27 Dezembro 2022

Confrontados com o que por vezes parece ser um ciclo interminável de notícias negativas para as pessoas nos meios de comunicação social, é fácil sentirmo-nos desanimados. Contudo, por entre essa informação, houve muitas boas notícias para celebrar em 2022.

As campanhas e o trabalho mediático e de advocacia da Amnistia Internacional contribuíram para desfechos positivos para pessoas de todo o mundo, cujos direitos humanos estavam a ser violados. Indivíduos injustamente detidos foram libertados da prisão. Abusadores foram responsabilizados e legislações e resoluções vitais foram aprovadas por governos. Continuou o progresso em direção à abolição total da pena de morte, e foram feitos importantes avanços, tanto para os direitos das mulheres, como para os das pessoas LGBTI.

Apresentamos-lhe um resumo das vitórias direitos humanos em 2022, consequência de um trabalho fulcral de todo o movimento da Amnistia Internacional

 

Pessoas libertadas após prisão injusta

O trabalho contínuo da Amnistia Internacional ajudou a garantir a libertação de pessoas em todo o mundo, a proporcionar justiça a famílias e a responsabilizar abusadores.

Em janeiro, o professor universitário Faizullah Jalal foi libertado após ter sido detido e preso arbitrariamente pelos Talibãs.

Em fevereiro, foi concedida fiança ao advogado cingalês e prisioneiro de consciência da Amnistia Internacional, Hejaaz Hizbullah, após quase dois anos de prisão preventiva sob a Lei de Prevenção do Terrorismo (LPT) do Sri Lanka. Dois outros detidos sob as mesmas circunstâncias, Ahnaf Mohamed Imran e Divaniya Mukunthan, foram igualmente libertados, em agosto e setembro, respetivamente.

Nas Honduras, os “oito de Guapinol”, um grupo de defensores do direito à água e prisioneiros de consciência, foram libertados em fevereiro, depois de passarem injustamente mais de dois anos na prisão apenas por desenvolverem o seu trabalho na defesa dos direitos humanos.

 

No mês seguinte, na vizinha Guatemala, o ambientalista indígena Maia e prisioneiro de consciência, Bernardo Caal Xol, foi libertado pouco depois de ter sido detido por acusações falsas relacionadas com o seu ativismo. Mais de meio milhão de ações foram realizadas em seu nome durante a campanha da Maratona de Cartas, de 2021.

Noutros locais, Magai Matiop Ngong — por quem foram realizadas mais de 700 mil assinaturas de petição durante a Maratona de Cartas de 2019 — foi libertado da prisão no Sudão do Sul, em março, depois de ter sido condenado à morte quando tinha 15 anos, em 2017.

Em Agosto assistiu-se à libertação do professor Hriday Chandra Mondal, detido por discutir nas suas aulas a diferença entre a ciência e a religião. Todas as acusações contra ele foram posteriormente anuladas.

Em maio, um palestiniano de 18 anos, Amal Nakhleh, que sofre de uma doença crónica autoimune, foi libertado da detenção administrativa israelita no seguimento de 16 meses de campanha da Amnistia Internacional, entre outros.

Em julho, um tribunal russo absolveu Yulia Tsvetkova da “produção e disseminação de materiais pornográficos” devido aos seus desenhos de vaginas, com uma visão positiva sobre o corpo, que estavam publicados online

Na sequência de uma Ação Urgente, um ativista maldivano, Rusthum Mujuthaba, que se encontrava detido sob acusações de blasfémia relacionadas com uma publicação nas redes sociais, também foi libertado da prisão em agosto.

O cidadão palestiniano Dr. Mohammed al-Khudari foi libertado da prisão na Arábia Saudita em outubro, depois de ter passado mais de três anos sob detenção arbitrária juntamente com o seu filho, Dr. Hani al-Khudari. Ambos receberam sentenças de prisão em acusações forjadas. O Dr. Hani al-Khudari permanece na prisão apesar de a sua sentença ter expirado em fevereiro e a Amnistia Internacional continua a campanha pela sua libertação.

Seis homens palestinianos que reportaram terem sido torturados em prisões da Autoridade Palestiniana foram libertados sob fiança, duas semanas após a intervenção da intervenção da Amnistia Internacional, em novembro.

Graças ao apoio da Amnistia Internacional Argentina, uma família ucraniana conseguiu escapar à guerra e estabelecer-se no país em novembro. Está disponível aqui um breve filme que documenta a sua história.

No Iémen, o jornalista Younis Abdelsalam foi libertado em dezembro, depois de detido arbitrariamente durante mais de um ano por exercer pacificamente do seu direito à liberdade de expressão.

 

Justiça para as famílias, abusadores responsabilizados

No Malawi, fez-se justiça em abril, quando um tribunal condenou 12 homens pelo assassinato de MacDonald Masambuka, uma pessoa com albinismo, em 2018.

