19 Dezembro 2018

Celebrando os 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Amnistia Internacional Portugal organizou o Fórum da Coragem de 7 a 9 de dezembro, no Museu das Comunicações, em Lisboa. Durante estes dias, juntaram-se organizações da sociedade civil, entidades administrativas governamentais e defensores e defensoras dos direitos humanos para falar sobre os grandes desafios dos direitos humanos da atualidade. No dia 7, debateram-se os processos e condições de acolhimento aos refugiados em Portugal. No dia 8, decorreu a Assembleia Geral da Amnistia. No dia 9, decorreu a Cimeira da Coragem, com a presença de organizações de direitos humanos do nosso país e com o testemunho de ativistas e defensores de direitos humanos de vários países.

DIA 7 – DEBATE ABERTO “EU ACOLHO OS REFUGIADOS”

Muito se diz sobre a forma como acolhemos refugiados. Mas como será que o fazemos verdadeiramente? E será que é real a ideia de uma crise de refugiados? Que soluções há para acolher em segurança e com respeito pelas pessoas que buscam segurança e uma nova oportunidade?

Todas estas ideias e questões foram a debate neste primeiro dia do Fórum da Coragem, onde se juntaram entidades governamentais, organizações da sociedade civil e refugiados.

Na primeira sessão da manhã, o foco esteve nos processos iniciais de acolhimento, nomeadamente nos procedimentos e mecanismos disponíveis para as pessoas quando chegam e pedem asilo e o estatuto de refugiado em Portugal. Durante a manhã, houve ainda tempo para se falar sobre como vivem os refugiados, sobre o acesso à saúde, à habitação e à educação, e sobre que estruturas de apoio têm para refazer a sua vida no nosso país.  A moderação dos dois painéis foi, respetivamente, de João de Almeida Dias, jornalista e com extensa investigação e trabalho nesta área, e de Cristina Santinho, investigadora do Centro em Rede de Investigação em Antropologia e Docente no ISCTE-IUL, com ampla investigação académica publicada sobre o tema em debate.

Sessão 1 - Como acolhemos: processos iniciais de acolhimento

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Na 1ª sessão, sobre processos iniciais de acolhimento, foram identificados alguns desafios relacionados com a falta de autonomização (apenas 42% dos refugiados estão nessa condição após o período de acolhimento institucional), a aprendizagem da língua portuguesa, a gestão de expetativas por parte dos refugiados e os procedimentos legais de asilo (nomeadamente a falta de resposta em tempo útil por parte do SEF). Não obstante, o nosso país é o 5º país da União Europeia que mais refugiados acolheu ao abrigo do Programa de Recolocação, existe um sentimento favorável à proteção dos refugiados por parte da sociedade portuguesa e reconheceu-se que as várias instituições estão a criar condições de melhorias para os desafios apontados. Concluiu-se que seriam necessários mais meios institucionais para analisar e acompanhar individualmente os casos e foi mencionada a necessidade de expansão do período de acolhimento institucional de 18 para 24 meses.


João de Almeida Dias faz o resumo da primeira sessão do dia 7 – processos iniciais de acolhimento

Sessão 2 - Como vivem os refugiados: habitação, saúde e formação

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Na 2ª sessão, sobre habitação, saúde e formação, realçou-se o facto de existir uma décalage entre os esforços de acolhimento e as desafios que os refugiados enfrentam devido a problemas no funcionamento estrutural das instituições, refletido na ausência de autocrítica, falta de articulação entre instituições e ausência de formação adequada por parte das instituições de acolhimento e das entidades que lidam com o quotidiano dos refugiados. Salientou-se o facto de os refugiados enfrentarem dificuldades acrescidas ao acesso à saúde devido às barreiras linguísticas e dificuldade em entender as dinâmicas hospitalares (por exemplo, o sistema de triagem e o papel do médico), ao desconhecimento por parte de algumas instituições de saúde dos direitos de acesso universal que os refugiados e requerentes de asilo têm, assim como desafios na aprendizagem da língua portuguesa. Concluiu-se que estão a ser realizados esforços na direção da resolução destes problemas, que passará muito por uma maior articulação das diferentes instituições e apontou-se como exemplo a linha telefónica de tradução do ACM  e o protocolo desta entidade com a Ordem dos Psicólogos que se firmou na disponibilização de mais de mil psicólogos com formação em trauma para ajudar os refugiados.


Cristina Santinho faz o resumo da segunda sessão do dia 7 – como vivem os refugiados

Durante a tarde, pensaram-se e trouxeram-se a debate formas alternativas de acolhimento, nomeadamente de bolsas de estudo e de programas de apadrinhamento de acolhimento pelas comunidades. Num primeiro momento, Tim Hanley, da Amnistia Internacional Irlanda apresentou o trabalho desenvolvido nesta área, fazendo um “estado da arte” nestas matérias, nomeadamente com exemplos da Irlanda, do Canadá, Reino Unido e Nova Zelândia, apresentação essa que serviu de ponto de partida para o debate que se seguiu. A moderação foi de Pedro A. Neto, Diretor Executivo da Amnistia Internacional Portugal.

