14 Março 2014

O aumento de violência e de desaparecimentos na Ucrânia obrigam a que sejam enviados prontamente monitores internacionais de direitos humanos para todo o país antes do referendo deste próximo domingo que pode levar à secessão da região da Crimeia, insta a Amnistia Internacional.

“Várias partes do país estão à beira de mergulhar na violência. Não há tempo a perder, com o referendo marcado para daqui a dois dias”, frisa o diretor do programa Europa e Ásia Central da Amnistia Internacional, John Dalhuisen. “Neste contexto de aumentar da tensão no país e da violência mortal que agora eclodiu entre os grupos pró-ucranianos e pró-russos, há a necessidade crítica de uma missão forte de direitos humanos com acesso incondicional a todas as partes da Ucrânia, incluindo a Crimeia”, prossegue.

Este soar de alerta da Amnistia Internacional surge após ter sido morte um manifestante em confrontos violentos entre pró-russos e pró-ucranianos na cidade de Donetsk, no leste da Ucrânia, de depois de terem aumentado as denúncias de mais desaparecimentos de ativistas na Crimeia.

A península, bem no sul da Ucrânia, tem vindo a ficar cada vez mais isolada do resto do mundo, após a Rússia ter efetivamente tomado o controlo de toda a atividade militar na zona há duas semanas.

Desaparecimento de ativistas na Crimeia

A Amnistia Internacional atesta que pelo menos três ativistas desapareceram na noite de 13 de março na capital da península, Sinferopol. No dia seguinte, investigadores da organização contactaram com o pai de Oleksi Gritsenko, um dos manifestantes da Maidan (a Praça da Independência, em Kiev, a capital ucraniana), o qual está desaparecido junto com outros dois ativistas do movimento: Natalia Lukiantchenko e Serguei Suprun. Todos se tinham deslocado para a Crimeia na semana passada.

O pai de Oleksi Gritsenko confirmou à Amnistia Internacional que não foi possível falar com nenhum daqueles três ativistas desde as 23h de 13 de março, quando Natalia Lukiantchenko telefonou a outros ativistas contando que o carro em que seguiam fora perseguido e que tinham disparado contra eles.

Os telemóveis de dois destes ativistas foram detetados, por sinal satélite, nas proximidades do comissariado militar de Sinferopol, onde estão atualmente mobilizadas tropas sem nenhuma identificação nos uniformes. Ali negam que os três ativistas estejam detidos no comissariado. O carro em que seguiam está também desaparecido.

A Amnistia Internacional insta as autoridades da Crimeia a localizarem prontamente Oleksi Gritsenko, Natalia Lukiantchenko e Serguei Suprun e a garantirem a sua imediata e incondicional libertação.

“Os relatos de repressão e intimidação de ativistas e jornalistas pelas forças militares que estão a operar agora na Crimeia constituem um desenvolvimento profundamente preocupante num cenário em que os abusos de direitos humanos já são frequentes”, nota John Dalhuisen. “Reiteramos os nossos apelos tanto às autoridades da Crimeia como aos militares que controlam de facto a região para que permitam que as pessoas exerçam pacificamente os seus direitos sem a ameaça de intimidação e violência”.

Sem-lei e com violência de multidões

Enquanto o mundo inteiro está de olhos postos na Crimeia, violações de direitos humanos continuam a ser cometidas em outras partes da Ucrânia. A Amnistia Internacional está também preocupada que a polícia esteja a falhar a sua missão de proteger adequadamente os cidadãos que exercem de forma pacífica os seus direitos de liberdade de expressão e de reunião e assembleia.

Na noite desta quinta-feira, 13 de março, pelo menos um manifestante foi morto e muitos feridos na eclosão de violência entre protestos pró-ucranianos e pró-russos na cidade industrial de Donetsk, no leste do país.

Apenas uns dias antes, um investigador da Amnistia Internacional tinha estado em Donetsk para monitorizar uma manifestação e notou que caso não fossem feitos progressos significativos de policiamento o risco de mortes era claramente elevado e sério.

Um manifestante no protesto de quinta-feira expressou a sua desconfiança à Amnistia Internacional: “Não acredito que a polícia esteja disposta ou sequer que nos queira proteger. Depois de a maior parte das pessoas se ter ido embora, nós, que ficámos para trás, fomos atacados”.

Vídeos feitos em Donetsk naquela noite mostram que inicialmente foi mantido um cordão policial a separar os grupos opostos, mas a certa altura foi permitido que uma multidão de homens armados com paus, tubos de metal e facas passassem aquela linha e atacassem os manifestantes pró-ucranianos.

A Amnistia Internacional obteve relatos de que os agentes deram indicações a todos os que estavam a ser atacados para entrarem num dos camiões da polícia o que, na essência, os tornou num alvo ainda mais fácil, uma vez que o veículo estava bloqueado por dois carros e nele não se encontrava motorista nem qualquer outro polícia.

“[Os atacantes] partiram as janelas e muitos de nós feridos. Havia uma dezena de polícias perto do autocarro, e umas boas centenas um pouco mais distantes, e nem uns nem outros intervieram. Aqueles que nos atacaram gritavam-nos para nos ajoelharmos. Vi um dos ativistas que estava connosco caído no chão, a sangrar. Três polícias ali mesmo ao pé olhavam para ele e não fizeram nada durante imenso tempo”, denuncia ainda este manifestante.

O diretor do programa Europa e Ásia Central da Amnistia Internacional frisa que “aquilo que começou como um protesto pacífico em Donetsk [na noite de quinta-feira] transformou-se rapidamente no mais grave episódio de violência desde os confrontos da Maidan, que provocaram o derrube do Governo em Kiev”. “Com a tensão ao rubro desta forma, a polícia tem de respeitar e proteger os direitos de todos os grupos a manifestarem-se pacificamente”, remata John Dalhuisen.

 

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