Em junho, foi finalmente feita justiça parcial pelo assassinato da ativista dos direitos ambientais e indígenas, Berta Cáceres, em 2016, com a condenação à prisão de David Castillo, por coautoria do seu homicídio. A Amnistia Internacional continua a sua campanha para trazer à justiça outros suspeitos de responsabilidade no assassinato de Berta.

Após pressão das autoridades norte-americanas, e no seguimento de uma visita do presidente Biden a Israel, o Ministério da Defesa israelita concordou, em outubro, pagar uma compensação à família do palestiniano-americano Omar As’ad, que morreu em janeiro depois de ter sido alvo de maus-tratos por soldados israelitas num posto de controlo.

Em novembro, o Departamento Federal de Investigação (FBI) dos Estados Unidos informou o governo israelita de que realizará uma investigação ao assassinato da jornalista palestiniana-americana Shireen Abu Akleh por um soldado israelita, em maio.

Em dezembro, um juiz libanês indiciou cinco membros da Segurança do Estado por acusações de tortura no caso do refugiado sírio Bashar Abdel Saud, que morreu sob custódia em agosto.

 

Progresso contínuo em direção à abolição global da pena de morte

A campanha da Amnistia Internacional pela abolição global da pena de morte teve mais sucesso em 2022, com uma série de países a abolirem a punição ou a darem passos significativos nessa direção.

A abolição da pena capital para todos os crimes entrou em vigor no Cazaquistão, em janeiro. A Papua Nova Guiné seguiu o exemplo em abril, revogando a punição 30 anos após a sua reintrodução.

Através das redes sociais, o presidente da Zâmbia anunciou em maio que o país começaria o processo de abandonar a pena de morte e, em junho, O governo da Malásia iniciou o processo de remover a obrigatoriedade da sentença capital para 11 infrações.

Em setembro, entrou em vigor uma nova lei que removeu as provisões da pena de morte do Código Penal na Guiné Equatorial.

Entretanto, a esmagadora maioria dos países da África subsaariana que ainda não aboliram a pena de morte para todos os crimes, incluindo o Quénia, o Malawi, o Uganda, a Zâmbia e o Zimbabué, continuou a não realizar execuções.

 

Legislações e acordos internacionais históricos

O trabalho da Amnistia Internacional foi vital em ajudar a assegurar a aprovação de legislações e resoluções essenciais, bem como para garantir que as empresas prestam contas pelas suas responsabilidades de direitos humanos.

 Houve vitórias importantes quanto aos Direitos de Refugiados e Migrantes nos EUA. Por exemplo, em março, o Departamento de Segurança Interna anunciou a designação do Afeganistão para Estatuto de Proteção Temporária (EPT). A mudança oferece proteção de deportação a afegãos sem estatuto de visto e presentes nos EUA antes de 15 de março de 2022, dissipando receios imediatos de um regresso a um Afeganistão governado pelos Talibãs.

Numa vitória para a proteção e promoção do direito à liberdade de expressão, em maio, o Supremo Tribunal da Índia suspendeu a lei de sedição com 152 anos de existência.

O governo de Serra Leoa redigiu, em junho, uma nova lei da saúde mental, mais conforme aos padrões internacionais de direitos humanos do que a anterior e discriminatória da ‘Lei da Loucura’, de 1902. Este foi um apelo central no relatório da Amnistia Internacional de maio de 2021, que se focava no assunto.

No Níger, em junho, o Parlamento nacional adotou alterações à lei do cibercrime que revogaram as sentenças de prisão por difamação e insultos.

Nos EUA, foi adotada legislação sobre violência armada, há muito defendida pela Amnistia Internacional EUA e pelos seus parceiros, com a aprovação, em junho, da Lei de Comunidades Mais Seguras. A legislação prevê cerca de 206 milhões de Euros) adicionais para programas de Interrupção da Violência Comunitária (IVC).

A Amnistia Internacional viu o impacto do seu trabalho com crianças em zonas de conflito no Níger, nomeadamente com o aumento da monitorização da situação pela ONU. Em julho, o secretário-geral das Nações Unidas solicitou à sua Relatora Especial sobre Crianças e Conflito Armado para “promover o reforço da capacidade de monitorização na região do Sahel Central”, que cobriria uma região de fronteira do Níger, uma das recomendações principais do nosso relatório de setembro de 2021.

Ao longo do ano, a Amnistia Internacional também viu alguns negócios levarem mais a sério as suas obrigações de direitos humanos.

No seguimento de um pedido da Amnistia Internacional, as autoridades da Serra Leoa requereram à empresa de mineração Meya, que opera no Distrito de Kono, para responder às nossas preocupações sobre o impacto negativo das suas atividades sobre as populações locais. A empresa respondeu que está envolvida em várias ações para melhorar a segurança das populações e o acesso a água potável para as comunidades.

A investigação da Amnistia Internacional à cadeia de abastecimento de combustível para a aviação, ligada a crimes de guerra em Myanmar, desempenhou um papel no anúncio por várias empresas da sua retirada das vendas de combustível de aviação ao país, onde existe risco de as remessas serem usadas pelos militares de Myanmar para levar a cabo ataques aéreos letais. As empresas incluem a Puma Energy, que anunciou a sua saída menos de duas semanas após conhecer as conclusões da Amnistia Internacional. A Thai Oil e o agente marítimo norueguês Wilhelmsen também confirmaram que se retirarão da cadeia de fornecimento, esperando-se que outras se sigam.

