17 Novembro 2022

A Amnistia Internacional publicou esta quinta-feira um relatório no qual identifica o Equador como um dos países que continua sem dar a devida proteção às refugiadas venezuelanas vítimas de discriminação com base no género, juntando-se à Colômbia e ao Perú na tendência regional sul americana de discriminação às mulheres.

O relatório “Desprotegidas no Equador: Mulheres venezuelanas refugiadas sobreviventes de violência com base no género” revela como as mulheres continuam a enfrentar violência no Equador, “um Estado incapaz de garantir, proteger e respeitar o seu direito a uma vida livre de violência”.

“Enquanto país que recebe o terceiro maior número de pessoas que fogem das massivas violações de direitos humanos na Venezuela, o Equador deve enfrentar e reverter a falta de proteção para mulheres venezuelanas”

Erika Guevara-Rosas

“É preocupante ver que o Equador, enquanto Estado, se junta à Colômbia e ao Perú no seu inaceitável tratamento das mulheres venezuelanas que sobrevivem à violência com base no género. Enquanto país que recebe o terceiro maior número de pessoas que fogem das massivas violações de direitos humanos na Venezuela, o Equador deve enfrentar e reverter a falta de proteção para mulheres venezuelanas”, afirmou Erika Guevara-Rosas, diretora regional para as Américas da Amnistia Internacional.

Com 502.214 refugiados no país até agosto de 2022, o Equador fica somente atrás da Colômbia e do Perú no número de refugiados venezuelanos que acolhe, com aqueles países a terem recebido, respetivamente, 2,5 e 1,5 milhões de venezuelanos. O total está a aumentar de forma constante e excede agora os 7.1 milhões de pessoas, enquanto o número de países que restringem a sua entrada e proteção continua a crescer, como no caso dos Estados Unidos da América.

No Equador, as mulheres e as crianças representam aproximadamente metade desse meio milhão de pessoas e a sua maioria encontra-se numa situação migratória irregular. A Amnistia Internacional acredita que as pessoas venezuelanas que fugiram do seu país devido a massivas violações de direitos humanos necessitam de proteção internacional e devem ser reconhecidas como refugiadas. Independentemente da presente situação migratória no país, a organização refere-se a elas como mulheres refugiadas.

(Foto: Ana Maria Buitron)

 

A investigação confirmou que o Estado equatoriano não está a garantir os direitos das mulheres venezuelanas que procuram proteção enquanto refugiadas e a uma vida livre de violência. No que respeita à sua proteção, as autoridades equatorianas não estão a garantir o direito de as mulheres venezuelanas requererem o estatuto de refugiadas. Apesar de cumprirem as condições da definição de refugiado da Declaração de Cartagena de 1984, no Artigo 98 da sua Lei Orgânica de Mobilidade Humana, as autoridades equatorianas raramente aplicam esta definição. Entre 2018 e 2022, apenas 555 mulheres foram reconhecidas formalmente como refugiadas e algumas mulheres reportaram que as autoridades as desencorajaram de procurar proteção internacional. Com sérios obstáculos para aceder a mecanismos alternativos de regularização migratória existentes, as mulheres venezuelanas são deixadas em situações nas quais estão em risco acrescido de violência e discriminação devido ao seu estatuto migratório irregular.

Relativamente à falha em garantir o direito das mulheres venezuelanas a uma vida livre de violência, o relatório sublinha como a violência com base no género é um problema sistemático e predominante no Equador: duas em cada três mulheres sofrem de alguma forma de violência com base no género durante a sua vida. Neste contexto, as mulheres venezuelanas refugiadas enfrentam um risco ainda maior de violência física, psicológica, sexual, patrimonial, ginecológica-obstétrica e online, em espaços públicos e privados, ao longo das suas rotas migratórias e no seu lugar de destino. Esta vulnerabilidade à violência é exacerbada para as mulheres numa situação migratória irregular, como é o caso da maioria das mulheres venezuelanas no Equador, muitas das quais têm medo de reportar violência com base no género por receio de serem expulsas do país ou multadas.

A Amnistia Internacional identificou problemas estruturais nas instituições de primeira linha que identificam e respondem a casos de violência com base no género, bem como o sistema de administração da justiça no Equador. Estereótipos e discriminação baseados no género e xenofobia contra mulheres venezuelanas, a falta de recursos e a ausência de institucionalização de boas práticas contribuem para a ausência de acesso a mecanismos de proteção e ao sistema judicial. Todos estes fatores significam, na prática, que o acesso à justiça e a reparação para as mulheres venezuelanas é uma fantasia, violando o seu direito a uma vida livre de violência.

(Foto: Ana Maria Buitron)

 

“Mais de 7.1 milhões de pessoas fugiram de uma crise sem precedentes na Venezuela nos últimos anos. O Equador, a Colômbia, o Perú e outros países que recebem venezuelanas em busca de proteção internacional devem-lhes uma resposta coordenada, urgente e baseada nos direitos humanos. As mulheres e raparigas, particularmente sobreviventes de violência com base no género, devem sempre ser uma prioridade em termos de proteção por todos os Estados e continuaremos a exigi-lo”, declarou Erika Guevara-Rosas.

As descobertas do relatório são baseadas numa investigação levada a cabo entre junho e setembro de 2022, incluindo o trabalho de campo nas cidades de Huaquillas, Machala e Quito, entre agosto e setembro. Foram entrevistadas para esta pesquisa um total de 99 pessoas, nomeadamente 63 mulheres sobreviventes de violência com base no género, 19 representantes de organizações da sociedade civil, sete de organizações internacionais e dez de órgãos governamentais. Adicionalmente, a Amnistia Internacional submeteu dez pedidos para acesso a informação pública e reviu profundamente a legislação atual, políticas públicas, a literatura existente e relatos mediáticos sobre o tema.

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