3 Dezembro 2025

 

  • RSF mataram deliberadamente civis, fizeram reféns, saquearam e destruíram mesquitas, escolas e clínicas de saúde
  • “A única forma de pôr fim a estas violações é travar o fluxo de armas para as partes em conflito, alargando o embargo de armas que atualmente se aplica ao Darfur ao resto do país” – Agnès Callamard
  • Sem comida, água, serviços de saúde ou reparação legal, os sobreviventes dos ataques sentiram-se abandonados pela comunidade internacional

 

As Forças de Apoio Rápido (RSF) mataram deliberadamente civis, fizeram reféns, saquearam e destruíram mesquitas, escolas e clínicas de saúde durante um ataque em grande escala, em abril, a Zamzam, o maior campo para pessoas deslocadas internamente (PDI) no estado de Darfur do Norte, afirmou a Amnistia Internacional, num novo relatório publicado hoje. Estas violações devem ser investigadas como crimes de guerra ao abrigo do direito internacional.

O relatório, intitulado “Um refúgio destruído: violações das RSF no campo de Zamzam para pessoas deslocadas internamente no Darfur”, documenta como, entre 11 e 13 de abril de 2025, as RSF atacaram o campo, com recurso a armas explosivas e disparando aleatoriamente as suas armas de fogo em áreas residenciais populosas.

O ataque implacável de 13 e 14 de abril – que fez parte da parte da campanha militar das RSF, iniciada em maio de 2024 para capturar El Fasher, a capital do estado de Darfur do Norte – obrigou à fuga de 400 000 pessoas do campo. As RSF assumiram o controlo de El Fasher a 26 de outubro, executando dezenas de homens desarmados e violando dezenas de mulheres e meninas ao capturar a cidade.

O ataque implacável de 13 e 14 de abril – que fez parte da parte da campanha militar das RSF, iniciada em maio de 2024 para capturar El Fasher, a capital do estado de Darfur do Norte – obrigou à fuga de 400 000 pessoas do campo.

“O ataque horrível e deliberado das RSF contra civis desesperados e famintos no campo de Zamzam revelou, mais uma vez, o seu alarmante desrespeito pela vida humana. Civis foram atacados impiedosamente, mortos, despojados de itens essenciais para a sua sobrevivência e subsistência e deixados sem recurso à justiça, enquanto choravam a perda de seus entes queridos. Este não foi um ataque isolado, mas parte de uma campanha sustentada contra aldeias e campos de pessoas deslocadas internamente”, afirmou Agnès Callamard, secretária-geral da Amnistia Internacional.

“Alguns parceiros internacionais, como os Emirados Árabes Unidos, alimentaram ativamente o conflito armado ao apoiar a RSF com armas”, apontou.

“A única forma de pôr fim a estas violações é travar o fluxo de armas para as partes em conflito, alargando o embargo de armas que atualmente se aplica ao Darfur ao resto do país. Os Estados-Membros da União Africana, da União Europeia e da Autoridade Intergovernamental para o Desenvolvimento (IGAD), o Reino Unido, os EUA, a Rússia e a China devem exortar todos os países, mas sobretudo, em primeiro lugar, os Emirados Árabes Unidos (EAU), a absterem-se de transferir armas e munições para as RSF, as Forças Armadas Sudanesas (SAF) e outros intervenientes”, referiu Agnès Callamard.

“Os Estados-Membros da União Africana, da União Europeia e da Autoridade Intergovernamental para o Desenvolvimento (IGAD), o Reino Unido, os EUA, a Rússia e a China devem exortar todos os países, mas sobretudo, em primeiro lugar, os Emirados Árabes Unidos (EAU), a absterem-se de transferir armas e munições para as RSF, as Forças Armadas Sudanesas (SAF) e outros intervenientes.”

Agnès Callamard

Além disso, dado o risco muito elevado de desvio para as RSF, os Estados devem cessar imediatamente todas as transferências de armas para os EAU.

Para este relatório, a Amnistia Internacional realizou uma investigação, entre junho e agosto de 2025, em que entrevistou 29 pessoas, na sua maioria testemunhas oculares, sobreviventes, familiares das vítimas, jornalistas, analistas de conflitos e pessoal médico que prestou assistência aos feridos durante o ataque. A organização também verificou e analisou dezenas de vídeos, fotografias e imagens de satélite.

As RSF não responderam ao pedido de comentário da Amnistia Internacional.

 

“Os bombardeamentos eram por toda a parte”

Os sobreviventes do ataque disseram à Amnistia Internacional que, na sexta-feira, 11 de abril, e no sábado, 12 de abril, os bombardeamentos atingiram casas, ruas e, num caso, uma mesquita durante uma cerimónia de casamento – todas elas áreas densamente povoadas –, matando e ferindo civis e incendiando casas.

Imagens de satélite captadas a 16 de abril e analisadas pela Amnistia Internacional mostraram novas crateras, fornecendo mais provas do uso generalizado de armas explosivas em áreas povoadas.

Os sobreviventes apresentaram relatos angustiantes de como fugiram de bairros em chamas e se esconderam dos combates intensos. Younis*, um voluntário da sala de emergência, relatou: “Foi muito mau. Não era possível identificar de onde vinham os bombardeamentos. Estavam por toda a parte, em qualquer lugar”.

