3 Maio 2021

por Stefan Simanowitz, dirigente da campanha Free Turkey Media

Com a administração Biden e os líderes da UE a pressionar as relações com a Turquia, poderá a liberdade de imprensa começar a ser restaurada? No Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, 3 de maio, Stefan Simanowitz explora esta questão.

“Acusar jornalistas de auxiliarem terroristas por não seguirem a linha do regime é o primeiro passo para um estado totalitário” disse-me, há uns anos, a jornalista Sue Turton.

Turton – a força por detrás da campanha #FreeAJStaff, que ajudou a libertar três jornalistas da Al Jazeera presos no Egito em 2013 – partilhava as suas convicções sobre como garantir a libertação de mais de 100 jornalistas injustamente detidos na Turquia.

O país está entre os Estados com mais jornalistas atrás das grades pelo quinto ano consecutivo, estando em 153º lugar entre 180 países, na recém-publicada Classificação Mundial da Liberdade de Imprensa, entre a Bielorrússia e o Ruanda.

Desde a tentativa falhada de golpe de Estado, em julho de 2016, pelo menos 180 órgãos de comunicação social foram encerrados na Turquia e muitos jornalistas presos por “crimes de terrorismo” infundamentados – muitos acusados devido a ilustrações ou opiniões partilhadas no Twitter.

A COVID-19 trouxe receios adicionais para os jornalistas presos. Na semana passada, a Turquia entrou no seu segundo confinamento, mas a sobrelotação e as instalações insalubres eram uma preocupação que, muito antes da pandemia, já colocava uma grave ameaça para a saúde da população prisional turca.

Então, como podemos ajudar a tirá-los da cadeia?

“O meu conselho é construir solidariedade internacional”, diz-me Sue Turton. “Quando os meus colegas foram condenados no Egito, sabíamos que a nossa melhor arma era a solidariedade dos meios de comunicação em todo o mundo”.

Portanto, fizemos isso mesmo. No Dia Mundial da Liberdade de Imprensa de 2017, a Amnistia Internacional, juntamente com outras organizações de direitos humanos, lançou a campanha Free Turkey Media (Libertem os Media na Turquia). Quatro anos volvidos, mais de 250.000 pessoas assinaram uma petição online apelando à libertação imediata dos jornalistas da Turquia. Milhares de outras publicaram ‘selfies de solidariedade’ no Twitter e, jornalistas, políticos e celebridades proeminentes também se juntaram ao apelo.

Ainda assim, a situação dos jornalistas na Turquia continua terrível.

Alguns dos jornalistas mais respeitados do país – os Christiane Amanpours, Medhi Hassans e Anderson Coopers da Turquia – estão exilados, enfrentam investigações ou estão atrás das grades. Alguns estão a cumprir penas de prisão perpétua absurdas, muitos outros são mantidos em prisão preventiva por acusações sem fundamento.

De acordo com a lei e os padrões internacionais de direitos humanos, a prisão preventiva deve ser uma medida excecional a ser aplicada, apenas se outras alternativas não forem adequadas para impedir um risco substancial de fuga, dano a terceiros ou interferência com as provas ou com a investigação. Considerando que a privação de liberdade só deve ocorrer como último recurso, ela é aplicada regular e punitivamente na Turquia. O seu impacto é devastador para o panorama dos meios de comunicação no país.

Apesar dos riscos elevados, a coragem dos jornalistas em toda a Turquia leva-os a continuar o seu trabalho, mesmo num clima de medo, enquanto as autoridades tentam limitar todo o jornalismo independente e silenciar as vozes críticas.

“Trabalhar sob a ameaça constante de prisão e condenação torna a vida extremamente difícil, mas o jornalismo é a nossa profissão. Temos que desempenhá-la”, diz Çağdaş Kaplan, editor do portal de notícias online Gazete Karınca. “Há uma verdade claramente visível na Turquia, mas há também uma tentativa de a esconder da sociedade. Alguém tem de falar sobre ela, e é isso que estamos a tentar fazer.”

“Para os jornalistas, a Turquia tornou-se uma masmorra”, diz o jornalista Hakkı Boltan. A sua organização – a Free Journalists Association (Associação Jornalistas Livres) – foi ironicamente encerrada em novembro de 2016.

De facto, aqueles que antes apenas observavam casos judiciais da zona de imprensa, agora assistem no banco dos réus.

Mas existe esperança.

A nova administração Biden nos EUA assumiu uma linha muito mais dura sobre os direitos humanos na Turquia.

Há um mês, os EUA apontaram à Turquia uma série de “questões significativas de direitos humanos”, que vão desde alegações de assassinatos arbitrários e tortura à prisão de dezenas de milhares de vozes críticas, incluindo adversários políticos, advogados, jornalistas e defensores dos direitos humanos.

Há, igualmente, indícios de que os direitos humanos estão a regressar à ordem do dia em movimentações para redefinir as relações UE-Turquia.

No mês passado, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, encontrou-se com o presidente Recep Tayyip Erdogan e afirmou que “a Turquia deve respeitar as regras e os padrões internacionais de direitos humanos”.

Estará esta pressão diplomática – juntamente com o apoio e a solidariedade de jornalistas e ativistas em todo o mundo – a começar a ter um impacto?

Ainda é cedo para dizer, mas no mês passado, Ahmet Altan – o destacado autor e ex-editor de jornais que cumpria uma sentença de dez anos, baseada em acusações ridículas – foi libertado na sequência de uma decisão do tribunal de recurso para anular a sua condenação.

Em 2018, dois anos após a sua injusta prisão, Ahmet Altan escreveu: “Posso nunca mais voltar a ver este mundo”.

Embora ele ainda enfrente a ameaça constante de voltar a ser preso, o facto de hoje estar de regresso a casa com a sua família, oferece-nos uma luz de esperança no meio da escuridão.

O Dia Mundial da Liberdade de Imprensa é um dia para recordarmos os jornalistas em todo o mundo que foram assediados, intimidados, presos ou mesmo mortos pelo seu trabalho. Mas é também um dia para nos reforçarmos.

É um momento para reagir contra a tendência crescente entre os governos que estão a prender jornalistas e a promulgar leis usadas para criminalizar o seu trabalho legítimo. E é um tempo para deixar claro aos governos – incluindo na Turquia – que asfixiar os meios de comunicação de uma nação é um ato deliberado de automutilação sobre o qual nós, enquanto jornalistas, continuaremos a escrever até ao dia em que eles vierem para nos levarem as canetas.

Stefan Simanowitz dirige a campanha Free Turkey Media, uma iniciativa da Amnistia Internacional com as organizações PEN, Repórteres Sem Fronteiras (RSF), Article 19, Human Rights Watch, Comité para a Proteção dos Jornalistas, Index on Censorship, entre outras.

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