5 Agosto 2024

 

  • Existem riscos claros associados à candidatura conjunta de Portugal, Espanha e Marrocos ao Campeonato do Mundo de 2030, nomeadamente o uso excessivo de força pela polícia contra adeptos, a aplicação das normas laborais e o risco de despejos forçados.
  • Candidatura da Arábia Saudita ao Campeonato do Mundo da FIFA de 2034 não cumpre os requisitos em matéria de direitos humanos

 

Uma série de riscos fundamentais em matéria de direitos humanos associados à organização do Campeonato do Mundo de Futebol da FIFA de 2030 em Portugal, Espanha e Marrocos continuam por resolver, afirmou a Amnistia Internacional, numa análise aos “Dossiês de Candidaturas” e às ” Estratégias em matéria de Direitos Humanos” dos torneios, após a publicação desses “Dossiês de Candidaturas” para as duas competições mundiais.

A candidatura conjunta de Portugal, Espanha e Marrocos ao Campeonato do Mundo de 2030 apresenta lacunas importantes e a da Arábia Saudita para 2034 não cumpre os requisitos em matéria de direitos humanos.

Um relatório publicado pela Amnistia Internacional em junho destacou os desafios relacionados com a aplicação das normas laborais, a discriminação, a habitação, o policiamento e a liberdade de expressão e de reunião.

“São necessários planos muito mais específicos para garantir que o torneio cumpra as normas internacionais em matéria de direitos humanos”

Steve Cockburn

“Existem riscos claros associados ao Campeonato do Mundo de 2030 que devem ser abordados por Marrocos, Portugal e Espanha — nomeadamente o uso excessivo de força pela polícia contra adeptos, a aplicação das normas laborais e o risco de despejos forçados. São necessários planos muito mais específicos para garantir que o torneio cumpra as normas internacionais em matéria de direitos humanos, trabalhando em estreita colaboração com grupos de adeptos, jogadores, sindicatos e organizações da sociedade civil”, afirmou Steve Cockburn, Diretor de Direitos Laborais e Desporto da Amnistia Internacional.

“A atribuição do torneio de 2030 a Marrocos, Portugal e Espanha deve também ser utilizada como um catalisador na luta contra a discriminação racista, sexista e homofóbica que tem manchado com demasiada frequência o futebol nos três países. Isto deve incluir a eliminação da legislação discriminatória e o trabalho com os grupos afetados em estratégias para prevenir o assédio e promover a inclusão”.

“A atribuição do torneio deve também ser utilizada como catalisador na luta contra a discriminação racista, sexista e homofóbica que tem manchado o futebol nos três países”

Steve Cockburn

As estratégias em matéria de Direitos Humanos apresentadas para o torneio de 2030 até à data, não fornecem compromissos pormenorizados sobre a forma como muitos destes riscos serão abordados. Por exemplo, embora os adeptos dos três países tenham sido sujeitos ao uso excessivo da força por parte das forças de segurança — incluindo a utilização de balas de borracha contra multidões — não existem planos pormenorizados sobre a forma como essas violações serão evitadas. A Amnistia Internacional – Portugal questionou, sem resposta, quais as organizações de direitos humanos e os representantes dos adeptos envolvidos neste processo. As candidaturas são omissas sobre entidades consultadas e apresentam lacunas importantes.

 

Arábia Saudita falha requisitos em matéria de direitos humanos

A Arábia Saudita não cumpriu os requisitos da FIFA em matéria de direitos humanos na sua candidatura ao Campeonato do Mundo de Futebol Masculino de 2034, afirmou a Amnistia Internacional após a publicação do seu “Dossiê de Candidatura” para o torneio de 48 equipas.

A análise aos “Dossiês de Candidaturas” e das “Estratégias em matéria de Direitos Humanos” dos torneios, publicados esta semana, mostrou que a Arábia Saudita ainda não se comprometeu com uma reforma fundamental do seu sistema de exploração laboral, nem tomou qualquer medida para melhorar a liberdade de expressão, acabar com a repressão dos ativistas dos direitos humanos ou eliminar as leis que discriminam as mulheres e as pessoas LGBTI.