Mamoun*, um homem na casa dos vinte e poucos anos que se ofereceu para distribuir ajuda humanitária, recordou: “Os combatentes [das RSF] estavam apenas a gritar e a disparar para qualquer lado, e foi assim que muitas pessoas foram mortas”.

“Foi muito mau. Não era possível identificar de onde vinham os bombardeamentos. Estavam por toda a parte, em qualquer lugar.”

Younis*

Sadya*, voluntária de organizações não governamentais, descreveu os combatentes das RSF a conduzir pelo seu bairro, não muito longe do mercado principal de Zamzam, a 12 de abril: “Um [combatente das RSF] levantava-se num pequeno telhado e disparava indiscriminadamente contra qualquer pessoa que estivesse na rua”.

Disparar dessa forma, sem um alvo militar específico, pode constituir um ataque indiscriminado, uma grave violação do direito internacional humanitário.

A Amnistia Internacional também documentou combatentes das RSF a disparar deliberadamente e a matar civis. Testemunhas oculares disseram à Amnistia Internacional que viram combatentes das RSF a disparar e a matar 47 civis que estavam escondidos em casas, a fugir da violência, numa clínica e a procurar refúgio numa mesquita. O assassinato deliberado de indivíduos que não participaram ou já não participam diretamente nas hostilidades é uma grave violação do direito internacional humanitário e constitui o crime de guerra de homicídio.

Testemunhas oculares disseram à Amnistia Internacional que viram combatentes das RSF a disparar e a matar 47 civis que estavam escondidos em casas, a fugir da violência, numa clínica e a procurar refúgio numa mesquita

Testemunhos oculares e provas em vídeo demonstram que as RSF tiveram como alvo civis devido à sua percebida afiliação às Forças Conjuntas – uma aliança de antigos grupos rebeldes do Darfur, que lutam ao lado das SAF – e às SAF. Os combatentes das RSF também saquearam e incendiaram casas, empresas, o mercado e estruturas no complexo da escola e mesquita Sheikh Farah, destruindo ou danificando gravemente infraestruturas civis essenciais. As infraestruturas religiosas, médicas e educativas estão protegidas pelo direito internacional.

As pessoas deslocadas entrevistadas pela Amnistia Internacional descreveram viagens árduas em busca de segurança, sem comida, água e serviços médicos. Algumas sofreram atos que podem constituir crimes de guerra de violação, homicídio e pilhagem.

Sem comida, água, serviços de saúde ou reparação legal, os sobreviventes dos ataques sentiram-se abandonados pela comunidade internacional. Disseram à Amnistia Internacional que as suas prioridades são a ajuda humanitária, a segurança e a proteção dos civis. Também exigiram responsabilização criminal e compensação pelos crimes cometidos durante e após o ataque.

Elnor*, que testemunhou a invasão do seu complexo, por cerca de 15 homens armados, provavelmente combatentes das RSF, que atiraram e mataram o seu irmão de 80 anos e o seu sobrinho de 30 anos, disse: “Ninguém se preocupa com a nossa situação”.

 

* São utilizados pseudónimos para proteger a identidade dos entrevistados por razões de segurança e confidencialidade.

 

Perguntas Relacionadas

O que aconteceu no campo de Zamzam, no Sudão, segundo a Amnistia Internacional?

As Forças de Apoio Rápido (RSF) lançaram um ataque ao campo de deslocados de Zamzam, na região de Darfur do Norte, que resultou em dezenas de mortes e feridos entre civis. O incidente está a ser classificado como um possível crime de guerra devido à natureza indiscriminada e desproporcional da violência contra uma população civil desarmada.

Por que é que o ataque ao campo de Zamzam pode ser considerado um crime de guerra?

O ataque é suscetível de constituir um crime de guerra porque visou deliberadamente civis num campo de deslocados, onde não havia alvos militares legítimos. A utilização de força letal contra pessoas desarmadas e a falta de distinção entre combatentes e não combatentes violam o direito internacional humanitário, segundo a análise da Amnistia Internacional.

Que grupo é responsável pelo ataque ao campo de Zamzam?

A responsabilidade pelo ataque é atribuída às Forças de Apoio Rápido (RSF), um grupo paramilitar sudanês. Este grupo tem sido acusado de outras violações graves dos direitos humanos na região de Darfur, incluindo ataques a civis e deslocados.

Quantas vítimas foram registadas no ataque ao campo de Zamzam?

Embora o número exato não esteja detalhado no artigo, refere-se que o ataque causou "dezenas de mortes e feridos" entre os civis que se encontravam no campo de deslocados. A Amnistia Internacional sublinha a gravidade do incidente devido ao elevado número de vítimas.

O que exige a Amnistia Internacional em relação a este ataque?

A Amnistia Internacional exige uma investigação independente e rigorosa sobre o ataque, para que os responsáveis sejam levados à justiça. A organização insiste na necessidade de proteger os civis em Darfur e de pôr termo à impunidade por crimes de guerra e outras violações do direito internacional.

Em que região do Sudão se situa o campo de Zamzam?

O campo de Zamzam localiza-se na região de Darfur do Norte, no Sudão. Esta área tem sido palco de conflitos prolongados e violações dos direitos humanos, especialmente contra populações deslocadas e comunidades civis vulneráveis.

⚠️ Este painel de questões relacionadas foi criado com IA mas revisto por um humano.

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