11 Outubro 2016

O reputado académico da minoria chinesa uigur Ilham Tohti é o laureado deste ano do Prémio Martin Ennals, atribuído por um júri formado por dez organizações não-governamentais internacionais, do qual faz parte a Amnistia Internacional. Este galardão visa não apenas reconhecer o profundo compromisso do premiado na defesa dos direitos humanos e os enormes riscos pessoais que enfrenta no desenvolvimento desse trabalho, mas também alertar para a necessidade de proteção internacional.

Ilham Tohti trabalha há mais de duas décadas na promoção do diálogo e entendimento entre as etnias uigur (minoria turcófona e muçulmana) e han na China. O académico e escritor rejeita o separatismo e a violência, tendo sempre procurado alcançar a reconciliação com base no respeito pela cultura uigur, a qual sofre intensa repressão religiosa, cultural e política na Região Autónoma Uigur de Xinjiang (no extremo ocidente da China).

Prisioneiro de consciência da Amnistia Internacional, Ilham Tohti foi detido em janeiro de 2014 juntamente com sete estudantes uigures, submetido a tortura e esteve dez dias sem acesso a comida e algemado durante mais de 20 dias. Acabou por ser condenado a prisão perpétua, em setembro daquele mesmo ano, sob a acusação de “separatismo”, num julgamento que durou apenas dois dias e que ficou marcado por uma série de falhas judiciais: os advogados de defesa não tiveram acesso a todas as provas, durante seis meses não puderam contactar o prisioneiro e um dos advogados foi obrigado a abandonar o caso.

Em 1994, Ilham Tohti começou a escrever sobre as dificuldades e abusos na região de Xinjiang, o que o tornou num alvo de vigilância por parte das autoridades chinesas. Entre 1999 e 2003 ficou proibido de lecionar e as autoridades tornaram também impossível que publicasse artigos nos meios tradicionais. O académico passou a usar a internet com o propósito de alargar a perceção pública para os problemas económicos, sociais e de desenvolvimento com que as comunidades uigures são confrontadas – foi nessa esteira que criou o site Uyghurbiz.net, de linguagem chinesa, de novo para promover o diálogo e o entendimento entre as etnias uigur e han. O site foi fechado várias vezes durante a sua existência e as pessoas que nele publicavam frequentemente perseguidas e intimidadas pelas autoridades.

Ilham Tohti foi detido durante várias semanas em 2009, após ter publicado informação sobre uigures que tinham sido presos, mortos e sujeitos a desaparecimento durante e depois de protestos públicos. Nos anos seguintes foi regularmente sujeito a detenção domiciliária e, em 2013, quando se preparava para viajar para os Estados Unidos – onde aceitara o cargo de professor-visitante na Universidade do Indiana –, detiveram-no no aeroporto e foi impedido de sair da China.

O julgamento e condenação em 2014 por “separatismo” foram intensamente criticados por vários governos ocidentais e pela União Europeia. Já no início deste ano centenas de académicos assinaram uma petição dirigida às autoridades da China para que o libertassem.

Ao ser anunciado que era finalista para o Prémio Martin Ennals de 2016, a filha de Ilham Tohti reiterou que o pai “usou uma só arma na sua luta pelos direitos essenciais dos uigures em Xinjiang: a palavra, dita, escrita, distribuída e publicada”. “Isto é tudo o que ele tinha à sua disposição e tudo o que ele precisava. E é isto que a China achou ser tão ameaçador. Uma pessoa como ele não merece estar na prisão nem mesmo um só dia”.

O presidente da Fundação Martin Ennals, Dick Oosting, lembra que “a verdadeira vergonha nesta situação é que ao eliminar a voz moderada de Ilham Tohti, o Governo chinês está de facto a lançar as bases para o extremismo que diz querer evitar”.

Os outros dois finalistas do Prémio Martin Ennals de 2016 foram: a ativista síria Razan Zaitouneh, fundadora da ONG Centro de Documentação de Violações, que tem dedicado a vida à defesa de prisioneiros políticos, documentando violações de direitos humanos e ajudando outros a libertarem-se da opressão, e que está desaparecida desde que foi raptada em dezembro de 2013; o grupo de nove bloguers etíopes conhecido como Zona 9, os quais documentam abusos de direitos humanos e a situação vivida pelos presos políticos no país, estando três deles atualmente no exílio e os outros seis acusados criminalmente e proibidos de sair da Etiópia (o nome do grupo faz também referência às oito zonas existentes na prisão de Kaliti onde estão encarcerados muitos jornalistas e prisioneiros políticos).

O Prémio Martin Ennals para os Defensores de Direitos Humanos é fruto de uma colaboração de dez organizações não-governamentais: Amnistia Internacional, Federação Internacional de Direitos Humanos, Human Rights First, Human Rights Information and Documentation Systems, International Service for Human Rights, Serviço Protestante para o Desenvolvimento-Alemanha, Front Line Defenders, Human Rights Watch, Comissão Internacional de Juristas e Organização Mundial Contra a Tortura.

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