11 Maio 2021

Forças de segurança israelitas usaram força repetida, injustificada e excessiva contra manifestantes palestinianos em Jerusalém Oriental ocupada, na sequência de quatro dias de violência, nos quais 840 palestinianos foram feridos, referiu hoje a Amnistia Internacional. Pelo menos 21 agentes policiais e sete civis israelitas foram também feridos, segundo a polícia de Israel.

A organização apela às autoridades israelitas que parem, de imediato, os despejos forçados no bairro de Sheikh Jarrah e acabem com a contínua expulsão de palestinianos de Jerusalém Oriental.

Recentemente, grupos armados palestinianos dispararam foguetes e mísseis para o interior de Israel, ferindo pelo menos uma pessoa. Houve também relatos de vários mortos em Gaza devido a ataques de retaliação por parte de Israel.

A Amnistia Internacional apela a todas as partes para que respeitem o direito internacional humanitário e tomem todas as precauções viáveis para evitar ferir civis.

“A Amnistia Internacional recolheu provas que revelam um padrão arrepiante do uso de força abusiva e arbitrária pelas forças israelitas contra manifestantes palestinianos maioritariamente pacíficos nos últimos dias. Alguns dos feridos na violência em Jerusalém Oriental incluem pessoas que se encontravam nas ruas ou fiéis que faziam as orações do Ramadão”, disse Saleh Higazi, diretor-adjunto para o Médio Oriente e Norte de África da Amnistia Internacional.

“A violência recente coloca em grande foco a campanha continuada de Israel para expandir os colonatos israelitas ilegais e intensificar as expulsões forçadas de residentes palestinianos – tais como aqueles em Sheikh Jarrah – para abrir caminho para colonos israelitas. Estas expulsões fazem parte de um padrão continuado em Sheikh Jarrah, violando de maneira flagrante o direito internacional e podendo ser considerados crimes de guerra.”

“A Amnistia Internacional recolheu provas que revelam um padrão arrepiante do uso de força abusiva e arbitrária pelas forças israelitas contra manifestantes palestinianos maioritariamente pacíficos nos últimos dias.”

Saleh Hijazi, diretor-adjunto para o Médio Oriente e Norte de África da Amnistia Internacional

Testemunhos oculares – assim como vídeos e fotografias captados pelos investigadores da Amnistia Internacional no terreno em Jerusalém Oriental – mostram como as forças israelitas aplicaram repetidamente força ilegítima e desproporcionada para dispersar manifestantes durante ataques violentos sobre a mesquita de al-Aqsa e também ações violentas e espontâneas sobre manifestantes pacíficos em Sheikh Jarrah.

Desde o início do Ramadão a 13 de abril, as tensões aumentaram de forma constante, enquanto palestinianos protestavam contra restrições israelitas que limitavam o seu acesso à Porta de Damasco, uma entrada principal para a Cidade Velha de Jerusalém. A 26 de abril, as autoridades israelitas removeram as restrições em resposta às manifestações contínuas. A fúria também tem crescido a respeito de planos iminentes para despejar à força quatro famílias palestinianas de Sheikh Jarrah para abrir caminho aos colonos israelitas.

 

Uso ilegítimo de força

As tensões intensificaram-se a 7 de maio, onde mais de 170 palestinianos foram feridos quando forças israelitas invadiram o complexo da mesquita de al-Aqsa dispersando fiéis e manifestantes, disparando projéteis de impacto cinético de 40mm (PIC) e granadas de concussão contra multidões ali reunidas para orações na última sexta-feira do Ramadão.

Um jornalista palestiniano presente no local sublinhou que as forças israelitas desencadearam um tumulto, disparando projéteis e gás lacrimogéneo. Referiu também que invadiram a clínica na mesquita e espancaram manifestantes. “Tenho estado a cobrir os eventos que decorrem em Jerusalém durante os dez últimos anos… e nunca estive tão assustado na minha vida. Toda a gente era um alvo, eu poderia dizer que os disparos eram aleatórios, mas isso seria uma mentira. Eles sabiam exatamente a quem e para onde estavam a apontar as suas balas e granadas. A maioria das pessoas foi atingida na parte superior do corpo (olhos, rosto e peito)”, menciona ainda à Amnistia Internacional.

