23 Julho 2020

Um tribunal da Malásia decidiu anular uma pena “cruel e desumana” de três açoites com vara imposta a 27 homens rohingya. “Apesar de ser uma notícia bem-vinda, todos continuam presos juntamente com dezenas de outros refugiados rohingya, incluindo mulheres e crianças, simplesmente por tentarem escapar à terrível perseguição de que são alvo no Myanmar”, nota a investigadora para a Malásia da Amnistia Internacional, Rachel Chhoa-Howard.

Os 27 homens chegaram à costa malaia em abril deste ano. Na decisão do tribunal, anunciada esta quarta-feira, ficou expresso que estas pessoas são refugiadas que necessitam de proteção internacional devido à situação que se vive no estado de Rakhine, no Myanmar, de onde fugiram. Além disso, não podem ser devolvidas ao país originário, de acordo com o princípio de non-refoulement.

“Mesmo antes da pandemia, as detenções relacionadas com casos de imigração eram permitidas apenas nas circunstâncias mais excecionais. Na atual crise global de saúde pública, não são justificáveis”

Rachel Chhoa-Howard, investigadora para a Malásia da Amnistia Internacional

“O governo da Malásia deve libertar todos os refugiados rohingya presos, visados e condenados por alegadas ‘infrações de imigração’, que são contrárias ao direito internacional. As centenas de outras pessoas rohingya mantidas em centros de detenção também devem ser libertadas e entregues aos cuidados do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados”, defende Rachel Chhoa-Howard.

“Mesmo antes da pandemia, as detenções relacionadas com casos de imigração eram permitidas apenas nas circunstâncias mais excecionais. Na atual crise global de saúde pública, não são justificáveis”, conclui a investigadora.

Uma história que se repete

Desde o início de 2020, pelo menos 1400 pessoas rohingya encontravam-se em barcos no Mar de Andaman e na Baía de Bengala, depois de realizarem viagens extremamente perigosas, fugindo da perseguição no Myanmar e do sofrimento nos campos de refugiados no Bangladesh.

Em abril, as autoridades da Malásia autorizaram o desembarque de 202 rohingya de um barco que estava à deriva na costa de Langkawi. Outras embarcações foram afastadas pela guarda costeira e pelas forças armadas, tendo regressado ao Bangladesh. Aí, algumas pessoas foram encaminhadas para a ilha de Bhashan Char, na Baía de Bengala, tendo ficado com acesso limitado a outros membros da família e a serviços humanitários e de proteção – condições que podem equivaler a detenção arbitrária.

No início de junho, um segundo barco com 269 rohingya aportou na Malásia, depois de problemas detetados no motor. De acordo com relatos, várias pessoas morreram durante a viagem, incluindo uma mulher cujo corpo foi encontrado a bordo. A Reuters informou, citando duas fontes anónimas das autoridades malaias, que estava a ser planeado o envio dos sobreviventes – homens, mulheres e crianças – de volta ao mar.

Mais tarde, o chefe da agência marítima da Malásia recusou-se a negar a intenção, embora tivesse reconhecido que dezenas de pessoas não tinham sobrevivido. O primeiro-ministro do país, Muhyiddin Yassin, afirmou que o governo não implementaria o plano, em resposta a uma pergunta de um membro do parlamento.

Castigos corporais

Anteriormente, a Amnistia Internacional documentou como a justiça da Malásia aplica os castigos corporais, que equivalem a tortura. Funcionários do governo rasgam a carne dos presos com varas, em movimentos que podem atingir até os 160km/h. A dor causada é tão intensa que as vítimas geralmente desmaiam. O sofrimento pode durar semanas ou até anos, tanto em termos de problemas físicos como psicológicos.

De acordo com a lei internacional de direitos humanos, todas as formas de punição corporal são proibidas, pois violam a proibição absoluta de tortura e outras punições cruéis, desumanas ou degradantes. Muitas vezes, equivalem a tortura.

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