3 Maio 2023

Pelo menos quatro jornalistas e dois estudantes foram privados do direito de ler e escrever nas prisões marroquinas, declarou esta quarta-feira a Amnistia Internacional, no Dia Mundial da Liberdade de Imprensa.

De acordo com as Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos, também conhecidas como regras de Mandela, os reclusos devem ser autorizados a ler e a trabalhar, a ter acesso regular a jornais ou à rádio e a aceder a uma biblioteca. Os presos em prisão preventiva devem também poder comprar livros, jornais e material de escrita.

“As autoridades marroquinas há muito que têm como alvo escritores e jornalistas dissidentes e hoje é um dia para recordar todos os que foram presos por causa da sua escrita. Privar os jornalistas presos de canetas e papel é punitivo, desnecessário e um ataque deliberado à sua liberdade de expressão”, afirmou Rawya Rageh, Diretora Adjunta Interina da Amnistia Internacional para o Médio Oriente e Norte de África.

“Devem libertar os jornalistas e académicos que foram presos apenas por terem exercido o seu direito à liberdade de expressão e garantir que o acesso dos presos a jornais, livros e material de escrita não seja restringido arbitrariamente”

Rawya Rageh

“Neste Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, apelamos às autoridades marroquinas para que ponham fim a esta crueldade contra jornalistas e académicos. Devem libertar os jornalistas e académicos que foram presos apenas por terem exercido o seu direito à liberdade de expressão e garantir que o acesso dos presos a jornais, livros e material de escrita não seja restringido arbitrariamente”.

 

“Para matar um intelectual, é preciso isolá-lo”

Rida Benotmane, escritor e membro da Associação Marroquina para a Defesa dos Direitos Humanos (AMDH), está detido em confinamento solitário prolongado na prisão de Arjate 1, desde setembro de 2022. É vítima de acusações falsas que resultam apenas do exercício do seu direito à liberdade de expressão.

Desde o início da sua detenção, Rida Benotmane, de 46 anos, está proibido de usar uma caneta para escrever. Um familiar contou que todos os livros passam por um processo de censura arbitrário por parte das autoridades prisionais, que só permitem que alguns livros cheguem a Rida. Segundo ele, nas prisões marroquinas “vale tudo: desde a humilhação dos visitantes até à proibição de coisas simples como uma caneta Bic para escrever”. Acrescentou que “tudo o que é político é proibido”, dando como exemplo o facto de os funcionários penitenciários terem rejeitado um livro por ter a palavra “Kabul” no título, o que ilustra a arbitrariedade das suas decisões.

Mohamed Ziane, 80 anos, advogado defensor dos direitos humanos e antigo ministro dos direitos humanos em Marrocos, foi preso em 21 de novembro de 2022, depois de o tribunal de recurso de Rabat ter confirmado uma sentença de três anos de prisão por 11 acusações não relacionadas, incluindo acusações falsas de insulto a funcionários públicos, bem como uma acusação de agressão sexual. Mohamed foi mantido em regime de isolamento, foi-lhe negado o acesso a jornais e proibido de escrever ao seu advogado.

O filho e advogado de Mohamed revelou à Amnistia Internacional que os funcionários da prisão lhe tinham dito que tinham transferido Mohamed da prisão de Arjate 2 para Arjate 1 “para o colocar numa cela isolada. Fazem isso frequentemente com intelectuais, é uma forma de tortura. Para matar um intelectual… isolam-no para que não possa comunicar com outras pessoas”.

 

Proibição de escrever e estudar

Taoufik Bouachrine, 54 anos, jornalista e editor de um dos últimos jornais da oposição marroquina, Akhbar el-Youm, está detido na solitária enquanto cumpre uma pena de 15 anos por agressão sexual, tendo já cumprido cinco anos.

Inicialmente, Taoufik Bouachrine podia manter um diário e estava a escrever um livro e a estudar para um doutoramento em Direito. No entanto, quando foi transferido de Ain Borja para a prisão de Arjate 2, em maio de 2023, as autoridades prisionais confiscaram o seu manuscrito e as suas notas. Agora, as autoridades prisionais permitem que Taoufik tenha papel e caneta para escrever, mas uma fonte próxima da sua família disse que, desde o confisco do seu manuscrito, “ele tem tido um bloqueio [de escritor], com medo de que o seu trabalho lhe seja novamente retirado”.

Omar Radi, jornalista de investigação e crítico acérrimo da atuação do governo em matéria de direitos humanos, está proibido de escrever e não recebe as cartas que amigos e familiares lhe enviam. Também foi proibido de fazer um mestrado. Tudo o que escreve, diz o pai, é “imediatamente destruído pelos guardas prisionais”. A 6 de julho de 2021, Omar foi condenado a seis anos de prisão sob a acusação de violação e espionagem, após um julgamento extremamente injusto.

Entre julho de 2020 e abril de 2022, Omar Radi esteve detido na mesma zona da prisão de Oukacha que o seu colega jornalista Soulaiman Raissouni.

Soulaiman Raissouni, 54 anos, era chefe de redação do Akhbar el-Yaoum quando foi condenado, em junho de 2020, por agressão sexual. As autoridades colocaram ambos os homens em confinamento solitário prolongado, mas conseguiram comunicar através de um buraco na parede. Uma fonte disse à Amnistia Internacional que Soulaiman e Omar concordaram em escrever cartas um ao outro todos os domingos, com a intenção de as transformar eventualmente num livro. Chamavam-lhe “as cartas de domingo”. No entanto, os guardas prisionais ouviram Soulaiman a falar sobre a ideia com alguém ao telefone e, no dia seguinte, os guardas confiscaram todas as cartas que os dois homens tinham escrito um ao outro.

Quando Soulaiman foi transferido para a prisão de Ain Borja, em maio de 2022, os guardas prisionais confiscaram o romance que estava a escrever desde o final de 2021, depois de muitas negociações com a administração da prisão para lhe permitirem o acesso a canetas e papel. Os guardas também destruíram todas as suas notas e o seu diário. A partir desse dia, Soulaiman fez um voto de silêncio durante 10 meses em protesto contra este ato cruel e arbitrário contra si.

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