar o papel dos profissionais de saúde, outros tomaram medidas para prejudicá-los. Em meados de abril, o presidente de El Salvador, Nayib Bukele, vetou dois decretos que teriam fortalecido a segurança laboral. Antes, tinha acusado as organizações de direitos humanos de trabalhar “para garantir que mais pessoas morram”.

A declaração do presidente de El Salvador vai contra a posição da OMS, que indica especificamente que “violações ou falta de atenção a questões de direitos humanos podem ter sérias consequências para a saúde”.

 

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