13 Outubro 2011

Num novo relatório a Amnistia Internacional, apela às novas autoridades na Líbia para que acabem com as detenções arbitrárias e abusos generalizados de presos.
No documento “Detention Abuses Staining the New Libya”, a organização revela um padrão de agressões e maus-tratos encetados contra soldados de Kadhafi capturados, indivíduos suspeitos de serem leais ao Coronel e alegados mercenários na Líbia ocidental. Em alguns casos, existem provas claras de que foi usada tortura com o objectivo de obter confissões ou como castigo.

“Existe um perigo real que sem acção firme e imediata, alguns padrões do passado possam repetir-se. Detenções arbitrárias e tortura constituíram uma marca do regime do Coronel Kadhafi”, afirmou Hassiba Hadj Sahraoui, Vice-Directora da Amnistia Internacional para o Médio Oriente e Norte de África.  

“Compreendemos que as autoridades de transição enfrentam muitos desafios, mas se não fizerem agora uma ruptura clara com o passado, irão passar uma imagem de que ameaçar os detidos desta forma, será tolerado na nova Líbia”.

Desde o final de Agosto, as milícias armadas prenderam e detiveram 2.500 pessoas em Tripoli e na cidade de al-Zawiya.

A organização afirmou que os presos foram quase sempre detidos sem ordem judicial e na maioria dos casos sem o envolvimento do Procurador Geral. Foram detidos por conselhos locais, pelo conselho militar local ou brigadas armadas – longe da supervisão do Ministério da Justiça.

A Amnistia Internacional entrevistou aproximadamente 300 prisioneiros nos meses de Agosto e Setembro. Nenhum deles viu qualquer tipo de mandado de prisão e grande parte deles foram raptados das suas casas por indivíduos não identificados que realizavam rusgas a pessoas suspeitas de serem combatentes ou leais a Kadhafi.

Pelos menos dois guardas – em diferentes centros de detenção – admitiram à Amnistia Internacional que agrediram presos de forma a extrair “confissões” mais rapidamente.
A organização descobriu uma vara de madeira e corda, bem como uma mangueira de borracha, do tipo que pode ser usada para agredir presos, inclusive nas solas dos seus pés – um método de tortura conhecido por falaqa – num piso do centro de detenção.

Num centro de detenção, os presos ouviam chicotadas e gritos oriundos de uma cela próxima.

A organização afirmou que os detidos são passíveis de sofrer agressões e tortura, particularmente no inicio da sua detenção, recebendo as “boas vindas” à chegada.

Africanos subsaarianos suspeitos de serem mercenários constituem entre um terço e metade dos detidos. Alguns foram libertados sem ter sido encontrada qualquer prova que os ligasse ao combate.

Um indivíduo de Níger, inicialmente apresentado à Amnistia Internacional como um “mercenário e assassino”, negou o que inicialmente tinha dito e explicou que fez a sua “confissão” depois de ser agredido quase continuamente durante dois dias. Negou estar envolvido no combate.

Líbios negros – em particular da região de Tawargha, a qual foi base das forças de Kadhafi nos seus esforços para recuperarem o controlo de Misurata – são também particularmente vulneráveis. Dezenas de Tawarghans foram levados das suas casas, pontos de controlo e até mesmo hospitais.

A organização descobriu também que as crianças estão detidas juntamente com adultos e as mulheres detidas têm sido supervisionadas por guardas do sexo masculino.
Um jovem de 17 anos de Chad, acusado de violação e de ser um mercenário, disse à Amnistia Internacional que foi levado de sua casa em Agosto por homens armados que o mantiveram detido numa escola onde o esmurraram e agrediram com varas, cintos, espingardas e cabos de borracha:

“As agressões eram tão severas que acabei por dizer-lhes o que eles queriam ouvir. Disse-lhes que violei mulheres e matei líbios”.

A Amnistia Internacional apelou ao Conselho Nacional de Transição (CNT) para que assegure que as pessoas não sejam detidas sem ordens do Procurador Geral e para colocar os centros de detenção sob o controlo do Ministro da Justiça.

A organização afirmou que as pessoas detidas devem ter autorização para questionarem a legalidade da sua detenção ou devem ser libertadas.
Desde que o CNT tomou controlo da Líbia ocidental, os procedimentos para a realização de julgamentos foram suspensos. Na Líbia oriental, que ficou sob o seu controlo em Fevereiro, continuam suspensos.

Em reuniões com a Amnistia Internacional, em Setembro, os funcionários do CNT reconheceram estar preocupados com as detenções arbitrárias e com os maus-tratos e prometeram fazer mais para obter controlo sob as milícias armadas e assegurar que todos os detidos desfrutam de igual protecção da lei.

“O CNT tem de agir urgentemente para traduzir os seus compromissos públicos em acção, antes que estes abusos se enraízem e manchem o registo dos direitos humanos da nova Líbia”, acrescentou Hassiba Hadj Sahraoui.

“Estes presos foram detidos na sua grande maioria sem um mandado, agredidos – e por vezes pior – na detenção e chegada ao centro de detenção. Estão vulneráveis a abusos por parte de milícias armadas que frequentemente actuam por livre iniciativa”.

“As autoridades não podem simplesmente permitir que esta situação continue por se encontrarem numa fase de ‘transição’. Estes indivíduos devem ter a oportunidade de se defenderem adequadamente ou devem ser libertados”.

 

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