- Após a deflagração de um incêndio em Urumqi, que matou pelo menos dez pessoas, as manifestações contra os isolamentos da COVID-19 estão a irromper por toda a China
- Censura e a vigilância são uma realidade no país e fazem temer o uso desproporcional de força e a prisão em massa
Em resposta às manifestações sem precedentes nos últimos anos, que se dispersam por toda a China, generalizadas pela China, Hana Young, diretora regional adjunta da Amnistia Internacional, destaca como a tragédia do incêndio de Urumqi tem incentivado a coragem dos manifestantes:
“Este desastre em Urumqi trouxe uma coragem inspiradora que se verifica em todo o país. Manifestantes pacíficos têm-se agrupado para segurar pedaços de papel em branco, entoar palavras de ordem e envolver-se em formas de dissidência criativa, apesar da tolerância zero das autoridades que é evidente nos últimos dez anos sob a governança de Xi Jinping e que se tem feito sentir nestes últimos dias. Num país onde é praticamente impossível para alguém juntar-se a atos de manifestação pacífica sem enfrentar assédio e acusações, esta realidade não tem travado a população”.
“Num país onde é praticamente impossível para alguém juntar-se a atos de manifestação pacífica sem enfrentar assédio e acusações, esta realidade não tem travado a população”
Hana Young
Hana Young refere ainda como é importante que o governo chinês ouça o apelo dos seus cidadãos, que deve “permitir que as pessoas exprimam livremente os seus pensamentos e se manifestem pacificamente sem medo de represálias”.
“Infelizmente, a atuação da China é demasiado previsível. A censura e a vigilância permanecerão e é muito provável a polícia recorrer ao uso desproporcional da força e prender manifestantes pacíficos em massa, que arriscarão longas penas de prisão”.
“É muito provável a polícia recorrer ao uso desproporcional da força e prender manifestantes pacíficos em massa, que arriscarão longas penas de prisão”
Hana Young
Com a população chinesa a mostrar-se incrivelmente paciente com as medidas de isolamento, Hana Young relembra que as autoridades não devem abusar das políticas de emergência, até porque estas manifestações revelam que os cidadãos atingiram o fim da sua tolerância para com as restrições excessivas da COVID-19.
“O governo chinês deve rever imediatamente as suas políticas relativas à COVID-19 para garantir que são proporcionais e com um limite temporal. Todas as medidas de quarentena que constituam ameaças à segurança pessoal e restrinjam desnecessariamente a liberdade de circulação devem ser suspensas”, relembra.
“O país necessita ainda de investigar o incêndio de Urumqi de forma rápida, eficaz e exaustiva, para evitar uma reincidência, fazer justiça às vítimas e às suas famílias e mostrar à população é sensível às suas queixas”, remata Hana Young.
Contexto
Na quinta-feira, 24 de novembro, um incêndio deflagrou num prédio residencial em Urumqi, matando pelo menos dez pessoas, de acordo com fontes governamentais. Muitos atribuíram a culpa das mortes à imposição de restrições COVID-19, mas as autoridades locais contestaram esta afirmação. Este acontecimento motivou a realização de manifestações em Urumqi, a capital da região ocidental de Xinjiang. Na manhã seguinte, o governo declarou que o surto de COVID-19 estava sob controlo e que a cidade aliviaria as restrições, após mais de cem dias de limitações ao movimento dos habitantes.
Desde 25 de novembro, vários vídeos partilhados nos meios de comunicação social mostram manifestações em diversas universidades, por múltiplas cidades pela China, como Pequim, Guangdong, Xangai e Wuhan. Os manifestantes pacíficos homenagearam as vítimas do incêndio de Urumqi e apelaram à flexibilização das medidas de isolamento pela COVID-19. Muitas pessoas exigiram ainda o fim da censura e algumas apelaram à demissão do presidente Xi Jinping.
A Amnistia Internacional não é capaz de verificar de forma independente todos os vídeos online que agora circulam de várias cidades. De acordo com fontes oficiais, pelo menos uma mulher foi presa em Urumqi por “espalhar boatos”. Dezenas de mulheres foram detidas na Estrada Urumqi, em Xangai, na noite de 26 de novembro, segundo com fontes online. Até agora, as manifestações mantêm-se.
Neste cenário de repressão e silenciamento, a Amnistia Internacional – Portugal relembra o caso de Chow Hang-tung, advogada de direitos humanos e dos direitos laborais na China, que está presa pelas suas ações pacíficas para para que as pessoas assinalassem a data do massacre de Tiananmen de 1989 nas redes sociais. O seu caso e petição podem ser consultados aqui. Qualquer um pode contribuir com a sua assinatura para a defesa e libertação imediata de Chow Hang-tun. As assinaturas serão enviadas ao secretário da Justiça em Hong Kong.
Chow Hang Tung é um dos casos da Maratona de Cartas deste ano. © Alex Chan Tsz Yuk