14 Junho 2011

Na véspera do primeiro aniversário da onda de violência que abalou parte do sul do Quirguistão, a Amnistia Internacional alertou que a falta de justiça para os homicídios, violações e tortura de civis pode conduzir a novos conflitos.

Quatro dias de conflitos violentos entre indivíduos da etnia quirguize e indivíduos da etnia uzbeque nas áreas de Osh e Jalal-Abad, entre o dia 10 e 14 de Junho de 2010, mataram 470 pessoas, deixaram milhares feridas e centenas de milhares de pessoas deslocadas.

De acordo com observadores locais, 74% das pessoas mortas eram da etnia uzbeque e 25% da etnia quirguize.

Um ano depois, o relatório da Amnistia Internacional, “Still waiting for justice”, apela às autoridades do Quirguistão para estabelecerem a verdade sobre o que aconteceu e providenciar justiça para os milhares de vítimas e para as suas famílias.

“A falha em levar à justiça aqueles que estão por de trás da violência pode fornecer solo fértil para as sementes de futuros tumultos e futuras violações dos direitos humanos,” afirmou Nicola Duckworth, Director do Programa da Amnistia Internacional para a Europa e Ásia Central. 

“Apesar das autoridades terem tomado alguns passos positivos, como providenciar compensação para as vítimas e prometido fazer uma revisão aos casos de tortura, ainda têm muito que fazer para resolver o problema das violações dos direitos humanos que ocorreram durante e após a onda de violência e restaurar a confiança de todos os grupos étnicos no Quirguistão que têm uma participação igual no futuro do país.”

Durante a onda de violência, foram documentados cerca de vinte casos de violação sexual e  outros tipos de violência sexual, mas os defensores dos direitos humanos acreditam que o número real seja muito superior. Grande parte das vítimas eram mulheres uzbeques e os perpetradores eram na sua maioria homens quirguizes.

O relatório da Amnistia Internacional apurou que, na sequência da violência, as forças de segurança do Quirguistão usaram força excessiva nas suas operações de investigação e torturaram ou maltrataram detidos.

75% das vítimas eram da etnia uzbeque e possuíam 90% das propriedades perdidas. Contudo, de acordo com os números oficiais, das 271 pessoas que foram levadas sob custódia em ligação à violência do mês de Junho de 2010, 230 eram da etnia uzbeque e apenas 29 eram da etnia quirguize.

No seguimento de julgamentos injustos, durante os quais não foram investigadas alegações de confissões forçadas, testemunhas de defesa que não foram ouvidas e advogados foram ameaçados e sofreram ataques físicos, os tribunais proferiram pelo menos 27 sentenças de prisão perpétua, todas a pessoas da etnia uzbeque.

“Discriminação étnica e corrupção estão por trás da impunidade predominante no Quirguistão. Milhares de casos em aberto relacionados com os acontecimentos do mês de Junho aguardam conclusão. Até que isso aconteça, centenas, se não milhares, de oficiais e civis, indivíduos da etnia quirguize e indivíduos da etnia uzbeque, fogem à responsabilidade pelos crimes que cometeram,” afirmou Nicola Duckworth.

“O Estado de Direito deve ser respeitado para que se possa reconstruir a confiança entre os grupos étnicos e prevenir futuros derramamentos de sangue. Todos os crimes, incluindo os crimes contra a humanidade, devem ser investigados e julgados em processos justos.”

A Comissão Internacional de Inquérito à violência descobriu fortes provas de violações aos direitos humanos generalizadas, sistemáticas e coordenadas, contra pessoas da etnia uzbeque, que equivaleriam a crimes contra a humanidade uma vez provados em tribunal.

Segundo o relatório da Comissão Internacional de Maio de 2011, as investigações e processos subsequentes tinham falhas e eram etnicamente preconceituosos. Concluía que o uso da tortura sobre os detidos em ligação à onda de violência, foi “quase universal”.

“As autoridades do Quirguistão devem implementar imediatamente as recomendações da Comissão Internacional,” afirmou Nicola Duckworth.

“Devem assegurar que os ataques, no decurso dos quais os indivíduos de etnia uzbeque foram agredidos, mortos e violados sexualmente durante vários dias, sejam investigados e julgados  ao abrigo do direito internacional.”

 

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