8 Agosto 2020

Há muito que o alarme soou na floresta amazónica brasileira. Incêndios, apropriação de terras tradicionais, ataques a povos indígenas ou criação ilegal de gado são algumas ameaças que a Amnistia Internacional tem documentado e denunciado.

No mais recente relatório, apresentado em meados do mês passado, o tema da desflorestação voltou a estar em destaque devido à existência de animais criados em zonas protegidas da Amazónia na cadeia de fornecimento da JBS, a maior empresa produtora de carne bovina do mundo. Horas depois da sua publicação, o Ministério Público do estado de Rondônia anunciou que iria iniciar uma investigação às conclusões.

Apesar de não ter sido encontrada qualquer prova que indicasse que a JBS está diretamente envolvida em violações de direitos humanos, a empresa falhou na monitorização eficaz da entrada de gado bovino criado ilegalmente na sua cadeia de fornecimento, não tendo adotado um processo adequado de due dilligence. De acordo com os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos, a multinacional brasileira contribuiu para abusos de direitos humanos dos povos indígenas e dos moradores nas Reservas Naturais, ao participar nos incentivos económicos para a criação de animais de forma ilegal em áreas protegidas.

Desde que a última investigação foi divulgada, a JBS tem se deparado com várias consequências. No final de julho, o jornal The Guardian avançou que a principal empresa de serviços financeiros da Europa, a Nordea Asset Management, retirou a empresa do seu portefólio de investimentos. No artigo eram citadas cinco investigações, entre as quais estava uma da Amnistia Internacional.

Também a auditora independente norueguesa DNV GL Business Assurance, contratada pela JBS para auditar a cadeia de fornecimento entre 2017 e 2019, avançou que nunca analisou os fornecedores indiretos da JBS, no Brasil. Por isso, o relatório de avaliação emitido após esse trabalho “não pode ser usado como prova de boas práticas”, conforme a empresa fez.

Do trabalho de campo à análise de imagens de satélite

Neste relatório que analisa as operações da JBS, a Amnistia Internacional teve por base uma extensa investigação de campo, imagens de satélite e a análise de dados de entidades públicas, por parte de especialistas. No final, foi possível afirmar que a empresa adquiriu gado que tinha pastado, de forma ilegal, em três áreas protegidas da Amazónia, no estado de Rondônia, em 2019.

De acordo com a análise aos documentos oficiais de controlo da saúde animal, a JBS comprou gado bovino diretamente de uma quinta localizada na Reserva do Rio Ouro Preto, em duas ocasiões diferentes. Além disso, adquiriu animais a dois criadores que operam tanto em fazendas legais, como em fazendas ilegais, nomeadamente na Reserva Natural do Rio Jacy-Paraná e no território indígena Uru-Eu-Wau-Wau. Em ambos os casos, os fazendeiros movimentaram gado de uma fazenda no interior de uma das áreas protegidas para uma fazenda fora dessa zona. De seguida, foram registadas movimentações separadas para a JBS.

Noutras cinco ocasiões, a empresa comprou gado bovino a um fazendeiro que o criou ilegalmente no território indígena Uru-Eu-Wau-Wau e, noutras quatro, adquiriu a um outro com operações na Reserva Natural do Rio Jacy-Paraná.

Os povos indígenas de Uru-Eu-Wau-Wau e os moradores de Rio Ouro Preto e da Reserva Natural do Rio Jacy-Paraná sofreram graves abusos de direitos humanos, incluindo ameaças recorrentes e apropriação de terras, associadas à criação de gado bovino ilegal nas suas terras.

Terras indígenas em perigo

Em 2019, a Amnistia Internacional visitou cinco áreas protegidas na Amazónia brasileira: as Terras Indígenas Karipuna e Uru-Eu-Wau-Wau, as Reservas Extrativistas do Rio Ouro Preto e do Rio Jacy-Paraná (no estado de Rondônia), e a Terra Indígena Manoki (no estado de Mato Grosso).

As chamadas reservas extrativistas são áreas destinadas à proteção do meio ambiente, dos meios de vida e da cultura das suas populações tradicionais, recorrendo ao uso sustentável dos recursos naturais. Assim como as terras indígenas, estas áreas são protegidas pela legislação brasileira e por tratados internacionais.

Nessa altura, já foi possível concluir que as apropriações ilegais de terras quase sempre estavam ligadas à criação de bovinos. Pecuaristas e grileiros (indivíduos que se apropriam ilegalmente das terras) seguem um padrão recorrente de conversão da floresta tropical em áreas de pastagem. Primeiro, identificam os lotes, depois, cortam e retiram as árvores e ateiam fogo ao local (geralmente, várias vezes). Por último, plantam capim e levam o gado.

A abertura de novas estradas e o aparecimento de acampamentos nas áreas protegidas de floresta são alguns dos sinais de que esse processo foi iniciado. Nas áreas que foram visitadas, a Amnistia Internacional comprovou como estas atividades eram comuns na terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau, grande parte da qual coincide com o Parque Nacional de Pacaás Novos.

Moradores indígenas e tradicionais de quatro destas cinco áreas protegidas contaram à Amnistia Internacional que as invasões costumam ser acompanhadas por violência, ameaças e atos de intimidação.

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Não queremos gado bovino criado ilegalmente na Amazónia (petição encerrada)

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