Na sequência do relatório da Amnistia Internacional, em março, o Relator Especial da ONU (RE), Michael Lynk, disse que Israel está a praticar apartheid, seguido pelo RE da ONU Balakrishnan Rajagopal, em julho, juntando-se a um coro crescente de avaliações de peritos.

Em abril, a União Europeia chegou a um acordo político sobre a Lei dos Serviços Digitais, um enquadramento regulatório pioneiro que, entre outras coisas, exigirá às grandes plataformas tecnológicas que avaliem e façam a gestão dos riscos sistémicos colocados pelos seus serviços, tais como defesa de ódio e a disseminação de desinformação.

Foram feitos progressos importantes em matéria de justiça ambiental, com a aprovação de uma resolução na Assembleia Geral das Nações Unidas, reconhecendo o direito a um ambiente saudável. As notícias seguem-se à aprovação de uma resolução similar pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU, no final de 2021.

Em julho, dez países europeus – Bélgica, Dinamarca, França, Alemanha, Irlanda, Itália, Países Baixos, Noruega, Espanha e Suécia – rejeitaram a designação de sete organizações da sociedade civil palestiniana como “terroristas” e “ilegítimas” pelo Ministério da Defesa israelita. O governo dos Estados Unidos expressou a sua preocupação quando os militares israelitas invadiram os escritórios das organizações em agosto, e peritos da ONU condenaram os ataques israelitas à sociedade civil palestiniana em outubro.

Na sua 51ª sessão, em setembro, o Conselho de Direitos Humanos da ONU emitiu uma resolução especial sobre o Afeganistão. A Amnistia sugeriu a inclusão de um apelo ao Relator Especial das Nações Unidas para que prepare um relatório temático sobre a situação das mulheres e raparigas. Sete países apoiaram a ideia, e esta foi incluída na resolução final.

Em outubro, o Conselho de Direitos Humanos da ONU renovou o mandato da Missão de Apuramento de Factos sobre a Venezuela – um fundamental mecanismo internacional independente que investiga ativamente e reporta regularmente sobre crime internacionais passados e em curso e outras violações de direitos humanos  – até setembro de 2024. E, em novembro, o Conselho de Direitos Humanos aprovou uma resolução pioneira para estabelecer uma nova missão de averiguação de factos para investigar alegadas violações de direitos humanos no Irão, relacionadas com os protestos em curso à escala nacional, que começaram a 16 de setembro de 2022.

Em outubro, o mandato do Projeto de Responsabilização do Escritório do ACNUDH para o Sri Lanka foi alargado por um período adicional de dois anos. O projeto tem um mandato para recolher e preservar provas para futuros processos de responsabilização – um aspeto chave para assegurar que o governo do Sri Lanka continua sob pressão para reparar e parar as violações de direitos humanos, tanto as históricas, como as atuais.

 

Vitórias para os direitos das mulheres

O ano assistiu a um conjunto de vitórias para os direitos das mulheres, com a Amnistia Internacional na dianteira.

Nos últimos avanços sobre direitos sexuais e reprodutivos na América Latina, em fevereiro, a Colômbia descriminalizou o aborto durante as primeiras 24 semanas de gravidez. Notícia que se segue à legalização do aborto na Argentina, em 2020, e à descriminalização do aborto no México, em 2021.

Em maio, a câmara baixa do Parlamento de Espanha aprovou um diploma contendo importantes medidas para combater e julgar a violação. O Parlamento da Finlândia aprovou medidas similares em junho, adotando reformas para a ausência de consentimento para a definição de violação. A Finlândia também aprovou, em outubro, reformas que amenizaram as leis de aborto mais estritas na região nórdica.

Setembro viu a absolvição de Miranda Ruiz, uma médica que tinha sido injustamente acusado na Argentina por ter garantido um aborto legal.

 

Vitórias marcantes para os direitos LGBTI

A Amnistia Internacional contribuiu também para algumas vitórias marcantes para os direitos LGBTI ao longo de 2022.

Numa importante afirmação dos direitos dos indivíduos transgénero à dignidade, à felicidade e à vida familiar, o Supremo Tribunal sul-coreano determinou que ter crianças menores de idade não deve ser um fundamento imediato para recusar o reconhecimento do género legal das pessoas transgénero.

Em julho, o matrimónio entre pessoas do mesmo sexo tornou-se legal na Suíça, depois de quase dois terços da população terem votado a seu favor num referendo. A Eslovénia seguiu o exemplo em outubro, legalizando o casamento entre pessoas do mesmo sexo após uma sentença do Tribunal Constitucional.

Uma proibição do premiado filme ‘Joyland‘, que apresenta uma pessoa transgénero como personagem central, foi revertida no Paquistão, em novembro.

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