Sessão 3 - Formas alternativas de acolhimento: educação e programas de patrocínio de acolhimento pelas comunidades

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Na 3ª e última sessão, abordaram-se os programas de patrocínio de acolhimento pelas comunidades, tendo sido partilhadas as experiências positivas na Irlanda e em Portugal, por exemplo através do programa “PAR Famílias”, da União de Misericórdias Portuguesas que apoiam os refugiados no contexto do acolhimento descentralizado do programa de recolocação e da receção de refugiados nas universidades portuguesas. No entanto, apesar destas experiências que têm contribuído para uma maior integração na comunidade, foram novamente salientados vários dos desafios acima mencionados, acrescentando-se a falta de conhecimento por parte dos refugiados de soluções, como a linha de microcrédito e as dificuldades relacionadas com o reconhecimento de e validação de competências. Estão a ser realizados esforços para melhorar os serviços e, acima de tudo, é necessário envolver os refugiados nos debates e nas decisões sobre o seu futuro no país.

Os painéis contaram com a presença de Alexander Kpatue Kweh (Associação de Refugiados em Portugal), de André Costa Jorge (PAR – Plataforma de Apoio aos Refugiados e SJR – Serviço Jesuíta aos Refugiados), de António Castanheira (Câmara Municipal de Ourém), de Elizabete Martins (União de Misericórdias Portuguesas), de Emília Lisboa (SEF – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras), de Lisa Dequech (Universidade do Porto), de Maria Carmona (CRESCER), de Mónica Frechaut (CPR – Conselho Português para os Refugiados), de Nour Machlah (Representante de Portugal no Conselho Consultivo Europeu para os Migrantes), de Tamim Mohamed Ali (União de Refugiados em Portugal) e de Vasco Malta (ACM – Alto Comissariado para as Migrações).

O dia terminou com o testemunho de um refugiado que contou, na primeira pessoa, todas as dificuldades por que passa quem sai das suas casas e do seu país em busca de segurança e de um lugar onde recomeçar.

DIA 8 – ASSEMBLEIA GERAL DA AMNISTIA INTERNACIONAL PORTUGAL

No dia 8, decorreu a assembleia geral a Amnistia Internacional Portugal, onde foram apresentados e debatidos os planos da organização para o ano de 2019.

O dia terminou com uma ação de ativismo em celebração dos 70 anos da Declaração Universal do Direitos Humanos, que que as pessoas presentes acenderam 70 velas, formando o símbolo da Amnistia Internacional, uma vela iluminada envolta por arame farpado.

 

DIA 9 – CIMEIRA DA CORAGEM

O dia 9, foi o dia dedicado a todas as pessoas e organizações que estão na linha da frente na defesa dos direitos humanos. Juntaram-se mais de uma dezena de organizações e associações de todo o país, com trabalho diverso na área, desde a habitação, discriminação, racismo, direitos das mulheres, crianças, ambiente e alterações climáticas, ente outros. Foi também dia de ouvir testemunho inspiradores de corajosas defensoras e defensores de direitos humanos.

A primeira partilha inspiradora foi de Amin Hashem, um sobrevivente da guerra na Síria, que falou sobre a coragem que é necessária para continuar e persistir quando todo o mundo nos diz que não tem um lugar para nós, ligando a coragem aos refugiados. Depois, Vitalina Koval, intimidada e atacada já por diversas vezes pelo seu trabalho enquanto ativista e defensora dos direitos LGBTI+ na Ucrânia, falou sobre a coragem de levantarmos a voz mesmo quando o mundo nos quer silenciar. De seguida, Asmita Basu, da Amnistia Internacional Índia, falou sobre a Coragem de sermos a mudança que o mundo precisa, falando sobre a vaga de repressão e intimidação que a Amnistia e outras organizações da sociedade civil atravessam neste momento na Índia. Idil Eser, ex-diretora executiva da Amnistia Internacional Turquia contou de seguida a sua experiência, falou de como foi presa injustamente, apenas pelo seu trabalho e sobre a coragem de encarar as injustiças como uma afronta pessoal. No final, Pedro A. Neto e Filipa Santos, Presidente da Amnistia internacional Portugal, falaram dos desafios de ser ativista e defensor de direitos humanos hoje. O dia terminou com a encenação do Abecedário do Medo, um teatro performativo com direção artística de Susana C. Gaspar, do projeto Artes pela Amnistia.

A par com este programa repleto de histórias, inspiração e direitos humanos, quem marcou presença neste Fórum podia ainda ver várias exposições, instalações e performances, para além de agir pelos casos da Maratona de Cartas de 2018 e claro, ficar a conhecer o trabalho da Amnistia, de como se juntar a dar o primeiro passo para mudar o mundo.

SINOPSE “ABECEDÁRIO DO MEDO”

 

 

 

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