24 Dezembro 2014

Batalhões de combatentes voluntários pró-governamentais ucranianos estão a intensificar cada vez mais o bloqueio à ajuda alimentar enviada para o Leste da Ucrânia, no que irá seguramente agravar a iminente catástrofe humana na região com a aproximação ao Natal e ao Ano Novo, alerta a Amnistia Internacional.

“Com o Inverno a ganhar força, a já muito desesperada situação no Leste da Ucrânia está a ficar ainda pior com os batalhões de voluntários a impedirem a passagem de ajuda alimentar e o envio de medicamentos para aqueles que tanto disso carecem. Não é segredo nenhum que a região está a enfrentar uma catástrofe humana, com muitas pessoas em risco de passarem fome”, descreve o diretor interino da Amnistia Internacional para a Europa e Ásia Central, Denis Krivocheev. “Estes batalhões operam frequentemente como bandos de renegados e têm urgentemente de ser controlados. Recusar a chegada de alimentos a pessoas apanhadas no meio de um conflito armado é uma violação clara da lei internacional e os responsáveis têm de ser julgados”, defende o perito.

A Amnistia Internacional recolheu testemunhos de que batalhões pró-governamentais ucranianos – incluindo o Dnipro-1 e o Aidar – estão a bloquear a entrada de ajuda humanitária nos territórios controlados pelas autoproclamadas República Popular de Donetsk/República Popular de Luhansk (que referendaram um governo próprio e independente de Kiev).

O batalhão de voluntários Dnipro-1, junto com membros do batalhão de Donbass e da milícia Sector Pravi, estarão a bloquear 11 estradas que conduzem às zonas controladas pelas forças da República Popular de Donetsk (na foto, caravana de ajuda humanitária bloqueada à passagem num posto de controlo perto de Donetsk, a 18 de dezembro).

Estes batalhões têm recusado a passagem à maioria das caravanas de ajuda, porque entendem que os alimentos e as roupas quentes necessárias para enfrentar o Inverno ucraniano vão acabar “nas mãos erradas” e podem ser vendidas em vez de entregues aos que carecem da assistência humanitária. Aqueles combatentes exigem também a libertação de prisioneiros capturados pelas forças separatistas como condição para permitir o fluxo da ajuda humanitária ao Leste do país.

Pelo menos quatro caravanas organizadas pela fundação de ajuda humanitária de Rinat Akhmetov, um dos homens mais ricos da Ucrânia, foram impedidas na semana passada de passar nas estradas que levam ao território sob controlo dos separatistas pelo batalhão Dnirpo-1.

Ao mandar parar uma dessas caravanas de ajuda humanitária, o vice-comandante do batalhão Dnipro-1, Vladimir Manko, declarou aos jornalistas presentes: “Não temos nenhum controlo sobre o que se passa no outro lado. Estamos em guerra com eles e derramamos o nosso sangue, mas ao mesmo tempo estamos a alimentá-los”.

Mais de metade da população daquelas zonas do Leste ucraniano depende completamente neste momento da ajuda alimentar, uma vez que salários, pensões e subsídios sociais não estão a ser pagos de forma regular devido ao conflito que começou em maio. A decisão das autoridades ucranianas em Kiev de cortarem todas as ligações da região com o sistema financeiro do país, em novembro, está também a agravar as dificuldades da população local.

A fome como tática militar é crime de guerra

Um trabalhador de uma organização de ajuda alimentar da região de Luhansk informou a Amnistia Internacional que o batalhão Aidar está igualmente a parar e a fazer buscas aos veículos que circulam de Starobil’sk para Luhansk, e no sentido oposto. Membros daquele batalhão de combatentes voluntários, que já no passado foi acusado de levar a cabo detenções arbitrárias e torturar detidos, estão a impedir a chegada de alimentos e medicamentos a Luhansk, segundo vários testemunhos recolhidos pela Amnistia Internacional.

Este trabalhador humanitário descreveu um incidente em particular em que medicamentos destinados a quatro idosos residentes na cidade de Krasnodon, os quais sofrem de complicações cardíacas e de pressão arterial, foram confiscados numa busca a um autocarro num posto de controlo de estrada.

“Fazer buscas aos conteúdos das caravanas humanitárias que atravessam a frente de batalha é uma coisa. Mas impedir a sua passagem é outra. Tentar criar condições de vida insuportáveis é algo completamente diferente. Usar a fome de civis como tática militar constitui um crime de guerra”, frisa Denis Krivocheev.

A população destas regiões no Leste da Ucrânia sofreu já seis meses de combates entre as forças leais a Kiev e as fações separatistas pró-russas. Mais de 4.700 pessoas morreram e milhares de outras vivem aterrorizadas de serem apanhadas no fogo cruzado ou ficaram totalmente isoladas dos fornecimentos cruciais de alimentos e medicamentos.

A Amnistia Internacional reitera o apelo às autoridades ucranianas para que refreiem os batalhões de combatentes voluntários leais a Kiev e garantam as condições necessárias para que a ajuda humanitária chegue àqueles que precisam dela desesperadamente.

 

 

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