- Mais de 323.000 pessoas em todo o mundo assinaram petição da Amnistia Internacional “Liberdade para todos os detidos de Xinjiang”.
- De Portugal seguiram também 831 assinaturas, acompanhadas de um macacão azul, simbolizando os uniformes utilizados pelas pessoas detidas em Xinjiang.
- Carta aberta apela à ONU que investigue violações de direitos humanos contra uigures, cazaques e outras minorias muçulmanas.
- Novos testemunhos revelam o impacto nos familiares dos detidos.
A comunidade internacional deve condenar severamente as graves violações de direitos humanos que decorrem na Região Autónoma uigur de Xinjiang, na China, e preparar o caminho para a justiça e responsabilização, referiu hoje a Amnistia Internacional numa carta aberta aos Estados-membros da ONU.
Este apelo surge depois de 323.832 pessoas, de 184 países e territórios distintos, terem assinado a petição da Amnistia Internacional que pedia às autoridades chinesas que libertassem as centenas de milhares de homens e mulheres, de minorias muçulmanas, detidos arbitrariamente e sujeitos a internamentos em massa, tortura e perseguição em Xinjiang.
A Amnistia Internacional Portugal contribuiu com 831 assinaturas que foram entregues hoje, 11 de outubro, na Embaixada da China em Lisboa. As assinaturas seguiram juntamente com um macacão azul, idêntico aos uniformes utilizados pelas pessoas detidas nos campos de internamento em Xinjiang.
Entrega das assinaturas em Portugal, juntamente com o macacão azul
“Em todo o mundo, centenas de milhares de pessoas assinaram a nossa petição para expressar a sua indignação perante as evidências de crimes contra a humanidade, e outras graves violações de direitos humanos, infligidos aos muçulmanos em Xinjiang”, mencionou Agnès Callamard, secretária-geral da Amnistia Internacional.
“Este é um sinal claro de que existem pessoas em todo o mundo que conseguem ver o que se passa no país, apesar dos esforços da China para silenciar os críticos e atacar em resposta aos relatórios credíveis sobre as suas atrocidades em Xinjiang. Cada assinatura é um apelo direto à China para que termine já com esta perseguição sistemática.”
“O governo chinês deve libertar, de forma imediata, todas as pessoas detidas arbitrariamente nos campos e nas prisões, desmantelar o sistema de campos de internamento, e pôr fim aos ataques sistemáticos contra grupos étnicos predominantemente muçulmanos em Xinjiang”.
“Cada assinatura é um apelo direto à China para que termine já com esta perseguição sistemática”
Agnès Callamard
Petições entregues nas embaixadas chinesas pelo mundo
Nos últimos dias, apoiantes da Amnistia Internacional em dez cidades organizaram eventos públicos para entregar as suas petições que apelavam à libertação dos detidos em Xinjiang.
A 7 de outubro, diversos ativistas reuniram-se na Embaixada chinesa em Londres, para entregarem a sua petição enquanto vestiam os distintivos uniformes azuis que as pessoas detidas nos campos são obrigadas a usar. Eventos semelhantes foram planeados frente a outras embaixadas chinesas pelo mundo fora: em Dacar, Helsínquia, Lima, Lisboa (em Portugal, ocorreu apenas a entrega de assinaturas), Madrid, Paris, Haia, e Washington DC. Na Indonésia, a Amnistia Internacional organizou um seminário onlinee liderou uma ação digital para encorajar ativistas a vestirem-se de uniformes azuis e a partilharem essas fotografias.
A petição global faz parte de uma campanha em curso da Amnistia Internacional, lançada em junho de 2021, para exigir o fim da detenção arbitrária e de outras violações de direitos humanos, sofridas por grupos étnicos, predominantemente muçulmanos, em Xinjiang.
A campanha destaca mais de 60 casos de indivíduos, detidos de forma arbitrária em “centros de transformação e educação” – na realidade, campos de internamento -, ou condenados a penas de prisão durante anos. Estes casos são apenas uma pequena fração das centenas de milhares de homens e mulheres – podem ser mais do que um milhão – que as autoridades chinesas detiveram sob o pretexto de combater o “terrorismo”.