“A FIFA estabeleceu normas claras em matéria de direitos humanos que qualquer país candidato deve cumprir, mas é evidente que a candidatura da Arábia Saudita ao Campeonato do Mundo de 2034 está muito aquém. O plano de direitos humanos da candidatura simplesmente ignora muitos dos enormes riscos associados à realização de um megaevento desportivo num país com um historial tão atroz em matéria de direitos humanos”, afirmou Steve Cockburn.

“É evidente que a candidatura da Arábia Saudita ao Mundial de 2034 está muito aquém. (…) É espantoso que riscos tão evidentes possam ser tão flagrantemente ignorados.”

Steve Cockburn

“O plano de direitos humanos da Arábia Saudita para o Campeonato do Mundo não diz nada sobre o amordaçamento brutal dos ativistas dos direitos humanos ou a criminalização das pessoas LGBTI, nem indica se ou como irá pôr fim, na prática, ao sistema abusivo de Kafala que explora os trabalhadores migrantes. É espantoso que riscos tão evidentes possam ser tão flagrantemente ignorados”.

“Se não forem tomadas medidas urgentes para melhorar a proteção dos direitos humanos na Arábia Saudita, é muito provável que o Campeonato do Mundo de 2034 seja marcado pelo trabalho forçado, pela repressão e pela discriminação – com um custo humano brutal. A FIFA tem agora de trabalhar com as autoridades sauditas para obter acordos juridicamente vinculativos que permitam abordar integralmente os riscos em matéria de direitos humanos antes de ser tomada qualquer decisão final em dezembro, ou estar preparada para abandonar o projeto. As autoridades sauditas devem também demonstrar o seu empenho na defesa dos direitos humanos, libertando os ativistas que foram detidos apenas por terem expressado a sua opinião”.

Uma “análise independente do contexto dos direitos humanos”, elaborada pela firma de advogados AS&H Clifford Chance para informar a proposta, também não mencionou uma vasta gama de questões relacionadas com os direitos humanos, incluindo a proibição de sindicatos, a repressão da liberdade de expressão, práticas amplamente documentadas de despejos forçados ou a criminalização de atos entre pessoas do mesmo sexo. Não foram consultadas quaisquer organizações da sociedade civil ou detentores de direitos na preparação do documento, que apenas recebeu contributos de organismos governamentais.

“Autoridades sauditas devem demonstrar o seu empenho na defesa dos direitos humanos, libertando ativistas que foram detidos apenas por terem expressado a sua opinião”

Steve Cockburn

 

Contexto

Em junho, a Amnistia Internacional publicou um relatório detalhado — Playing a Dangerous Game? — que descreve os principais riscos para os direitos humanos associados aos potenciais anfitriões dos Campeonatos do Mundo de Futebol de 2030 e 2034, comparando-os com os critérios de direitos humanos estabelecidos no Regulamento de Candidaturas da FIFA.

Em 31 de julho, a FIFA publicou os “cadernos de candidatura” apresentados por Marrocos, Portugal e Espanha para o Campeonato do Mundo de 2030 e pela Arábia Saudita para a edição de 2034. Os cadernos de candidatura eram acompanhados de planos de direitos humanos e de “avaliações independentes do contexto dos direitos humanos”, que deveriam destacar os principais riscos.

De acordo com o Regulamento de Candidaturas da FIFA, descrito como “obrigações juridicamente vinculativas”, as candidaturas têm de cumprir uma vasta gama de normas internacionais em matéria de direitos humanos para serem aceites. Estas incluem normas sobre direitos laborais, discriminação, expulsões forçadas, liberdade de expressão, policiamento e outras questões.

A FIFA agora avaliará os Cadernos de Candidaturas antes do Congresso Extraordinário da FIFA, a ser realizado em 11 de dezembro de 2024, quando a decisão deverá ser finalizada.

Artigos Relacionados