Também o próprio foi atingido nas costas enquanto segurava a sua câmara e tentava deixar a área.

“Tenho estado a cobrir os eventos que decorrem em Jerusalém durante os dez últimos anos… e nunca estive tão assustado na minha vida.”

jornalista palestiniano na mesquita al-Aqsa

Em resposta, manifestantes em al-Aqsa atiraram pedras e atearam fogos, enquanto forças israelitas a cavalo e com equipamentos antimotim usavam granadas de atordoamento para os repelir.

A 10 de maio, mais de 300 manifestantes palestinianos foram feridos, quando forças israelitas invadiram o complexo de al-Aqsa pela segunda vez em dias. Um porta-voz da Cruz Vermelha disse à Amnistia Internacional que a violência levou à hospitalização de pelo menos 250 palestinianos, sete em estado crítico.

Uma testemunha ocular acrescentou ainda que as forças israelitas começaram a partir janelas e a disparar gás lacrimogéneo e granadas de atordoamento, deixando muitas pessoas no interior com dificuldades em respirar.

Outra testemunha no local relatou também que as forças israelitas começaram a disparar gás lacrimogéneo a partir de telhados, antes de mais forças invadirem a Praça de al-Haram a partir da Porta de Magharbeh. “Eles continuaram a avançar, empurrando as pessoas para o interior da mesquita de al-Aqsa, encerrando [as portas] com correntes de metal… e depois partiram uma janela para atirar gás lacrimogéneo a pessoas que estavam literalmente trancadas, sem muito espaço para respirar ou conseguir chegar a assistência médica… além disto, começaram a disparar balas de borracha contra os fiéis no interior”, disse.

A mesma fonte referiu ter visto forças israelitas a espancar pessoas que passavam e a parar carros, evacuando os feridos para os fotografar antes de os soltar. Ele próprio foi atingido no peito enquanto se aproximava de um médico no local que tinha sido ferido.

 

Sheikh Jarrah 

Durante a semana passada, os palestinianos no bairro de Sheikh Jarrah realizaram vigílias noturnas em resposta à ameaça iminente de despejos forçados. A Amnistia Internacional documentou detenções arbitrárias de manifestantes pacíficos, o uso de força excessiva, utilização arbitrária de granadas sonoras e de atordoamento, bem como o “borrifar” arbitrário de manifestantes e casas em Sheikh Jarrah por canhões de água com líquido “fedorento” (skunk).

Quatro famílias palestinianas no bairro encontram-se sob ameaça iminente de expulsão após um tribunal de Jerusalém ter rejeitado o seu apelo contra uma ordem de despejo. A Nahalat Shimon International, uma empresa de colonos, moveu processos para apreender as casas de dezenas de famílias em Sheikh Jarrah, utilizando leis intrinsecamente discriminatórias, tais como as Leis de Matérias Legais e Administrativas, bem como a Lei de Propriedade Ausente de 1950, para confiscar terra ou propriedade palestiniana e transferi-la para grupos de colonos. A transferência forçada da população ocupada é proibida sob o direito humanitário internacional e constitui um crime de guerra de acordo com o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional.

Investigadores da Amnistia Internacional testemunharam um ataque não provocado por forças israelitas contra um grupo de manifestantes pacíficos em Sheikh Jarrah a 9 de maio. As forças israelitas chegaram pouco antes do iftar, a refeição de fim de dia do Ramadão. Após a refeição, uma dezena de manifestantes pacíficos formou um círculo e começou a cantar contra os planos iminentes de expulsão de famílias palestinianas das suas casas. Os manifestantes estavam a pelo menos 10 metros de distância das forças israelitas que se encontravam estacionadas junto de uma residência de colonos vizinha. Pouco tempo depois, as forças israelitas lançaram um ataque coordenado para dispersar a multidão de manifestantes palestinianos e começaram a correr em direção à multidão. Um homem, a coxear e com dores, disse ter sido espezinhado por cavalos da polícia enquanto tentava fugir da área. Os residentes foram empurrados contra as paredes das suas casas e cinco homens foram arbitrariamente detidos.

