16 Dezembro 2015

As empresas de tecnologia têm de rejeitar os esforços feitos pelas autoridades chinesas em influenciarem a governança global da Internet de formas que limitarão a liberdade de expressão e irão exacerbar os abusos de direitos humanos, alerta a Amnistia Internacional com o arranque, esta quarta-feira, 16 de dezembro, de uma grande conferência mundial sobre o mundo digital de que a China é anfitriã e onde o país está a tentar fazer adotar um conceito de “soberania”.

O presidente chinês, Xi Jinping, tem agendado fazer um discurso perante as chefias de topo das maiores empresas globais de tecnologia que participam nesta cimeira de três dias, em Wuzhen, na região leste do país.

O Governo da China tutela um dos mais repressivos regimes de censura da Internet no mundo inteiro. As autoridades continuam a usar leis com uma linguagem e termos vagos para arbitrariamente tomar como alvo os cidadãos por tão simplesmente exercerem o direito de liberdade de expressão no espaço digital. Desde que o Xi Jinping (na foto, com Mark Zuckerberg, co-fundador e presidente do Facebook) assumiu o poder, centenas de pessoas foram detidas apenas por manifestarem as suas opiniões online.

“Sob o disfarce da soberania e da segurança, as autoridades chinesas estão a tentar reescrever as regras da Internet de maneira a que a censura e a vigilância se tornem a norma em todo o lado. Isto é um ataque em todas as frentes contra as liberdades da Internet”, frisa a diretora de investigações da Amnistia Internacional para a Ásia Oriental, Roseann Rife. “As empresas de tecnologia, incluindo a Apple, a Google, o Facebook, o LinkedIn e a Microsofty, têm de estar preparadas para dizerem ‘não’ ao regime repressivo da Internet que a China exerce e a porem as pessoas e os princípios acima dos lucros.

Desde 2014, o Governo chinês tem vindo a promover cada vez mais a ideia de “soberania na Internet” no âmbito da governança global da Internet. E já por duas vezes, as autoridades chinesas tentaram obter compromissos escritos por parte de grandes empresas globais do digital.

Na primeira Conferência Mundial da Internet, em novembro de 2014, e que se realizou também em Wuzhen, acabaram por falhar os esforços da China em conseguir que as empresas participantes no evento assinassem uma declaração em que se instava a comunidade internacional a “respeitar a soberania na Internet de todos os países”.

Em setembro deste ano, o Governo chinês tentou de novo garantir compromissos escritos da parte de grandes empresas de tecnologia norte-americanas antes da visita de Estado do Presidente a Washington. Esse compromisso vinculava os signatários a garantirem que “não causarão danos à segurança nacional da China”, comprometia as empresas a armazenarem os dados dos utilizadores chineses de Internet em território do país e a “aceitarem supervisão sobre todas as partes da sociedade”. Esta terminologia consolidaria a posição do Governo chinês de que deve ter poderes não sujeitos a monitorização para aceder às operações e à informação coligida pelas empresas de tecnologia.

Independentemente das táticas repressivas do Governo chinês, as empresas de tecnologia têm a responsabilidade de respeitarem os direitos humanos consagrados internacionalmente, incluindo o direito à privacidade, a liberdade de expressão e a proteção em não se ser detido ilegalmente. Isto significa que as empresas de tecnologia têm de questionar e adotar medidas e mecanismos para garantir que não contribuem para violações de direitos humanos.

“O impacto da ‘soberania na Internet’ da China é real e devastador. São os defensores de direitos das mulheres, são os ativistas anticorrupção e todos os que se manifestam a favor de reformas políticas que são silenciados, e que enfrentam a ameaça de longas penas de prisão por caírem nas más graças do regime de censura online das autoridades chinesas”, alerta Roseann Rife. “As empresas de tecnologia não podem virar as costas a esta repressão, nem dar aval a nenhuma espécie de ideia de soberania na Internet que ataque os direitos de privacidade e de liberdade de expressão”, prossegue a perita da organização de direitos humanos.

Na passada segunda-feira, o advogado Pu Zhiqianq começou a ser julgado em Pequim. Este renomado advogado de direitos humanos arrisca uma pena de oito anos de prisão sob as acusações de “provocação de distúrbios” e “incitamento ao ódio étnico”, assentes essencialmente em sete mensagens que publicou nas redes sociais, no total de 600 caracteres, e nos quais criticava o Governo.

Milhares de websites permanecem bloqueados na China, incluindo serviços de social media como o Facebook, o Instagram e o Twitter. Numerosíssimas frases são censuradas nas redes sociais e nos resultados de pesquisas na Internet, incluindo qualquer menção à repressão na Praça de Tiananmen em 1989. O magnata chinês do digital Lu Wei tem defendido a adoção dos controlos preconizados pelas autoridades, descrevendo-os como necessários para manter a ordem.

Uma nova proposta de lei em matéria de segurança digital, apresentada este ano, apenas viria intensificar mais a já rígida censura e extensa vigilância que a China faz à Internet. Esta proposta de lei, a par de uma série de provisões existentes em outras peças legislativas, como a Lei Antiterrorismo, prevê que os fornecedores de Internet armazenem todos os dados pessoais em território da China e que os entreguem às autoridades sem a necessidade de uma autorização judicial nem fiscalização independente, com o argumento de preservação da “soberania na Internet”.

 

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