7 Março 2019

 

Por ocasião do dia Internacional da Mulher, a Amnistia Internacional – Portugal apela à urgência do reforço de trabalho concertado e entre vários ministérios governamentais para efetivar esforços consequentes para a eliminação da violência contra as mulheres e raparigas e para garantir os direitos das vítimas no acesso à justiça.

 

A Amnistia Internacional relembra que a celebração do Dia Internacional da Mulher deve ser uma data de reflexão e consciencialização, quer para os progressos alcançados quer para a evolução ainda necessária em matéria de direitos das mulheres. Neste dia é ainda importante a celebração e reconhecimento das mulheres pelas conquistas de toda a humanidade em prol da igualdade de género.

Apesar de reconhecer que em Portugal os progressos já realizados nesta matéria são significativos, a organização de direitos humanos alerta que os dados nacionais espelham ainda uma sociedade desigualitária. Entre estes, são fonte de especial preocupação os dados que evidenciam as mulheres e raparigas como as maiores vítimas da violência doméstica e da violência sexual.

Segundo o último Relatório Anual de Segurança Interna, que reúne a criminalidade participada às forças de segurança, em 26.713 participações de violência doméstica registadas em 2017, a maioria das vítimas são mulheres (79%) e dos denunciados/as homens (83,8%). O mesmo relatório reflete um aumento do crime de violação, do qual foram maioritariamente vítimas mulheres (90,7%) e arguidos/as homens (99,2%).

Àqueles dados acrescem os do último Relatório do Observatório de Mulheres Assassinadas, segundo o qual o número de mulheres assassinadas em 2018 em contextos de intimidade ou relações familiares próximas aumentou, por referência ao registado no ano imediatamente anterior.

É também inevitável recordar os números trágicos de mulheres assassinadas nos primeiros meses de 2019, que justificaram também o decretamento de um dia de luto nacional para prestar tributo às vítimas de violência doméstica e às suas famílias.

Somam-se, ao exposto, os dados sobre condenações por violência contra as mulheres que revelam números residuais quando comparados com aqueles das participações registadas. Este facto mereceu o alerta por parte do Grupo de Peritos sobre o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica (GREVIO) que – no seu último relatório sobre Portugal publicado há um mês – advertiu para a importância de “garantir a responsabilização pelos crimes cometidos para criar confiança no sistema e enviar a mensagem de que a violência contra as mulheres não é aceitável”.

Neste contexto, e face ao debate relançado sobre os obstáculos no acesso à justiça enfrentados por mulheres e raparigas vítimas de violência de género, importa ainda recordar a chamada de atenção do GREVIO para os riscos resultantes de estereótipos duradouros. Assim, recordou aquele órgão de peritos independentes que o artigo 42.º da Convenção de Istambul visa precisamente pôr fim “a séculos de estereótipos judiciais por meio dos quais os tribunais minimizaram a violência e reduziram sentenças”.

No mesmo sentido, o Comité para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres considera que “os estereótipos e os preconceitos de género no sistema de justiça têm repercussões profundas na capacidade das mulheres usufruírem dos seus direitos humanos. Impedem o acesso das mulheres à justiça em todas as áreas do direito, e podem ter um impacto particularmente negativo sobre as mulheres vítimas e sobreviventes de violência”. Mais, defende este Comité das Nações Unidas que “as mulheres devem poder contar com um sistema de justiça livre de mitos e estereótipos, e com um sistema judicial cuja imparcialidade não seja comprometida por pressupostos tendenciosos. Eliminar estereótipos no sistema de justiça é um passo crucial para garantir igualdade e justiça para as vítimas e sobreviventes”. [Ver Recomendação Geral N.º 33: Acesso das mulheres à justiça, Comité para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres, 3 de agosto de 2015]

 

© Matej / Pexels

A violência contra as mulheres e raparigas é uma violação de direitos humanos, uma reconhecida forma de discriminação de género e um entrave à igualdade. Para o seu combate é importante fortalecer a confiança das vítimas no sistema de justiça, reforçar o apoio e a proteção que lhes são providenciados, eliminar os estereótipos, também no sistema de justiça, e acabar com a impunidade.

O Governo e os demais Órgãos de Soberania – não esquecendo o Conselho Superior da Magistratura – devem com firmeza, respeitar, proteger e fazer cumprir os direitos das mulheres, promover a efetiva igualdade de género e o empoderamento de todas as mulheres e raparigas.

Assim, reconhecendo os progressos realizados, mas sem perder de vista os compromissos do Estado português, inclusive no contexto dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030[7], devem ser reforçados esforços paraeliminar a discriminação e a violência de género contra mulheres e raparigas e garantir os direitos das vítimas no acesso à justiça, em todas as fases do processo legal.

Todos os ministérios governamentais – com destaque para os Ministérios da Administração Interna, da Justiça, da Presidência e da Modernização Administrativa e da Educação – devem trabalhar de modo concertado para erradicar o preconceito de género da sociedade e do exercício de todos os órgãos de soberania e serviços do Estado.

 

Neste Dia Internacional da Mulher, a Amnistia Internacional Portugal lembra também todas as mulheres. homens e pessoas dos demais géneros que no nosso país se erguem contra as desigualdades de género não se silenciando e não abdicando do seu direito à liberdade de expressão contra a falta de justiça em particular em crimes de violência doméstica e celebra o poder e os esforços destas pessoas que, em Portugal, exigem igualdade de género, respeito pela dignidade das mulheres e tolerância zero a todas as formas de discriminação e de violência contra as mulheres e raparigas, em especial de todas as mulheres que têm a coragem de denunciar atos de violência. A Amnistia Internacional – Portugal está, assim, solidária e comprometida com todas as pessoas que, hoje e sempre, exigem a igualdade entre mulheres, homens e demais géneros.

Até à efetiva igualdade.

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