9 Março 2012

Com a imolação pelo fogo de tibetanos e a crescente repressão das autoridades chinesas, fora do escrutínio da comunicação social, a Amnistia Internacional teme que um clima de terror se esteja a preparar para o próximo dia 10 de março, Sábado.

Em 6 de janeiro de 2012, dois tibetanos, de cerca de 20 anos, autoimolaram-se pelo fogo em Ngaba, cidade próxima do mosteiro de Kirti, na Prefeitura Autónoma de Sichuan, de acordo com informações da Agência Noticiosa Chinesa, Xinhua.

Em 14 de janeiro de 2012, um jovem leigo tibetano ateou fogo a si próprio, na mesma cidade, Nagba. Sob o olhar horrorizado dos presentes, foi espancado violentamente pela polícia, de quem se esperava que extinguisse as chamas. Isto deu azo a uma manifestação de tibetanos e a disparos da polícia que feriu pelo menos duas pessoas.

Também na Prefeitura de Qinghai e na Região Autónoma do Tibete tiveram lugar várias outras autoimolações pelo fogo, no final de 2011 e no início de 2012. Manifestações, reprimidas com disparos da polícia, provocaram dezenas de feridos e alguns mortos em regiões tibetanas situadas perto de mosteiros.

Pequim tenta manter estas regiões, onde a tensão cresce, fora do escrutínio internacional: a internet e os telemóveis estão bloqueados, os meios de comunicação social e os observadores estrangeiros são impedidos de aceder a estes locais.

Cada vez maior número de tibetanos sacrificam a sua vida porque estão desesperados: são humilhados, postos à margem do sistema económico, assistem à exploração e delapidação dos seus recursos naturais, não podem usar a sua língua e exercer o culto da sua religião.

O Tibete existiu como nação independente durante vários períodos desde o ano 127 AC. Compreendia o que hoje são as Prefeituras Autónomas de Yunnan, Sichuan, Ganzu e Qinghai, bem como o que a China designa como Região Autónoma do Tibete ou simplesmente Tibete.

Os tibetanos têm uma língua própria, com alfabeto e gramática derivados do sânscrito e são maioritariamente budistas (90% da população). O Dalai Lama é reconhecido como o chefe espiritual e protetor de todos os tibetanos.

Em Outubro de 1950 o exército da República Popular da China (RPC) iniciou a ocupação do Tibete. Medidas para modificar o modo de vida dos tibetanos começaram a ser aplicadas e deram origem a várias revoltas. Em 10 de Março de 1959 a revolta no Tibete estava generalizada. O Exército Popular de Libertação da RPC reprimiu-a violentamente, matando milhares de tibetanos.

Em 19 de Março de 1959 o Dalai Lama fugiu para a Índia, juntamente com milhares de tibetanos. Os funcionários do Governo antes chefiado pelo Dalai Lama foram internados em campos de trabalho nos quais a maioria não sobreviveu O poder político passou a ser exercido pelo Primeiro Secretário do Partido Comunista da Região Autónoma do Tibete, que é sempre chinês, de etnia han. Os governantes do Tibete fazem do exercício dos seus cargos trampolins de promoção política, de que é exemplo o atual Presidente da RPC, Hu Jintao, que governou o Tibete com mão de ferro.

Após Março de 1959, os mosteiros foram quase totalmente destruídos. Desde então, os monges e monjas têm sido obrigados a assistir a sessões de “educação patriótica” nas quais lhes é exigido que reneguem o Dalai Lama. Muitos foram expulsos dos mosteiros e detidos por se recusarem a fazê-lo. Esta política tem sido progressivamente intensificada desde as grandes manifestações que precederam os Jogos Olímpicos de 2008. A “educação patriótica”, com o que significa de desrespeito pelo direito ao culto dos tibetanos, budistas, está na origem das inúmeras imolações pelo fogo e das manifestações de protesto de 2011 e de 2012.
    
A identidade tibetana também se encontra ameaçada através da impossibilidade de utilização da língua tibetana, na educação e nos mais comezinhos atos da vida quotidiana. Os tibetanos são cada vez mais obrigados a usar o putonghua ou “linguagem comum”, incorretamente designada por mandarim. As crianças só são ensinadas em tibetano até ao fim da escolaridade básica (3 anos), sendo que se quiserem prosseguir os estudos têm de gradualmente substituir o tibetano pelo putonghua – a partir do 10º ano de escolaridade só este idioma é usado. Também nos serviços oficiais, para encontrar um hospital, uma loja e comprar o indispensável para o dia a dia e até para que uma carta chegue ao seu destino é necessário utilizar o putonghua. O tibetano está-se a tornar num idioma menor.

A política demográfica da RPC no Tibete, visa tornar os tibetanos minoritários na sua própria terra, o que está a ser conseguido através da fixação de chineses na RAT.
O caminho de ferro Gormo-Llasa, inaugurado em 2006, é um instrumento precioso desta política, transportando rapidamente os colonos, o exército e escoando as matérias primas, em que o Tibete é rico, nomeadamente o ferro, o cobre e as madeiras preciosas.

Pese embora as enormes riquezas naturais do seu território, os tibetanos são economicamente marginalizados, o que é mais um motivo de revolta. Os han só empregam han e detêm a maioria das atividades económicas: comércio, obras públicas, etc. Aos tibetanos resta-lhes a pastorícia e a agricultura de altitude. A miséria impera e é vulgar ver crianças em Llasa esperando junto a restaurantes de rua para comer os restos deixados nos pratos.

O atual black-out à comunicação do Tibete com o exterior e as sucessivas imolações, manifestações e repressão são motivo de grande preocupação para a Amnistia Internacional que teme que um cenário de terror, semelhante a outros anteriormente verificados no Tibete, se esteja a preparar para o próximo dia 10 de março.

 

Concentração comemorativa do Dia Nacional da Revolta Tibetana (10 março 1959)

No Sábado, 10 março 2012 (das 18h00 às 20h00), no largo do Chiado, em Lisboa, apoiantes do Tibete participarão numa ação de protesto global que assinala o Aniversário da Revolta Nacional Tibetana e solicitam o fim imediato da violenta repressão Chinesa sobre o Tibete.
 
Para mais informações acerca dos protestos globais: www.March10.org

 

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