8 Julho 2015

 

Uma nova ferramenta digital de investigação e mapeamento dos ataques de Israel contra Gaza durante a guerra de julho e agosto do ano passado está disponível desde esta quarta-feira, 8 de julho, numa parceria da Amnistia Internacional com a Forensic Architecture, da Universidade de Londres. Este projeto visa contribuir para que seja obtida responsabilização pelos crimes de guerra e outras violações da lei internacional humanitária cometidas naquele conflito.

Esta “The Gaza Platform” (Plataforma sobre Gaza) permite aos utilizadores explorar e analisar dados coligidos sobre a operação militar que Israel levou a cabo em Gaza em 2014. Os dados ali expostos, e que continuam a ser atualizados ao longo dos próximos meses, deixam claro desde já uma série de padrões nos ataques feitos pelas forças israelitas, os quais indicam que foram cometidas graves e sistemáticas violações de direitos humanos.

“A ‘Gaza Platform’ é o mais abrangente registo que jamais foi feito sobre os ataques que ocorreram durante o conflito de 2014. Os dados nela contida permitem reconstituir mais de 2.500 ataques, ilustrando a larga escala de destruição provocada pelas operações militares em Gaza durante a guerra dos 50 dias do verão passado”, descreve o diretor da Amnistia Internacional para o Médio Oriente e Norte de África, Philip Luther.

“Ao expor estes padrões, em vez de simplesmente apresentar uma série de ataques individualmente, a ‘Gaza Platform’ tem o potencial de mostrar a natureza sistemática das violações cometidas por Israel durante o conflito. O nosso objetivo é que esta ferramenta se torne num recurso inestimável para os investigadores de direitos humanos, vista a pressionarem para que haja responsabilização no que toca às violações que ocorreram no conflito”, prossegue.

Funcionamento da “Gaza Platform”

Esta nova ferramenta concebida e executada pela Amnistia Internacional e pela Forensic Architecture regista o local e a hora de cada um dos ataques num mapa interativo, e classifica-os de acordo com uma série de critérios – o tipo de ataque, o local atingido e o número de vítimas – para realçar os padrões de conduta das forças militares israelitas.

Fotos, vídeos, testemunhos oculares e imagens de satélite dos ataques estão também disponíveis nesta plataforma. Com recurso a novas tecnologias de visualização de dados e de mapeamento digital, os utilizadores da “Gaza Platform” podem ver e pesquisar toda esta informação para detetarem os padrões nos ataques das forças israelitas durante o conflito. Desta forma podem identificar e também dar a conhecer a outras pessoas esses padrões, cruciais para se fazer a análise se determinados ataques constituem violações da lei internacional humanitária, incluindo crimes de guerra.

Uma equipa de investigadores em Londres e em Gaza trabalha há vários meses para recolher e coligir dados na plataforma, obtidos através do trabalho desenvolvido no terreno pelas organizações de direitos humanos locais Al Mezan e Centro Palestiniano para os Direitos Humanos, a par de informação obtida pela Amnistia Internacional.

O arranque da “Gaza Platform” é apenas o início deste projeto, que continuará a ser atualizado com nova informação conforme é desenvolvido o trabalho de recolha de mais provas sobre o conflito.

Padrões de violações por parte de Israel

Mesmo com a vasta quantidade de informação multimédia que continua a ser processada – incluindo testemunhos, fotografias, vídeos e imagens de satélite – a plataforma demonstra já e de forma clara que foram feitos mais de 270 ataques com recurso a artilharia pesada por parte de Israel no conflito de 2014, tendo provocado a morte de mais de 320 civis. O uso repetido de artilharia, armamento explosivo de significativa imprecisão, em áreas civis densamente povoadas, constitui um ataque indiscriminado que deve ser investigado como crime de guerra.

A “Gaza Platform” ilustra também um padrão chocante em que edifícios de habitação foram tomados como alvo, com mais de 1.200 ataques israelitas registados contra residências, que resultaram na morte de mais de 1.100 civis. Ataques diretos contra civis que não participam diretamente nas hostilidades e contra bens e propriedades civis estão proibidos pela lei internacional humanitária – as “leis da guerra”. A Amnistia Internacional, a Comissão de Inquérito das Nações Unidas ao conflito de 2014 e outras organizações de monitorização alertaram consistentemente para o elevado número deste tipo de ataques que aconteceram durante a guerra do ano passado.

Os utilizadores da plataforma podem identificar mais alguns padrões inspiradores de preocupação, nomeadamente os dos ataques israelitas que tomaram por alvo as equipas de resposta de emergência, como os profissionais de saúde, ambulâncias e edifícios de assistência médica, a par do recurso extensivo a ataques de “bater no telhado” (equivalentes a tiros de aviso), em que um míssil disparado por uma aeronave não tripulada é seguido pouco depois por uma bomba de muito maior potência.

A Amnistia Internacional considera que aqueles disparos de mísseis não constituem de forma nenhuma um aviso eficaz, nem tão pouco absolvem as forças militares de Israel da obrigação clara de não dirigirem ataques contra civis nem propriedade civil.

Ferramenta inovadora para a investigação de direitos humanos

“O lançamento da ‘Gaza Platform’, um ano passado desde o início do conflito de 2014 [a 7 de julho] é um passo muito importante no processo de registo das violações em larga escala que aconteceram em Gaza no ano passado. É também uma chamada a todas as pessoas e organizações para que contribuam com mais fotografias, mais testemunhos e outros meios de prova sobre os ataques a que assistiram e que documentaram de alguma forma durante o conflito”, nota o diretor da Forensic Architecture, Eyal Weizman.

A era digital acelerou a olhos vistos o ritmo e multiplicou os meios de difusão e partilha da informação que é obtida durante crises em que os direitos humanos estão a ser violados, como aconteceu em Gaza no verão de 2014. As provas multimédia desempenham frequentemente um papel crucial na confirmação do ocorrido após os factos acontecerem. E a “Gaza Platform” providencia justamente um novo meio eficaz de processar e cruzar os diferentes tipos de informação obtidos.

“Esta plataforma explora em pleno o poder das novas ferramentas digitais com o propósito de tornar mais claros acontecimentos que são complexos, como os do ano passado em Gaza. Permite aos utilizadores analisarem os incidentes em várias escalas, desde os detalhes mais pequenos sobre um determinado incidente até à visão abrangente de todo o conflito, revelando ainda as ligações entre eventos dispersos”, sublinha por seu lado o coordenador do projeto “Gaza Platform” e investigador na Forensic Architecture, Francisco Sebregondi.

Este perito explica que “o projeto é um primeiro passo para uma mais eficiente monitorização de conflitos, com os esforços conjuntos de várias plataformas que providenciam a partilha de dados entre testemunhas no terreno, organizações e cidadãos pelo mundo inteiro”.

 

A Amnistia Internacional marca este aniversário dos 50 dias de guerra no verão de 2014 também com uma ação no Twitter, que decorre até 26 de agosto, em que são enviados tweets a três destinatários: o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, o responsável pela diplomacia do Reino Unido, Philip Hammond, e o ministro dos Negócios Estrangeiros canadiano, Rob Nicholson – e para todos a mesma mensagem: que exerçam influência diplomática para que Israel e os Territórios Palestinianos Ocupados investiguem as violações de direitos humanos cometidas, incluindo crimes de guerra. Todos os pormenores da ação Twitter #50Days4Gaza: www.facebook.com/events/431358333715567

 

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