22 Janeiro 2015

O ataque com um obus sobre um autocarro na cidade ucraniana de Donetsk, em que morreram pelo menos oito civis, possivelmente 15, constitui uma provável violação da lei internacional humanitária e tem de ser investigado pronta e imparcialmente, insta a Amnistia Internacional.

“Esta chocante perda de vidas é mais um novo alerta para as consequências mortais de se ignorarem as regras da lei internacional humanitária. Impõe-se imediatamente uma investigação total, imparcial e independente a esta possível violação das leis da guerra”, defende o vice-diretor do Programa Europa e Ásia Central da Amnistia Internacional, Denis Krivosheev.

Este perito frisa que “morteiros e obuses não podem ser usados em áreas densamente povoadas por civis”. “Todos os lados envolvidos neste conflito estão perfeitamente conscientes do preço que está a ser pago em vidas civis devido ao uso deste armamento explosivo de tão fraca precisão sobre as cidades. E este ataque mostra bem um desprezo insensível pelas vidas dos civis e pelas leis da guerra”.

As autoridades de facto em Donetsk, controlada pelos separatistas pró-russos, afirmam que as forças leais ao Governo ucraniano usaram um sistema móvel improvisado de disparo de obuses para lançar aquele ataque dentro da cidade. Mas Kiev nega ter tido qualquer responsabilidade no incidente. O morteiro atingiu um autocarro de passageiros na Rua Kuprina, no centro do distrito de Leninski, causando danos bem visíveis nos edifícios em redor com a explosão.

Vídeos e fotografias partilhadas nas redes sociais após o ataque mostram o autocarro com as janelas estilhaçadas e os corpos de pelo menos sete pessoas dentro do veículo. São também visíveis nessas imagens um carro carbonizado e os prédios em volta com as janelas destruídas. O condutor de um elétrico que passava no local à altura da explosão ficou também ferido, assim como um outro homem que se encontrava próximo, num outro veículo. No autocarro e no chão em volta veem-se manchas de sangue e as marcas dos estilhaços da explosão.

A cerca de 500 metros de distância do local atingido localiza-se uma antiga base militar soviética, que de acordo com fontes locais estará a ser usada pelas forças separatistas pró-russas, e poderia ser este o alvo pretendido. Responsáveis do Governo ucraniano negaram veementemente, porém, quaisquer responsabilidades, antes acusaram os separatistas de terem perpetrado o ataque.

O morteiro atingiu o autocarro de passageiros às 8h30, poucas horas após as forças leais a Kiev terem admitido que os separatistas tinham obtido controlo do disputado Aeroporto Internacional de Donetsk.

Fontes ouvidas pela Amnistia Internacional naquela cidade relataram que o ataque ocorreu num momento do grande movimento da manhã nas ruas, e ainda que a noite anterior tinha sido bastante mais calma do que os últimos dias.

Tropas e armas posicionadas dentro das áreas residenciais

O incidente desta quinta-feira segue-se a um aumento muito significativo no número de mortes de civis com o intensificar dos combates nas semanas recentes. Aqui se inclui o ataque a um autocarro de passageiros na cidade de Volnovakha, a 13 de janeiro, em que foram mortos 12 civis e outros 16 ficaram feridos.

Ao posicionarem tropas, armamento e outros alvos militares dentro de áreas residenciais, usando estas como locais de onde são lançados ataques e sobre as quais são também feitos disparos de artilharias, de rockets e de morteiros, as forças separatistas pró-russas e as que são leais ao Governo de Kiev estão a pôr em risco civis, numa flagrante violação das leis da guerra.

“Ambos os lados estão a falhar no dever de tomarem as precauções necessárias, consagradas e descritas na lei internacional humanitária, para poupar as vidas de civis. Com o intensificar dos combates e face ao colapso do cessar-fogo assinado em setembro de 2014, o respeito pelas leis da guerra e a responsabilização daqueles que as violam é mais importante do que nunca. Os civis vão continuar a ser mortos e feridos ilegalmente e em números cada vez maiores se a impunidade prosseguir sem qualquer controlo”, sustenta Denis Krivosheev.

A Amnistia Internacional recebeu também relatos preocupantes de que mais de uma dezena de combatentes das forças pró-Kiev, feitos prisioneiros pelos separatistas, foram obrigados a caminhar pelas ruas de Donetsk até ao local do ataque ao autocarro na manhã desta quarta-feira. Vários órgãos de comunicação social internacionais publicaram imagens de vídeo em que pelo menos um desses combatentes capturados é agredido durante a caminhada pela cidade. O tratamento degradante e maus-tratos a prisioneiros de guerra é uma violação da lei internacional humanitária.

Centenas de pessoas morreram já nas hostilidades no Leste da Ucrânia desde que o cessar-fogo foi anunciado em setembro de 2014 – mas o qual, de resto, nunca foi cumprido. Antes, ambos os lados têm intensificado as operações militares de retaliação de uns contra os outros. No total, estima-se que o balanço de mortes desde que o conflito eclodiu no ano passado ascende a cinco mil pessoas.

 

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