24 Julho 2020

Uma auditora que analisou a cadeia de fornecimento da JBS, líder mundial de produção de carne, fez um apelo à empresa por esta alegar falsamente que as suas operações não incluíam a criação de gado em áreas protegidas da floresta amazónica brasileira, revela a Amnistia Internacional.

“A auditora DNV GL, essencialmente, chamou à atenção da JBS por esta usar as suas auditorias para ocultar o facto de ter falhado na monitorização de toda a cadeia de fornecimento”

Richard Pearshouse, diretor do departamento de Crises e Meio Ambiente da Amnistia Internacional

A auditora independente norueguesa DNV GL Business Assurance, contratada pela JBS para auditar a cadeia de fornecimento entre 2017 e 2019, confirmou à Amnistia Internacional que nunca analisou os fornecedores indiretos da JBS, no Brasil, e indicou que “o relatório de avaliação emitido pela DNV GL não pode ser usado como prova de boas práticas em toda a cadeia de fornecimento”.

“A auditora DNV GL, essencialmente, chamou à atenção da JBS por esta usar as suas auditorias para ocultar o facto de ter falhado na monitorização de toda a cadeia de fornecimento”, nota o diretor do departamento de Crises e Meio Ambiente da Amnistia Internacional, Richard Pearshouse.

O mesmo responsável explica que, “mais uma vez, isto mostra que a JBS monitoriza apenas as fazendas de onde compra o gado, e não aquelas por onde os animais passaram antes”. “Como a nossa investigação revelou, em vários casos em 2019, isso incluiu gado que pastou em fazendas ilegais, localizadas em áreas desflorestadas da Amazónia protegida”, aponta.

“A Amnistia Internacional insta de novo a JBS a adotar, sem demora, um sistema de controlo efetivo de toda a cadeia de fornecimento, incluindo dos seus fornecedores indiretos, para garantir que cumpre, real e comprovadamente, com o critério de deflorestação zero”, afirma Richard Pearshouse.

“A JBS não possuía sistemas para monitorizar a cadeia de fornecimento indireto. Assim, os fornecedores indiretos não foram avaliados durante a auditoria”

Declaração da DNV GL

Na correspondência com a Amnistia Internacional, a DNV GL notava: “Fornecedores indiretos não foram avaliados e declarados como cumpridores da desflorestação zero pela DNV GL. A JBS não possuía sistemas para monitorizar a cadeia de fornecimento indireto. Assim, os fornecedores indiretos não foram avaliados durante a auditoria. O compromisso de desflorestação zero [mecanismo criado pela empresa] abrange a cadeia de fornecimento indireto, mas a JBS não implementou sistemas para responder a esse requisito”.

Contexto

No passado dia 15 de julho, a Amnistia Internacional apresentou o relatório Da Floresta à Fazenda. Tendo por base uma extensa investigação de campo e análises de dados do governo e de imagens de satélite, por parte de especialistas, o documento revela como a JBS adquiriu gado que tinha pastado, de forma ilegal, em três áreas protegidas da Amazónia, no estado de Rondônia, no norte do Brasil, em 2019.

Horas depois da publicação do relatório, o Ministério Público do estado de Rondônia anunciou que iria iniciar uma investigação às conclusões da Amnistia Internacional sobre a JBS. Antes, tinha sido solicitada informação específica à empresa, que declarou: “Não adquirimos gado a nenhuma fazenda envolvida em atividades ilegais em zonas protegidas”. Além disso, referiu que tem uma “política inequívoca de desflorestação zero em toda a cadeia de fornecimento”.

“O compromisso de desflorestação zero abrange a cadeia de fornecimento indireto, mas a JBS não implementou sistemas para responder a esse requisito”

Richard Pearshouse, diretor do departamento de Crises e Meio Ambiente da Amnistia Internacional

A JBS também indicou: “As análises independentes realizadas por destacadas auditoras internacionais da DNV-GL e da BDO, durante os últimos seis anos, revelam que mais de 99,9 por cento das compras de gado da JBS a fazendas situadas na região da Amazónia cumprem os critérios socioambientais da empresa. Isto inclui a desflorestação zero”.

A empresa não respondeu a uma pergunta sobre o controlo dos fornecedores indiretos. Em vez disso, sublinhou que: “A monitorização de toda a cadeia de fornecimento da carne de gado bovino é um desafio para a indústria e representa uma tarefa complexa”.

A Amnistia Internacional não encontrou indícios de que a JBS tenha estado diretamente envolvida em abusos contra os direitos humanos cometidos nos três locais investigados. No entanto, recentemente e em todos os casos, foram levadas a cabo apropriações ilegais de terrenos, que causaram a perda de terras tradicionais, protegidas pela legislação brasileira. O direito dos povos indígenas às suas terras está protegido pelo direito internacional de direitos humanos e as explorações comerciais de gado estão proibidas de desenvolver a sua atividade nas três áreas abrangidas pela investigação.

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