25 Setembro 2019

por Pedro A. Neto, diretor-executivo da Amnistia Internacional Portugal

As alterações climáticas e a proteção do ambiente, são uma questão de sobrevivência.

É hoje evidente a ligação estreita entre o ambiente e clima e os direitos humanos. A vida humana só é possível num ambiente sadio e ecologicamente equilibrado. Compromete todos os direitos humanos – não apenas os direitos económicos, sociais e culturais, mas também os civis e políticos, pois os direitos humanos são indivisíveis e interdependentes e a segurança de toda a humanidade é a primeira vítima da nossa falência neste domínio.

Os direitos humanos – e neles os recursos naturais que o planeta nos dá para nossa sobrevivência – são de todas as pessoas, para ususfruto à nossa vida. Ao mesmo tempo, são também nossa responsabilidade coletiva e obrigação positiva de cuidar, proteger e garantir sustentabilidade, não apenas para todas as pessoas no mundo de hoje, mas também no do futuro.

Esta sustentabilidade do ambiente é o nosso maior desafio e a nossa sobrevivência disso depende.

Milhões de jovens por todo o mundo tem dito isto mesmo, não só aos líderes políticos, mas a todas as pessoas. Na sua responsabilidade quotidiana, lembram-nos a urgência do agora: estes problemas já não são do futuro, mas do presente.

Os jovens estão a dizê-lo com toda a clareza: É tempo de irmos a soluções.

“Estes problemas já não são do futuro, mas do presente.”

Pedro A. Neto

Há três níveis de responsabilidade para resolvermos o problema das alterações climáticas:

  1. Os Estados. Que cumpram os compromissos internacionais e vão além do Acordo de Paris. Que se baseiem na ciência para a concepção de novos objetivos e desenho de políticas públicas concretas que façam com que o caminho para esses objetivos seja percorrido; Que concebam medidas de pressão arrojadas (cláusulas de cumprimento dos objetivos de Paris, por exemplo, que adicionem condições aos acordos de comércio), porque as grandes multinacionais e os milhões de postos de trabalho que elas garantem, bem como os países que beneficiam economicamente das indústrias poluidoras não podem fica de fora desta equação.
    Que os Estados concebam um modelo de economia assente na sobrevivência dos países. E, nisto, é necessária solidariedade internacional. Tem de haver ajuda aos países cuja sobrevivência económica depende de indústrias poluidoras. A par desta cooperação, cada Estado tem de trabalhar, ainda, ao nível nacional. Percebemos a questão da transição económica e energética e dos seus planos para algures entre 2030 e 2050, mas a morte do planeta não dará tempo para essa transição. A mudança tem de acontecer agora.
    E tem de acontecer de forma ativa com políticas públicas que incentivem a sustentabilidade e que permitam ao mercado de consumo escolher as soluções e produtos sustentáveis. Têm de haver  medidas concretas e de planos de ação que rejeitem o desperdício. Precisamos de investimento financeiro forte para a investigação e concepção de soluções energéticas limpas e sustentáveis, que criem condições e incentivos para que as empresas e os cidadãos possam viver uma vida mais ecológica, quer com benefícios, quer com penalizações fiscais que orientem sociedade e mercados para um novo paradigma de produção e consumo, não baseado na extração e transformação super-intensiva, mas na sustentabilidade e durabilidade dos materiais, assente numa economia circular.
    O setor dos transportes e de produtos alimentares são os mais urgentes de se transformar dada a poluição que causam. Os governos têm ainda de criar planos de ação concretos e eficazes em educação para os direitos humanos e educação para o ambiente para que todas as pessoas assumam esta causa como sua e o planeta como nosso.
  2. As empresas. Que entendam que não há tempo a perder e que são parte importantíssima da solução. Necessitamos de verdadeiros planos de Responsabilidade Social que não sirvam apenas para cumprir calendário ou ter ganhos reputacionais, mas que se foquem no clima e na sustentação das suas próprias atividades económicas e produtivas. É simples: se não encontrarem forma de produzir riqueza de forma sustentável, os mercados irão, mais cedo que tarde, deixar de procurar os vossos produtos. É, também, aqui, uma questão de sobrevivência. Isto mesmo temos visto com a ascenção de nichos significativos de mercado para produtos ecológicos, ainda que algumas vezes os produtos o sejam apenas pelo marketing. Os carros elétricos são uma solução melhor que os carros a combustíveis fósseis, mas são ainda uma solução que precisa de aperfeiçoamento enquanto a eletricidade que os move for obtida a partir de geradores a diesel e enquanto o lítio das baterias que os compôem for um problema de reciclagem no futuro como é já um problema na sua extração e mão de obra infantil no presente.
  3. Nós, cada pessoa, cada consumidor. Que façamos tudo ao nosso alcance. A água, um bem já escasso no nosso país cada vez mais desertificado é um bem a ser poupado, por todas as pessoas. Reciclar faz a diferença e pode ser lucrativo numa economia circular que elimina o descartável. Consumir menos também. O lixo tem de ser tratado, mas antes disso, tem de ser reduzido, reutilizado e reciclado e para isso acontecer, não falamos só de civismo, mas de cadeias de fornecimento de produtos que evitem esse lixo, tantas vezes proveniente de embalamentos descartáveis, de plástico e outros materiais extraídos ao planeta e de uma só utilização. Também os produtos que consumimos todos os dias. Produtos de higiene e cosméticos tem de deixar de ter na sua composição produtos provenientes de combustíveis fósseis, tão poluentes como prejudiciais à nossa saúde. Cabe às empresas este papel, mas a nós consumidores as escolhas corretas.

A Cimeira do Clima desta semana não passou de mais um elenco de discursos de chefes de Estado ou de governo. Já os que estão de fora do Acordo de Paris nem os ouvimos. Portugal, que tem um discurso simpático, não teve até agora influência ou exemplo suficiente para liderar, pela falta de ações concretas, mensuráveis, e políticas públicas de emergência a uma tragédia em marcha.

” Se há luta que é de todos e por todos é a do clima. O planeta não nos dará outra oportunidade.”

Pedro A. Neto

Portugal – e outros países membros das Nações Unidas – esteve representado ao mais alto nível numa iniciativa do Secretário Geral da ONU, um português, que destacou a luta para salvar o planeta como prioridade da sua agenda e a da organização que lidera.

Não foi a primeira, e não será certamente a última, mas é muito importante que, face a movimentos internacionais fortíssimos que exigem a mudança do estado das coisas, os governantes, aqueles que nós todos elegemos para nos representarem não nos desiludam e que não continuem a perder oportunidades para forçar a mudança. Se há luta que é de todos e por todos é a do clima. O planeta não nos dará outra oportunidade.

 

Uma versão editada deste texto foi publicada no jornal Público, no dia 24 de setembro

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