5 Maio 2017

Em vésperas da segunda volta das eleições presidenciais francesas, a Amnistia Internacional alerta todo o eleitorado no país a ponderar o enorme impacto deste sufrágio para os direitos humanos – impacto que não se limita às fronteiras de França. Antes é também potencialmente europeu e internacional, sendo a França Estado-membro da União Europeia e do Conselho da Europa assim como membro-permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas.

“A Amnistia Internacional, fiel ao seu princípio de imparcialidade e ao seu carácter apartidário, nunca apelou, em toda a sua história, a votar a favor ou contra qualquer candidato. Mas temos o dever de alertar quando os direitos humanos são ameaçados por certos aspetos dos programas dos candidatos às mais altas funções do Estado”, frisa a presidente da Amnistia Internacional França, Camille Blanc.

A Amnistia Internacional França apresentou uma lista de dez compromissos em direitos humanos a todos os candidatos nas eleições presidenciais. Dos apurados para a segunda volta do sufrágio, que se realiza este domingo, 7 de maio, Emmanuel Macron pronunciou-se favorável a nove dos compromissos propostos pela organização de direitos humanos. Marine Le Pen não respondeu.

“As propostas feitas por Emmanuel Macron respeitam sobretudo a valores e princípios gerais que vão, globalmente, ao encontro das nossas recomendações, nomeadamente no que toca à luta contra a discriminação, à defesa do direito de asilo e à proibição da vigilância em larga escala. Mas as suas propostas precisam ainda de ser detalhadas e esclarecidas, por exemplo no que se refere à responsabilidade das empresas em matérias de direitos humanos”, avalia Camille Blanc.

Para a presidente da Amnistia Internacional França, já Marine Le Pen, “durante a campanha, apresentou várias propostas perigosas para os direitos humanos, especialmente sobre asilo, sobre as liberdades e a igualdade no acesso aos direitos”. “Considerar que certas pessoas têm menos direitos que outras, é pisotear a própria ideia de direitos fundamentais universais”, sublinha ainda.

A universalidade dos direitos humanos foi claramente proclamada pela comunidade internacional desde 1948 com a Declaração Universal dos Direitos Humanos e é essencial para preservar e manter vivo esse legado.

A Amnistia Internacional deplorou expressamente, incluindo no mais recente Relatório Anual sobre o estado dos direitos humanos no mundo, a multiplicação dos discursos de numerosos líderes políticos na Europa e no mundo que promovem o isolacionismo e uma retórica de divisão.

A organização de direitos humanos recorda que os direitos humanos não constituem uma ameaça nem um entrave à segurança. São, pelo contrário, o pedestal do Estado de direito e os alicerces de uma sociedade na qual cada pessoa pode viver em segurança e em pleno respeito da sua dignidade.

Candidatos da segunda volta face-a-face aos direitos humanos

A Amnistia Internacional interpelou os candidatos às eleições presidenciais em França a assumirem compromisso em dez questões fundamentais de direitos humanos: estado de emergência, privacidade, refugiados, comércio de armas, civis nos conflitos, responsabilidade social das empresas, são alguns desses temas.

Estes pedidos de compromisso e de esclarecimentos feitos aos candidatos para a segunda volta – Marine Le Pen e Emmanuel Macron –, e cujas respostas foram cruzadas com os seus respetivos programas oficiais de governação, visam exclusivamente colocar os direitos humanos no cerne das políticas em França.

Fim do estado de emergência

Marine Le Pen: não respondeu à interpelação da Amnistia Internacional. O seu programa indica vontade de preservar as liberdades individuais, mas não aborda a questão do estado de emergência e contém medidas perigosas para os direitos humanos.

Emmanuel Macron: reconheceu que o estado de emergência não pode ser permanente e precisou que “só pode ser levantado à luz da situação no momento” sem indicar em que condições e sob que modelo. O candidato escusou-se a assinar o compromisso de cessação do estado de emergência em França.

Respeito pela vida privada

Marine Le Pen: não respondeu à interpelação da Amnistia Internacional. O seu programa propõe a proteção dos dados pessoais, mas a única medida avançada, de armazenamento apenas em território francês, não garante a sua proteção.

