14 Setembro 2021

O Conselho dos Direitos Humanos da ONU deve reconhecer um ambiente seguro, limpo, saudável e sustentável como um direito humano universal, referiu hoje a Amnistia Internacional. Com milhões de pessoas a passarem fome e deslocarem-se forçadamente devido aos efeitos das alterações climáticas e da degradação ambiental, é mais claro do que nunca que a vida e a dignidade humana dependem de um ambiente saudável.

Tem hoje início, em Genebra, a 48ª sessão regular do Conselho dos Direitos Humanos (CDH). Juntamente com mais de 1.000 grupos da sociedade civil e de Povos Indígenas, a Amnistia Internacional junta-se a um apelo aos Estados-membros para que adotem uma resolução que reconheça formalmente o direito a um ambiente saudável. Os Estados-membros devem também estabelecer um novo mandato para um Procedimento Especial das Nações Unidas sobre direitos humanos e alterações climáticas.

“Os impactos radicais do clima expuseram, com uma clareza devastadora, como um ambiente saudável é essencial para o usufruto de todos os nossos outros direitos. É fácil tomar o nosso planeta como garantido até vermos o custo humano da sua degradação: fome, deslocações, desemprego, privação de habitação, doença e mortes”, mencionou Agnès Callamard, secretária-geral da Amnistia Internacional.

“É fácil tomar o nosso planeta como garantido até vermos o custo humano da sua degradação: fome, deslocações, desemprego, privação de habitação, doença e mortes”

Agnès Callamard

“O fracasso dos governos em agir sobre as alterações climáticas face à evidência científica esmagadora pode mesmo ser a maior violação intergeracional dos direitos humanos na história. Enquanto principal organismo global de direitos humanos, o CDH deve utilizar todos os instrumentos à sua disposição para contrariar a crise. Apelamos a todos os Estados para que apoiem o reconhecimento do direito a um ambiente saudável, nas Nações Unidas e a nível nacional. Aqueles que não o fizerem, estarão do lado errado da história e a posicionar-se contra o futuro comum da humanidade.”

“O fracasso dos governos em agir sobre as alterações climáticas face à evidência científica esmagadora pode mesmo ser a maior violação intergeracional dos direitos humanos na história”

Agnès Callamard

Um direito humano crucial

O direito a um ambiente saudável é legalmente reconhecido em mais de 80% dos Estados-membros da ONU através de constituições, legislação, decisões judiciais e tratados regionais. Para muitos, este direito está também implícito em tratados globais de direitos humanos, embora não tenha sido explicitamente reconhecido por vários Estados das Nações Unidas. Diversas entidades da ONU e outros órgãos intergovernamentais, bem como ONG, sindicatos e grupos empresariais, manifestaram o seu apoio ao reconhecimento global do direito a um ambiente saudável.

O reconhecimento pelas Nações Unidas deixaria claro que os Estados têm a obrigação de proteger, respeitar e cumprir este direito. Incentivaria os Estados que não reconhecem este direito nas suas leis nacionais a fazerem-no, e motivaria outros a reforçar a sua legislação. Apoiaria ainda o trabalho crítico dos defensores de direitos humanos ambientais, reforçando a legitimidade dos seus esforços e exercendo mais pressão sobre os Estados, para os protegerem de ameaças e ataques.

Simultaneamente com a criação de um Procedimento Especial sobre Alterações Climáticas e Direitos Humanos, o reconhecimento formal também tornaria mais fácil para a ONU apoiar os Estados na melhoria do seu desempenho em matérias ambientais. Atualmente, o envolvimento dos organismos de direitos humanos das Nações Unidas em temas ambientais depende do vínculo entre impactos ambientais e outros direitos – por exemplo, poderiam analisar se o direito a habitação adequada foi violado através da desflorestação, ou se o direito à saúde está ameaçado pela incapacidade de combater a poluição atmosférica. Um direito universalmente reconhecido a um ambiente saudável facilitaria aos organismos de direitos humanos da ONU examinar o cumprimento, pelos Estados, das suas obrigações de direitos humanos relacionadas com o ambiente, e providenciar apoio e assistência aos mesmos na promoção desse cumprimento.

A investigação demonstra que o reconhecimento, a nível estatal, do direito a um ambiente saudável contribui para melhores resultados ambientais, incluindo ar mais limpo, melhor acesso a água potável e segura, e a redução das emissões de gases com efeito de estufa. Capacita igualmente as comunidades a defenderem os seus direitos face aos impactos ambientais adversos que se ligam à responsabilidade estatal e corporativa.

“Como salientou o Relator Especial dos Direitos Humanos e Meio Ambiente da ONU, quando as Nações Unidas adotaram resoluções que reconheciam os direitos humanos à água e a saneamento em 2010, isso impulsionou muitos Estados a incluir estes direitos na sua legislação nacional. Além disso, mobilizou milhares de milhões de dólares para um maior investimento em infraestruturas hídricas, melhorando notavelmente as vidas de centenas de milhões de pessoas”, afirmou Agnès Callamard.

“O reconhecimento do direito a um ambiente saudável poderá desencadear mudanças transformadoras semelhantes nas abordagens estatais às alterações climáticas. Apelamos a todos os Estados-membros do CDH para que aproveitem esta oportunidade para intensificar o trabalho do CDH sobre a crise climática – um dos mais assustadores e urgentes desafios de direitos humanos na história.”

 

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