As forças israelitas começaram a empurrar e a golpear o grupo – incluindo um investigador da Amnistia que observava o protesto. Por volta das 22h, trouxeram os canhões de água com skunk e granadas sonoras e começaram a disparar arbitrariamente sobre manifestantes.

Osama Dweik foi preso durante uma manifestação noturna em Sheikh Jarrah a 6 de maio, quando a polícia israelita avançou sobre o grupo de manifestantes e o deteve imediatamente. Na esquadra, ele viu polícias israelitas a pontapear e espancar com bastões quatro palestinianos detidos durante os confrontos na Porta de Damasco e nos protestos de Sheikh Jarrah. Outras sete pessoas foram detidas em Sheikh Jarrah só nessa noite.

Gil Hammerschlag, um ativista israelita que se manifestava contra os despejos forçados em Sheikh Jarrah a 7 de maio, foi empurrado e pontapeado por forças israelitas que lançaram granadas sonoras sobre manifestantes pacíficos a menos de dez metros de distância.

No mesmo dia, um homem palestiniano de meia-idade foi deixado gravemente ferido numa perna quando as forças israelitas atiraram uma granada de atordoamento que o atingiu na coxa. Um fotógrafo também referiu que as forças israelitas, incluindo polícia a cavalo, se lançaram sobre uma multidão que cantava pacificamente depois de um dos manifestantes ter atirado uma garrafa de água de plástico contra estas.

“Investigadores da Amnistia Internacional testemunharam conduta deplorável por parte de forças de segurança em Sheikh Jarrah, como ataques inteiramente não provocados contra manifestantes pacíficos que defendiam os seus direitos e apelavam ao respeito do direito internacional. Em vez de violarem ainda mais os direitos dos residentes de Sheikh Jarrah e de ativistas solidários, as autoridades israelitas devem parar imediatamente as expulsões forçadas”, disse Saleh Higazi.

A Amnistia Internacional apela à comunidade internacional para responsabilizar Israel pelas suas violações sistemáticas à luz do direito internacional.

“Não deve ser permitido a Israel continuar a sua violência contra palestinianos que estão simplesmente a defender o seu direito de existir e a protestar contra a sua deslocação forçada. Não são suficientes as meras expressões de preocupação sobre o desrespeito total de Israel pelas suas obrigações à luz do direito internacional. Têm que existir denúncias claras e fortes das violações flagrantes, incluindo deslocação forçada, expansão de colonatos ilegais e repressão brutal de pessoas que protestam contra estas graves violações”, disse Saleh Higazi.

“Como um passo imediato, apelamos aos membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas para que convoquem uma sessão aberta, e ao Coordenador Especial para o Processo de Paz no Médio Oriente para que informe os estados-membros.”

“Não é apenas uma expulsão, mas um crime de guerra. Lembrem-se disso.”

Nabil el-Kurd, residente de Sheikh Jarrah

Nabil el-Kurd, um dos residentes sob ameaça de despejo forçado em Sheikh Jarrah, disse à Amnistia Internacional:

“Sheikh Jarrah está a enviar uma mensagem a todo o mundo, incluindo ao Congresso dos EUA, ao Parlamento do Reino Unido, ao Parlamento francês, ao Parlamento Europeu, ao Tribunal Penal Internacional, de que o que nos está a acontecer é um crime de guerra. Não é apenas uma expulsão, mas um crime de guerra. Lembrem-se disso. Eu não sei porque é que o mundo inteiro está a assistir ao que está a acontecer e a deixar Israel sair impune. É tempo de parar de mimar Israel.”

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