Emmanuel Macron: declarou compromisso de respeito pela vida privada dos cidadãos, considerando que “não pode haver vigilância maciça num Estado democrático”, enunciando ainda as condições sob as quais entende que pode ser feita a vigilância.

Garantir e proteger o direito de reunião e de manifestação pacífica

Marine Le Pen: não respondeu ao pedido de esclarecimento da Amnistia Internacional e esta questão em específico não é tão pouco abordada no seu programa de governação. Mas a análise a fundo de várias outras propostas concretas nele contidas, que são discriminatórias, estigmatizantes e perigosas para os direitos humanos, põem em causa os princípios das liberdades fundamentais.

Emmanuel Macron: comprometeu-se a respeitar este direito fundamental. O seu programa não menciona, porém, o direito de reunião e de manifestação pacífica e o candidato defende que a segurança é “a primeira das nossas liberdades”, propondo, sem detalhar em que condições e termos, o “desmantelamento de associações que, sob pretextos religiosos, ataquem a república” e “o fecho definitivo dos lugares de culto onde seja feita a apologia do terrorismo”.

Acolhimento de um maior número de pessoas refugiadas vulneráveis

Marine Le Pen: não respondeu, nem este ponto é abordado no seu programa oficial.

Emmanuel Macron: declarou-se favorável a este compromisso de direitos humanos, mas o seu programa não o menciona.

Garantir acesso célere aos procedimentos de asilo

Marine Le Pen: não respondeu e o seu programa contém restrições importantes ao direito de asilo que o tornarão praticamente inacessível, o que é contrário ao disposto no direito internacional e aos compromissos assumidos pela França. As suas propostas sobre o controlo de fronteiras violam as obrigações internacionais a que o país está vinculado em termos de direito de asilo e de acolhimento de refugiados.

Emmanuel Macron: assumiu compromisso nesta matéria e o seu programa prevê a simplificação e celeridade dos procedimentos de asilo, sem precisar as garantias a adotar para assegurar o respeito pelos direitos dos requerentes de asilo. As medidas concretas que propõe introduzem uma dinâmica interessante, visando reduzir os prazos de análise dos requerimentos de asilo, mas requerem afinação para garantir que a rapidez e a eficácia nos procedimentos não põem em causa a sua qualidade.

Erradicar os bairros degradados e interditar os desalojamentos forçados

Marine Le Pen: não respondeu e esta questão não é contemplada no seu programa, mas as propostas de dar prioridade aos cidadãos franceses no acesso à habitação é discriminatória e contrária ao respeito pelos direitos humanos.

Emmanuel Macron: declarou o seu compromisso nesta matéria e avançou, na sua resposta, que “a destruição de bairros degradados sem uma solução alternativa é um método tão hipócrita quanto dispendioso e ineficaz”.

Reforçar o acesso à justiça para os lesados por atividades de empresas francesas em outros países

Marine Le Pen: não respondeu à interpelação de compromisso e de esclarecimentos pedidos pela Amnistia Internacional. O seu programa prevê “romper” com o programa económico, mas não contém nenhuma menção à responsabilidade empresarial.

Emmanuel Macron: assumiu compromisso nesta matéria e, na sua resposta, indicou querer “prestar maior segurança jurídica às empresas francesas, tornando-as mais competitivas e também responsáveis”, sem avançar detalhes concretos.

Controlar o comércio de armas

Marine Le Pen: não respondeu nem esta matéria é referida no seu programa oficial.

Emmanuel Macron: declarou-se favorável a este compromisso de direitos humanos, mas o seu programa não o contempla.

Garantir ativamente a proteção dos civis em conflitos

Marine Le Pen: não respondeu nem a questão é abordada no seu programa oficial.

Emmanuel Macron: assumiu este compromisso, mas o seu programa é omisso nesta matéria.

Proteger os defensores de direitos humanos

Marine Le Pen: não respondeu nem contempla esta questão no seu programa.

Emmanuel Macron: declarou-se favorável a este compromisso e, na sua resposta, frisou que pretende que tal seja “uma prioridade” do seu mandato, avançando uma série de medidas e políticas concretas a adotar pelas autoridades francesas.

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