29 Junho 2016

A Arábia Saudita comete grosseiras e sistemáticas violações de direitos humanos no próprio território e em outros países, e tem usado a sua posição como membro do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (CDHONU) para obstruir efetivamente o cumprimento da justiça em possíveis crimes de guerra, avaliam a Amnistia Internacional e a Human  Rights Watch num comunicado conjunto emitido esta quarta-feira, 29 de junho. As duas organizações instam firmemente a Assembleia Geral da ONU a suspender a Arábia Saudita daquele organismo mundial de topo em direitos humanos.

A Amnistia Internacional e a Human Rights Watch exortam a que a Arábia Saudita seja destituída dos seus direitos enquanto país-membro do CDHONU até que ponha termo aos ataques ilegais feitos pela coligação militar que lidera no Iémen e que os mesmos sejam credível e imparcialmente investigados.

“É a credibilidade do próprio CDHONU que está em risco. O terrível registo de direitos humanos da Arábia Saudita no seu próprio território tem vindo a deteriorar desde que o país entrou no Conselho, e a coligação que lidera matou e feriu de forma ilegítima milhares de civis no conflito do Iémen. Permitir à Arábia Saudita permanecer como um membro ativo do Conselho – onde tem vindo a usar a sua posição para se esquivar a ser responsabilizada por possíveis crimes de guerra – cheira a profunda hipocrisia. É algo que descredibiliza o organismo mundial de topo em direitos humanos”, frisa o diretor do Gabinete da Amnistia Internacional das Nações Unidas, Richard Bennet.

O perito avança que “as fortes provas que indiciam a prática de crimes de guerra pela coligação liderada pela Arábia Saudita no Iémen deviam ter sido já investigadas pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU”. “Em vez disso, a Arábia Saudita usou cinicamente a sua posição no organismo para descarrilar uma resolução que lançaria uma investigação internacional, reunindo apoio para a sua própria e fraca proposta de resolução que defende a abertura de um inquérito nacional no Iémen. E nove meses passados, esse inquérito não produziu quaisquer alegações credíveis de investigação a crimes de guerra e outras graves violações”, critica ainda.

“Como membro do Conselho de Direitos Humanos da ONU, a Arábia Saudita está vinculada a cumprir e fazer cumprir os mais elevados padrões de direitos humanos. Mas, na realidade, tem liderado uma coligação militar que levou a cabo ataques aéreos mortais e ilegais contra mercados, hospitais e escolas no Iémen [na foto: escola de Al-Asma, após bombardeamento em novembro de 2015]. Aquela coligação tem também usado repetidamente armas internacionalmente banidas contra áreas civis. E, em território próprio, a Arábia Saudita tem feito centenas de execuções, tem posto crianças nos corredores da morte na sequência de julgamentos grosseiramente injustos e tem reprimido implacavelmente a oposição e ativistas de direitos humanos”, sustenta Richard Bennet.

A dura repressão da Arábia Saudita sobre todas as formas de dissidência no país tem prosseguido sem recuos durante todo o seu mandato no CDHONU, incluindo o recurso a julgamentos profundamente injustos num tribunal especial de antiterrorismo e a penas de prisão prolongadas para dissidentes pacíficos e defensores de direitos humanos.

Foram executadas mais de 350 pessoas desde que a Arábia Saudita foi eleita para o CDHONU e em 2015 foram registadas mais execuções no país do que em qualquer outro ano desde 1995.

“A Arábia Saudita tem de libertar todos os prisioneiros de consciência imediatamente e de forma incondicional, e pôr fim a este vergonhoso uso da pena de morte”, insta o diretor do Gabinete da Amnistia Internacional das Nações Unidas.

Nas últimas semanas, a Arábia Saudita tem-se esquivado a ser responsabilizada, exercendo pressão nas Nações Unidas para que a coligação militar que o país lidera no Iémen seja removida de uma lista de Estados e de grupos armados que violam os direitos das crianças em contextos de conflito. O regime saudita ameaçou sair das Nações Unidas, retirar o apoio financeiro que presta à organização, incluindo nos projetos humanitários, e levar consigo os seus aliados.

Países que são aliados cruciais da Arábia Saudita, incluindo os Estados Unidos e o Reino Unido, têm fracassado em travar as transferências de armamento que é usado no Iémen, apesar de se amontoarem provas de crimes de guerra.

“O que é especialmente chocante é o silêncio ensurdecedor da comunidade internacional que, uma e outra vez, tem cedido à pressão da Arábia Saudita e posto os negócios, as armas e os acordos comerciais acima dos direitos humanos, mesmo face ao facto de o reino cometer graves e sistemáticas violações com total impunidade”, remata Richard Bennett.

A Amnistia Internacional e a Human Rights Watch instam todos os Estados-membros das Nações Unidas a votarem para suspender a Arábia Saudita do CDHONU. As duas organizações exortam ainda a que seja lançado um inquérito internacional independente e imparcial às violações da lei internacional de direitos humanos cometidas no Iémen.

A resolução 60/125 aprovada pela Assembleia Geral da ONU, através da qual foi criado o CDHONU, determina que “a Assembleia Geral pode, por uma maioria de dois terços dos membros presentes e a exercer o voto, suspender os direitos de membro no Conselho de um país que cometa graves e sistemáticas violações de direitos humanos”. A Líbia foi, em 2011, o primeiro e até à data o único país a ser suspenso do CDHONU.

O Conselho está atualmente em fase de reuniões, entre 13 de junho e 1 de julho. A próxima sessão do organismo será entre 13 e 30 de setembro.

 

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