23 Dezembro 2009

Apenas 41 camiões com materiais de construção tiveram autorização para entrar no território desde Janeiro;

Casas, escolas, hospitais e redes de abastecimento de água não podem ser reconstruídos.

Um grupo de 16 líderes de organizações humanitárias e de defesa dos Direitos Humanos afirmou, no dia 22 de Dezembro, num relatório lançado para assinalar o aniversário do início da ofensiva militar de Israel contra Gaza, que a comunidade internacional traiu a população de Gaza ao não prestar o apoio necessário para que as suas palavras passassem a medidas concretas, assegurando o fim do bloqueio de Israel que impede a reconstrução e recuperação.

 

As organizações como a Amnistia Internacional, a CAFOD, a Christian Aid, a Medical Aid for Palestinians, Mercy Corps e a Oxfam Internacional alertaram para o facto das autoridades israelitas apenas terem permitido que 41 camiões com materiais de construção entrassem em Gaza, desde o fim da ofensiva em meados de Janeiro. Acrescentaram ainda que só a tarefa de reconstruir e reparar milhares de casas iria requerer milhares de camiões com materiais de construção. 

O relatório afirma que só uma pequena parte dos danos causados pela ofensiva a casas, infra-estruturas civis, serviços público, quintas e lojas, foram reparados, porque tanto a população civil como as Nações Unidas e as agências humanitárias que os ajudam, estão proibidos de importar materiais como cimento e vidro. 

Jeremy Hobbs, Director Executivo da Oxfam Internacional, disse: 
“Não foi apenas Israel que falhou à população e Gaza com o bloqueio que pune todos os habitantes pelas acções de alguns. As grandes potências mundiais também falharam e até traíram a população civil de Gaza. Deram apertos de mão e fizeram declarações, mas tomaram poucas medidas significativas na tentativa de alterar a política prejudicial que impede a reconstrução, e uma recuperação pessoal e económica.” 

“O Hamas e outros grupos armados palestinianos devem manter o actual cessar de violência e pôr fim permanentemente ao disparo indiscriminado de rockets contra Israel desde Gaza. Todas as facções palestinianas também necessitam de intensificar o diálogo de reconciliação a fim de preparar o caminho para um Governo Palestiniano reunificado capaz de efectivamente responder às necessidades de suapopulação civil.” 

O efeito da proibição da entrada dos materiais de construção é muito mais abrangente, dizem os autores do relatório. Afirmam que o bloqueio também levou ao corte frequente de electricidade, água e gás, que afecta seriamente a vida quotidiana e a saúde pública. Parte da rede eléctrica de Gaza foi bombardeada durante o conflito e requer reparações urgentes, o que ainda não aconteceu quase um ano após o conflito. Esta situação combinada com as continuas restrições do fornecimento de combustíveis industriais por parte de Israel, significa que 90% da população de Gaza sofre cortes de energia de quatro a oito horas por dia.   

Os cortes de energia também causam interrupções diárias no fornecimento de água, assim como a incapacidade de reparar as redes de abastecimento de água, os tanques de água no topo dos telhados e os conectores domésticos, uma vez que os materiais e as peças de reposição não são considerados bens essenciais humanitários por parte de Israel e por isso são impedidos de entrar devido ao bloqueio. Com a perda de pressão nos canos, a água poluída do solo contamina o fornecimento. Juntamente com a degradação crónica do sistema de esgotos, a má qualidade da água é uma preocupação importante para as agências de ajuda humanitária em Gaza, com casos de diarreia a causar 12% das mortes de jovens. 

O bloqueio, que começou em Junho de 2007 depois do Hamas ter assumido o controlo da Faixa de Gaza, agravou as situações de pobreza, ajudando a que oito em cada dez pessoas sejam dependentes de ajuda humanitária. Comércios e quintas foram obrigados a encerrar e a despedir trabalhadores. Uma proibição quase total das exportações atingiu duramente os agricultores, agravados pela ofensiva que destruiu 17% das terras agrícolas, juntamente com estufas e equipamentos de irrigação, e deixou mais de 30% de terras agrícolas inutilizáveis por se encontrarem em “zonas tampão” anexadas pelo Exército israelita após o fim da ofensiva. 

Kate Allen, Directora da Amnistia Internacional – Reino Unido

“A triste realidade em que vivem 1.5 milhões de pessoas em Gaza deve tocar qualquer pessoa com um pingo de humanidade. Pessoas doentes, traumatizadas e empobrecidas são punidas colectivamente por uma política cruel e ilegal imposta pelas autoridades israelitas. 

“A responsabilidade de Israel em proteger os seus cidadãos não lhe dá o direito de punir cada homem, mulher e criança de Gaza. Todos os estados são obrigados no âmbito do Direito Internacional a intervir para pôr fim a este bloqueio brutal, contudo os seus líderes estão a falhar nesta medida fundamental para a sua própria humanidade. Todos os estados devem insistir para que o Governo de Israel ponha fim a este bloqueio e permita que a população de Gaza reconstrua as suas vidas destroçadas.”   

O relatório defende que, enquanto Israel tem o dever de proteger os seus cidadãos, as medidas que isso implica devem estar de acordo com o Direito Internacional humanitário e os Direitos Humanos. Afirma ainda, que ao reforçar o bloqueio a Gaza, Israel viola a proibição de castigo colectivo prevista no Direito Internacional Humanitário. Contudo também conclui que “ a população de Gaza tem sido traída pela comunidade internacional, que pode e deve fazer mais para acabar com este bloqueio ilegal e desumano.” Apelaram à União Europeia, por exemplo, a tomar medidas imediatas e concertadas para garantir o levantamento do bloqueio de Gaza, para que o encerramento da Presidência de Espanha na União Europeia, em Junho de 2010, não assinale também o terceiro aniversário do bloqueio. 

Os autores do relatório também apelam aos Ministros dos Negócios Estrangeiros europeus e a Catherine Ashton, Alta Representante para os Negócios Estrangeiros da União Europeia, para que visitem Gaza para que vejam por si o impacto do bloqueio na população. Assegurando uma abertura imediata das fronteiras de Gaza a materiais de construção para reparar as casas arruinadas e infra-estruturas civis à medida que o inverno se aproxima, seria um importante passo para o fim do bloqueio, afirmaram as organizações. 

Janet Symes, líder da delegação da Christian Aid na zona do Médio Oriente, afirmou:
“Expressões de desaprovação da comunidade internacional sobre o bloqueio de Gaza já não bastam. É tempo de permitir que a população de Gaza pegue nos pedaços da sua vida e a reconstrua. Não podem haver mais desculpas por parte da comunidade internacional.”  

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