26 Abril 2016

As forças de segurança egípcias detiveram centenas de pessoas na segunda-feira, 25 de abril, numa reação implacável para impedir planeados protestos, denuncia a Amnistia Internacional na esteira da mobilização maciça de agentes para as ruas do Cairo e outras cidades do país com o intuito de impedir os cidadãos de se manifestarem.

Membros da Frente para a Defesa dos Manifestantes no Egito (FDEP) reportaram à Amnistia Internacional terem conhecimento da detenção de pelo menos 238 pessoas, incluindo cidadãos de outras nacionalidades, ativistas e jornalistas, os quais foram detidos durante o dia de 25 de abril em várias zonas do país. A FDEP é um grupo de ativistas locais, em que se incluem advogados de direitos humanos, formada com o objetivo de proteger manifestantes pacíficos de serem alvo de violações de direitos humanos.

E o movimento “Liberdade para os Corajosos”, outra organização local, registava 168 nomes de pessoas detidas até à noite de ontem, tendo continuado a identificar mais cidadãos detidos.

“As autoridades egípcias parecem ter orquestrado uma campanha implacável e eficaz para esmagar estas manifestações antes mesmo de começarem. Detenções maciças, bloqueios de estradas e fortes mobilizações das forças de segurança tornaram impossível a realização das manifestações que estavam a ser organizadas”, descreve a vice-diretora interina da Amnistia Internacional para o Médio Oriente e Norte de África, Magdalena Mughrabi.

“Infelizmente, a repressão da liberdade de reunião pacífica e a violação de outros direitos está totalmente em linha com a resposta que o Governo egípcio tem vindo a dar a qualquer tipo de crítica no país”, critica ainda a perita da organização de direitos humanos.

Os protestos foram convocados depois de o Governo egípcio ter cedido a soberania de duas ilhas localizadas no mar Vermelho à Arábia Saudita – uma decisão que várias organizações e grupos da sociedade civil no Egito avaliaram como inconstitucional e marcada por falta de transparência. O dia 25 de abril é feriado no Egito e assinala o aniversário da retirada de Israel da Península do Sinai em 1982.

Mais de 90 pessoas foram detidas nos dias antes da data dos protestos, entre 21 e 24 de abril, de acordo com números coligidos por organizações locais de direitos humanos assim como pelo “Liberdade para os Corajosos”. Muitos dos detidos nesta vaga de repressão foram mantidos nas prisões e visados numa variedade de acusações, incluindo ofensas previstas na lei antiterrorismo, na legislação sobre manifestações e outras leis que regulam as reuniões públicas, assim como em acusações fundadas em matéria de “segurança nacional” previstas no Código Penal.

Entre os detidos ao longo da última semana estão vários líderes ativistas ligados a grupos de defesa de direitos humanos no Egito ou a movimentos da sociedade civil – como o presidente da Comissão Egípcia para os Direitos e Liberdades, Ahmed Abdullah, o qual foi detido em casa, na manhã de 25 de abril, por agentes que seus representantes descreveram como sendo das “forças especiais”. Ahmed Abdullah foi acusado de vários crimes, em que se incluem incitamento à violência com o objetivo de derrubar o Governo, adesão a grupo “terrorista” e promoção do “terrorismo”.

O advogado de Direito do Trabalho e porta-voz do Movimento Revolucionário Socialista, Haytham Mohammedein, foi detido na manhã de 22 de abril por agentes da Segurança Nacional, os quais se recusaram a apresentar-lhe o mandado de captura. Um dos seus advogados reportou à Amnistia Internacional que Haytham Mohammedein foi vendado durante os interrogatórios e levado ao procurador-público após mais de 24 horas passadas desde o momento da detenção, o que viola os termos da Constituição do Egito.

O procurador encarregue do caso emitiu ordem de detenção de Haytham Mohammedein por 15 dias sob acusações de “fazer parte da banida Irmandade Muçulmana” e por “convocar protestos contra a redefinição das fronteiras marítimas do país”, foi ainda avançado pelo advogado do porta-voz do Movimento Revolucionário Socialista. Mohammedein encontra-se detido num campo tutelado pelas Forças Centrais de Segurança conhecido como Kilo 10.5, localizado na zona desértica atravessada pela estrada que liga o Cairo a Alexandria.

Outras pessoas apanhadas nesta vaga de detenções incluem a reputada ativista Sanaa Seif, que testemunhou ter sido chamada pelo procurador para ser interrogada, e o advogado Malek Adly, contra quem foi emitido um mandado de captura.

A Amnistia Internacional recebeu múltiplas descrições da presença de um pesado aparato de segurança na zona central da capital egípcia, incluindo bloqueios de estradas e polícia armada a circular nas ruas desde as primeiras horas da manhã de 25 de abril, indicando que o Governo egípcio pretendia impedir as manifestações. O Presidente do Egito, Abdel Fattah el-Sisi, referiu-se aos planeados protestos como uma tentativa para desestabilizar o Estado; o ministro do Interior ameaçou com graves consequências quem quer que ultrapassasse a “linha vermelha”.

“As autoridades sustentam que estão a repor a estabilidade e a segurança, mas a paranoia com que estão a agir criou um verdadeiro ‘ponto cego’ que parece tê-las tornado incapazes de distinguir entre manifestações pacíficas e reais ameaças à segurança”, sublinha Magdalena Mughrabi.

A Amnistia Internacional insta as autoridades egípcias a respeitarem os direitos de reunião pacífica e de liberdade de expressão. Qualquer pessoa que esteja detida por protestar de forma pacífica tem de ser liberta.

No Egito, a legislação que regula as manifestações proíbe as pessoas de se manifestarem sem o consentimento das autoridades e dá às forças de segurança vastos poderes para dispersarem protestos “não autorizados”. Na prática, as autoridades têm permitido manifestações de apoio ao Presidente enquanto repetidamente dispersam aquelas que são organizadas por opositores.

A Amnistia Internacional tem avaliado muito criticamente a draconiana lei antiterrorismo egípcia. A definição vaga e excessivamente ampla de “ato terrorista” feita na lei permite às autoridades suprimirem qualquer forma de dissidência pacífica.

Os protestos planeados para a passada segunda-feira seguem-se a grandes manifestações que ocorreram no país há 11 dias, logo após o anúncio da passagem da tutela das ilhas à Arábia Saudita, e tiveram uma escala que já não era vista no Egito há mais de dois anos.

 

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