4 Julho 2011

 

Dois anos depois continua a repressão de direitos fundamentais
 
Dois anos após a violenta repressão dos protestos protagonizados por Uigures, na cidade de Urumqi, na China, que começaram de forma pacífica mas tornaram-se violentos, as autoridades chinesas continuam a perseguir indivíduos de etnia Uigur por exercerem pacificamente o direito à liberdade de expressão e por procurarem transmitir informação sobre a maneira como os Uigures são tratados na China.
 
No dia 5 de Julho de 2009, em Urumqi, capital de Xinjiang, Região Autónoma Uigur, membros da minoria Uigur uniram-se para protestar contra a inacção do governo perante o assassinato de migrantes da mesma etnia,  trabalhadores numa fábrica em Shaoguan, província de Guangdong, no dia 26 de Junho. Os protestos começaram pacíficos, mas após a polícia ter usado violência contra os manifestantes tiveram início tumultos. De acordo com dados oficiais, 197 pessoas morreram devido à violência, a maior parte eram Chineses Han. As autoridades chinesas culparam imediatamente instigadores estrangeiros por planear, dirigir e incentivar os protestos, sem, contudo, apresentarem provas. 
 
Testemunhos recolhidos pela Amnistia Internacional levantam algumas dúvidas em relação à versão oficial dos incidentes e apontam para o uso excessivo e desnecessário de força por parte da polícia contra os manifestantes Uigures, incluindo agressões, uso de gás lacrimogéneo e disparos direccionados para a multidão. Detenções em massa seguiram-se aos protestos, com inúmeros relatos de desaparecimentos forçados, tortura e outros maus tratos. Até à data as autoridades chinesas não permitiram que fosse realizada uma investigação independente aos incidentes.
 
Centenas de indivíduos foram detidos e acusados de estarem associados aos protestos de Julho de 2009. Pelo menos nove pessoas foram sentenciadas à morte em julgamentos sumários. Outras foram acusadas e sentenciadas a longas penas de prisão por exercerem o seu direito à liberdade de expressão, enquanto gestores de websites em dialecto Uigur, onde eram anunciados os protestos ou divulgada informação sobre a repressão a fontes estrangeiras. 
 
Memetjan Abdulla, jornalista e editor há oito anos no Serviço Uigur da Rádio Nacional da China, foi condenado à prisão perpétua após um julgamento à porta fechada, em Abril de 2010. Foi acusado de incitar aos protestos, ao traduzir para Uigur e ao publicar no site Salkin um apelo feito por um grupo de Uigures, que pedia que fossem organizadas manifestações contra as agressões que teriam sido a causa da morte de migrantes Uigures a trabalhar na província de Guangdong. 
 
Hairat Niyaz, um jornalista Uigur e editor de um website, continua a cumprir uma pena de prisão de 15 anos, acusado de “colocar em risco a segurança nacional” por escrever textos e dar entrevistas a jornalistas de Hong Kong, após os protestos de Julho de 2009.
 
Dilshat Paerhat, ex-editor de um popular website no dialecto Uigur, continua detido, condenado a cinco anos de prisão por “colocar em risco a segurança do Estado”. Foram alegadamente publicadas mensagens no seu website sobre os protestos de 5 de Julho de 2009, mas segundo fontes, enquanto gestor do site, Dilshat removeu-as.
 
As notícias da condenação de outro editor de um website em dialecto Uigur, ligado aos protestos de 5 de Julho, só chegaram ao conhecimento da comunidade internacional em Março de 2011.  Tursanjan Hezim, antigo professor de história que geria o popular site Orkhun, foi alegadamente detido dias após os protestos de 5 de Julho, apesar da sua família não ter sido informada sobre o seu paradeiro ou das acusações que enfrentava. A família apenas soube, em Julho de 2010, que Hezim tinha sido sentenciado a sete anos de prisão, após um julgamento secreto. 
 
 As autoridades continuam a perseguir e a processar indivíduos que divulguem informações sensíveis sobre a forma como os Uigures foram tratados durante os protestos de 5 de Julho ou sobre a repressão que se seguiu.
 
Ershidin Israil, um Uighur de Gulja, em Xinjiang, foi recentemente obrigado a regressar do Cazaquistão para a China, porque o Governo chinês afirmou que Israil era “suspeito de terrorismo”. Esta afirmação parece estar ligada a uma entrevista que ele deu à Rádio “Free Asia”, a 23 de Setembro de 2009, na qual detalhava a tortura que teria levado à morte de Shohret Tursun,  um jovem Uigur que tinham sido detido em Urumqi, no dia 6 de Julho de 2009. A 19 de Setembro de 2009, as autoridades devolveram o corpo de Shohret gravemente ferido à sua família, alegando que ele tinha sofrido um ataque cardíaco fatal durante a detenção. As autoridades insistiram que Shohret Tursun devia ser enterrado imediatamente e indeferiram o pedido da família para que fosse realizada uma autópsia.
 
Antes da entrevista, Ershidin Israil podia viver e trabalhar livremente na sua cidade natal. Desde o incidente, dezenas de pessoas foram alegadamente detidas e vítimas de maus tratos por divulgarem o caso de Shohret Tursun à Radio “Free Asia”. No dia 23 de Setembro de 2009, Abdusalam Nasir, um amigo da família de Shohret Tursun, envolvido no incidente, foi detido e permaneceu 10 meses sob custódia. Ershidin Israil escondeu-se por estar a ser perseguido pela polícia. Nos dias que se seguiram, quase 20 pessoas foram detidas por estarem ligadas ao caso, incluindo dois dos irmãos de Ershidin Israil. Um irmão de Enver Israil passou 10 meses na prisão,enquanto o outro passou cinco meses detido.
 
Ershidin Israil fugiu da China para o Cazaquistão dias após a entrevista. Foi-lhe concedido o estatuto de refugiado pelo Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR), em Março de 2010, e estava pronto para ser transferido para a Suécia a 1 de Abril de 2010. No entanto, devido à pressão exercida pela China, as autoridades do Cazaquistão colocaram Ershidin Israil sob custódia, no dia 3 de Abril de 2010. Entre 23 de Junho de 2010 e 18 de Maio de 2011 os tribunais do Cazaquistão analisaram e rejeitaram, num total de cinco vezes, o seu pedido de asilo no Cazaquistão. O ACNUR revogou o seu estatuto de refugiado a 3 de Maio de 2011, sem dar uma explicação para essa decisão. Sem possibilidade de asilo, no dia 30 de Maio de 2011 o governo do Cazaquistão entregou Ershidin Israil às autoridades chinesas. A 14 de Junho as autoridades chinesas confirmaram que Ershidin Israil estava sob a sua custódia, sendo tratado como “suspeito de terrorismo”.   
 
Ao tratar como “terroristas” as pessoas que expressam suas opiniões de forma pacífica ou divulgam informações confidenciais, o Governo chinês perpetua um clima de medo, que ajuda a garantir uma quase total ausência de divulgação de informações sobre as violações dos direitos humanos sofridas pelos Uigures na China.
 
A Amnistia Internacional apela às autoridades chinesas para que libertem imediatamente todos os indivíduos detidos unicamente por exercerem o seu direito à liberdade de expressão ou de associação, incluindo Memetjan Abdulla, Niyaz Hairat,Paerhat Dilshat e Ershidin Israil e que respeitem os direitos dos Uigures.

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