Novos testemunhos de familiares
A Amnistia Internacional entrevistou dezenas de familiares de pessoas detidas arbitrariamente em Xinjiang, e lançou recentemente novos vídeos, com as suas experiências.
A irmã de Memeteli, Hayrigul Niyaz, foi detida no regresso à China, após uma temporada a estudar no estrangeiro, e a família permanece sem informações sobre o seu paradeiro. Memeteli referiu: “Se a voltar a encontrar, tenho de lhe dizer: “Desculpa, minha irmã, não te consegui salvar dos campos'”.
O pai de Adila, Sadir Ali, foi preso em 2018 e condenado a 20 anos de prisão porque, alegadamente, estava a jejuar durante o Ramadão. Adila mencionou: “No fundo do meu coração, nunca serei feliz porque o meu pai está na prisão ou num campo. Porque é que o governo chinês nos está a fazer isto?”. Adila partilhou ainda que esteve impedida de visitar a sua cidade natal durante 11 anos e perdeu o contacto com os seus familiares em Xinjiang.
Abduweli Ayup, um conhecido ativista uigur que atualmente vive na Noruega, contou à Amnistia Internacional o caso dos seus irmãos, Sajidugul Ayup (irmã) e Erkin Ayup (irmão), que estão a cumprir penas de 12 e 14 anos de prisão, respetivamente, por “incitação ao terrorismo”. Abduweli Ayup afirma: “Sinto que sempre que faço alguma coisa, será perigoso para a minha família. Ninguém pode proteger os meus familiares das punições que enfrentam. Sei que talvez as minhas palavras deixem o governo chinês muito zangado, mas pelo menos farei com que ele saiba que não o verei a torturar a minha irmã sem fazer nada. Já não tenho medo de falar”.
Responsabilização pelas violações de Xinjiang
Em junho de 2021, a Amnistia Internacional lançou um relatório que expunha graves abusos de direitos humanos contra uigures, cazaques e outras minorias étnicas, predominantemente muçulmanas, em Xinjiang. Estas pessoas enfrentavam, e continuam a enfrentar, sistemáticas detenções e aprisionamentos em massa, organizadas pelo Estado, assim como torturas e perseguições que equivalem a crimes contra a humanidade.
O governo chinês tem demonstrado uma total resistência em admitir a realidade da situação em Xinjiang, em pôr fim às violações de direitos humanos, e em conduzir investigações imparciais e minuciosas, que pudessem julgar (em julgamentos justos e sem recurso à pena de morte) aqueles que são suspeitos de terem realizado estas ações.
Entretanto, os vários órgãos da ONU e seus Estados-membros têm respondido a estas violações de forma muito lenta. Na última semana, mais uma sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU terminou sem que nenhuma iniciativa para abordar os abusos em Xinjiang tenha sido tomada.
A Amnistia Internacional apela aos Estados-membros da ONU que se unam para condenar severamente as graves violações de direitos humanos em Xinjiang e iniciem um mecanismo de investigação robusto, independente e internacional, capaz de assegurar a responsabilização.
“A comunidade internacional deve parar de fingir que a realidade distópica para os muçulmanos em Xinjiang irá, de alguma forma, remediar-se a si própria”
Agnès Callamard
“Apesar das imensas provas de graves violações de direitos humanos e crimes à luz do direito internacional nos últimos quatro anos, as Nações Unidas e os seus Estados-membros têm falhado perante o seu dever de responsabilizar a China pelas suas ações”, afirma Agnès Callamard.
“A comunidade internacional deve parar de fingir que a realidade distópica para os muçulmanos em Xinjiang irá, de alguma forma, remediar-se a si própria. Já se perdeu demasiado tempo. Agora, mais do que nunca, os Estados-membros da ONU têm o dever de proteger os direitos humanos de todas as pessoas em Xinjiang, lançar uma investigação sobre os crimes suspeitos ao abrigo do direito internacional, e assegurar a responsabilização”, conclui.