28 Junho 2019

Paula Sebastião faz parte do grupo Arquivo de Identidade Angolano. No mês do “Orgulho”, deixa-nos uma reflexão sobre o progresso e a esperança que alimentam o ativismo LGBTIQ no seu país.

 

Em Julho de 2016, teve lugar o primeiro festival LGBTIQ, o FESTÍRIS, em Angola. Este evento histórico foi concebido de forma a criar um espaço para a comunidade LGBTIQ se encontrar e fomentar a sensibilização para os desafios que enfrenta, através da educação e da recreação. O festival contou com a presença de aliados de todos os sectores da sociedade e proporcionou-lhes um espaço de reflexão e debate da cultura e realidade das pessoas LGBTIQ em Angola.

O sucesso do primeiro FESTÍRIS foi importante para os ativistas do movimento LGBTIQ em Angola. O festival mostrou-nos uma via para sensibilizar a sociedade para esta questão. Compreendemos que, se queríamos ser vistos e ouvidos, teríamos de começar a ocupar cada vez mais espaço público e criar e reforçar pontes de acesso, inclusão e compreensão da comunidade LGBTIQ.

No dia 23 de Janeiro de 2019, a comunidade LGBTIQ angolana celebrou a aprovação do novo Código Penal. Este foi um momento único e histórico, especialmente no contexto africano, não só devido à eliminação do artigo 71.º, que era geralmente interpretado como criminalizador das relações do mesmo sexo, mas também porque a discriminação contra as pessoas com base na sua orientação sexual constitui agora um crime.

Compreendemos que, se queríamos ser vistos e ouvidos, teríamos de começar a ocupar cada vez mais espaço público e criar e reforçar pontes de acesso, inclusão e compreensão da comunidade LGBTIQ

Este ano, o FESTÍRIS teve lugar no dia 17 de Maio, o Dia Internacional contra a Homofobia, a Bifobia e a Transfobia. O festival celebrou a recente vitória, ganha à custa de anos de luta pelos grupos LGBTIQ angolanos, e as implicações do novo Código Penal. E promoveu também a reflexão sobre a história do 17 de Maio e da realidade da discriminação que ainda afecta as pessoas LGBTIQ em Angola. Através de exposições de arte e debates, espectáculos teatrais e mostras de filmes, queríamos sensibilizar as pessoas e aumentar a consciencialização sobre a homofobia, bifobia e transfobia, assim como preparar o terreno para a implementação dos direitos e garantias previstos no novo Código Penal e reflectir sobre os avanços que necessitamos de alcançar no futuro.

O acesso das pessoas LGBTIQ ao emprego continua a esbarrar numa barreira socioeconómica e o novo Código Penal introduziu uma disposição que assegura a não-discriminação no local de trabalho. Dados estes desenvolvimentos, o FESTÍRIS foi aproveitado como uma oportunidade para promover o trabalho das pessoas da comunidade LGBTIQ que têm pequenas empresas e para discutir a inclusão da comunidade no mercado de trabalho. Através de uma feira de emprego com a participação de empresários da comunidade, conseguimos conferir visibilidade às suas competências e mostrar que as pessoas LGBTIQ são capazes de prosperar e contribuir para as indústrias fora do âmbito do mercado informal e do trabalho sexual – os sectores a que as pessoas LGBTIQ se vêem frequentemente restritas.

O acesso das pessoas LGBTIQ ao emprego continua a esbarrar numa barreira socioeconómica e o novo Código Penal introduziu uma disposição que assegura a não-discriminação no local de trabalho

O festival foi um sucesso e contou com a presença de mais de 300 pessoas – tanto da comunidade LGBTIQ como membros do grande público. Conseguimos estabelecer ligações com parceiros e aliados, que assegurarão a repetição anual do evento – desde CSO, PNUD e ONUSIDA até embaixadas de governos apoiantes, tais como as embaixadas da Suécia e dos Países Baixos.

Apesar dos desafios à realização do FESTÍRIS enfrentados por ativistas LGBTIQ, nunca desistiremos porque sabemos que atividades como esta são fundamentais para promover os direitos das pessoas LGBTIQ em Angola e para lhes permitir desenvolverem-se como indivíduos.

Anima-nos a esperança. Sentimos que é possível continuar a trabalhar no sentido de alcançarmos a mudança que desejamos – isto é, reivindicar os nossos direitos e caminhar no sentido da igualdade para todos.

Artigos Relacionados