21 Abril 2015

A sentença de 20 anos de prisão que foi dada ao ex-Presidente egípcio Mohamed Morsi, deposto em 2013, constitui uma troça da justiça e demonstra – uma vez mais – que o sistema de justiça penal egípcio parece incapaz de levar a cabo julgamentos justos nos processos em que são visados membros ou apoiantes da anterior governação e da Irmandade Muçulmana, considera a Amnistia Internacional.

A organização de direitos humanos insta a que Mohamed Morsi (na foto, em audiência em fevereiro de 2015) tenha um novo julgamento que respeite os princípios de julgamento justo num tribunal civil, em cumprimento dos padrões internacionais, ou seja libertado.

“Esta sentença destrói por completo qualquer ilusão que ainda perdurasse de independência e imparcialidade no sistema de justiça penal do Egito”, avalia a vice-diretora da Amnistia Internacional para a região do Médio Oriente e Norte de África, Hassiba Hadj Sahraoui. “Qualquer semelhança com um julgamento justo foi prejudicada por uma série de irregularidades no processo penal assim como pela detenção arbitrária de Morsi e a sua manutenção em regime de incomunicabilidade. Esta condenação tem de ser anulada e as autoridades egípcias devem fazer um novo julgamento num tribunal civil ou libertá-lo”, avança a perita da organização de direitos humanos.

Mohamed Morsi foi condenado nas acusações de “incitamento à violência” e de detenção e tortura de manifestantes da oposição durante os confrontos que ocorreram entre seus apoiantes e a fação oposta em frente ao Palácio presidencial, em dezembro de 2012.

Morsi e 14 outros arguidos, muitos deles membros ou líderes da Irmandade Muçulmana ou do braço político da organização – o Partido Liberdade e Justiça –, foram visados com uma série de acusações que incluem “homicídio”, “incitamento a homicídio”, “violência”, assim como “banditismo”, “disseminação de rumores para desestabilizar o trabalho das instituições judiciais” e ainda “ameaças contra civis”.

Mohamed Morsi enfrenta uma série de outras acusações em outros quatro processos além daquele que chegou esta terça-feira, 21 de abril, à pronúncia de sentença.

“Condenar Mohamed Morsi, apesar das falhas fundamentais que existiram no processo judicial e daquilo que aparenta serem, na melhor das hipóteses, provas inconsistentes submetidas em tribunal sob uma efetiva lei da mordaça, mina por completo este veredicto”, avalia Hassiba Hadj Sahraoui.

Antes mesmo de ser presente a julgamento, as perspetivas de Mohamed Morsi ter um julgamento justo já estavam profundamente comprometidas. Ao longo de meses, após a sua deposição da chefia de Estado a 3 de julho de 2013, Morsi e os seus apoiantes estiveram detidos em regime de incomunicabilidade sob condições que constituem desaparecimentos forçados.

Durante este período, foi interrogado pelos procuradores sem a presença de um advogado, o que viola os seus direitos consagrados na Constituição e nas leis internas egípcias de poder contestar a legalidade da sua detenção e desenvolver uma defesa adequada. A equipa de defesa do ex-Presidente egípcio só teve acesso a uma cópia do processo, com 7.000 páginas, após fazer um pagamento substancial e apenas a poucos dias do início do julgamento, que começou a 4 de novembro de 2013.

A Amnistia Internacional documentou também a ocorrência de várias irregularidades durante o julgamento.

Na primeira audiência, a 4 de novembro de 2013, as autoridades impediram vários membros da equipa de defesa de Mohamed Morsi de estarem presentes em tribunal. O principal advogado de defesa só foi autorizado a reunir-se com Morsi depois já do início do julgamento.

As investigações levadas a cabo pelos procuradores aos confrontos de dezembro de 2012 entre apoiantes de Morsi e opositores, no exterior do palácio presidencial, não foram independentes nem imparciais. O caso dos procuradores assentou totalmente nos abusos cometidos pelos apoiantes do ex-Presidente, ignorando por completo a violência provocada pelos opositores.

O trabalho de investigação da Amnistia Internacional àquela vaga de violência indica que apesar de os apoiantes da Irmandade Muçulmana terem cometido abusos de direitos humanos, a maior parte daqueles que foram mortos nos confrontos eram na realidade apoiantes do então chefe de Estado egípcio.

 

Artigos Relacionados