14 Março 2019

Um ano após o assassinato da defensora de direitos humanos, Marielle Franco, e do motorista Anderson Gomes, as autoridades brasileiras ainda não conseguiram fornecer às famílias e à sociedade respostas adequadas.

Para a Amnistia Internacional, na voz de Erika Guevara-Rosas, diretora para Américas, esta “incapacidade de identificar os responsáveis e trazê-los à justiça” coloca em risco “todos os defensores de direitos humanos”, que sentem que os “assassinos podem ficar impunes”. Para a responsável a situação é clara: “as autoridades que tomaram posse após as eleições do ano passado devem levar à justiça todos os responsáveis pelo planeamento e execução do crime e mostrar que ataques dessa natureza não serão tolerados no Brasil”.

Recorde-se que Marielle Franco e Anderson Gomes foram mortos a tiro enquanto passavam pelo bairro do Estácio, no Rio de Janeiro, na noite de 14 de março de 2018. Na altura, as informações divulgadas pelas autoridades e veiculadas pela imprensa levantaram preocupações de que os investigadores possam não ter seguido o devido processo legal e possam ter sido influenciados por interferências externas.

 

O que a Amnistia pede

A Amnistia Internacional pede às autoridades brasileiras que respeitem o devido processo e designem uma equipa externa e independente de especialistas para monitorizar a investigação e examinar quaisquer alegações de negligência, irregularidades ou interferência indevida. As autoridades também devem tomar todas as medidas necessárias para garantir a segurança das testemunhas do assassinato e das famílias de Marielle Franco e Anderson Gomes, de acordo com as suas necessidades e desejos específicos.

Jurema Werneck, diretora-executiva da Amnistia Internacional Brasil assume : “um ano após a morte de Marielle Franco, fica evidente que se tratava de um assassinato seletivo cuidadosamente planeado e executado, no qual agentes do Estado provavelmente participaram de alguma forma. As autoridades brasileiras devem garantir o direito à verdade, justiça e reparação para as famílias de Marielle Franco e de Anderson Gomes. Não vamos descansar até que a justiça seja feita.”

A Amnistia encoraja a comunidade internacional, incluindo governos estrangeiros e organizações intergovernamentais, a procurar as autoridades brasileiras e a exigir a identificação de todos os responsáveis pelo planeamento e execução do crime e levá-los à justiça em um julgamento justo que atenda aos padrões internacionais.

  

As alegadas falhas na investigação

Conhecida por defender direitos de jovens negros, mulheres, moradores de favelas e pessoas LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e pessoas intersexo), Marielle – que se definia como uma mulher negra, bissexual e nascida numa favela – foi eleita vereadora da cidade do Rio de Janeiro em 2016. Anteriormente esteve na Comissão de Direitos Humanos do Estado do Rio de Janeiro de 2006 a 2016, onde frequentemente falava sobre execuções extrajudiciais e outras violações de direitos humanos cometidas por polícias e forças de segurança do Estado. Pouco antes de ser morta, Marielle foi nomeada para supervisionar a intervenção federal sobre a segurança pública no Rio de Janeiro.

As autoridades que investigam a morte de Marielle não confirmaram, nem negaram, que estão a ser seguidas as linhas de investigação relatadas pela comunicação social a respeito do possível envolvimento de polícias militares, autoridades locais, grupos de milícias ou um grupo de assassinos profissionais conhecido como “escritório do crime”.

Relatos na imprensa sugerem que a arma do crime foi uma submetralhadora HK-MP5, modelo cujo uso no Brasil é restrito à segurança, aos militares e a certos funcionários da justiça criminal. Várias armas deste modelo que foram registadas no inventário da polícia civil do Rio de Janeiro em 2011 desapareceram, enquanto a munição usada no crime supostamente pertencia a um lote da polícia federal que desapareceu há alguns anos.

Testemunhas disseram que tanto o carro de Marielle, quanto o dos seus assassinos, estavam em movimento quando os tiros foram disparados. A precisão dos tiros que atingiram Marielle várias vezes na cabeça indicam que o atirador tinha treino especializado. Câmaras de vigilância no local exato do crime foram desligadas um ou dois dias antes. Outra filmagem de vigilância mostra câmaras de dois carros seguindo Marielle na noite de seu assassinato. A imprensa local informou que as matrículas eram falsas.

Durante toda a investigação, especialistas forenses fizeram denúncias públicas de negligência, procedimentos impróprios e violações do devido processo legal. Isso inclui alegações de que não houve exame de raio-x aos corpos durante a autópsia, o carro em que foram mortos foi recolhido de forma inadequada e as testemunhas oculares do crime não foram chamadas para depor.

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