23 Dezembro 2009

O Presidente Lula anunciou o terceiro plano nacional de Direitos Humanos do país e destaca-o como sinal de esperança para um futuro melhor e um desafio a todos os níveis para o Governo brasileiro, que finalmente deverá assegurar os Direitos Humanos em zonas do país que necessitam desesperadamente deste apoio.
O mais importante no novo plano foi a inclusão do direito à memória e à verdade, com a promessa da formação de uma comissão para investigar e divulgar os crimes de Direitos Humanos cometidas pelo regime militar no país.

 A Amnistia Internacional espera que esta comissão coloque finalmente o Brasil em linha com outros países da região, que há muito tempo realizam esforços no sentido de punir os responsáveis por crimes como o de desaparecimentos, tortura e execuções extrajudiciais, assegurando às famílias das vítimas o direito a indemnizações.

 O legado das violações dos Direitos Humanos cometidas no passado e que ficaram impunes perdura nos relatórios diários de assassinatos por parte da polícia e casos de tortura que caracterizam o sistema de justiça criminal no Brasil até hoje.

 Porém, a Amnistia Internacional está preocupada com o facto das presentes propostas feitas pelas autoridades brasileiras para a criação de esta comissão, não satisfazerem plenamente todos os três pré-requisitos essenciais:

 • Verdade: estabelecer os factos sobre as violações dos direitos humanos que ocorreram no passado;
 • Justiça: investigação de violações do passado e, se forem reunidos elementos de prova suficientes, os suspeitos devem ser processados por meio de mecanismos judiciais independentes;
 • Indemnização: viabilizar a indemnização plena e efectiva às vítimas e às suas famílias, em cinco formas: a restituição, a compensação, a reabilitação, a satisfação e através de garantias de não repetição.

 A organização afirma que a tortura e os desaparecimentos forçados são crimes que ao abrigo do Direito Internacional não prescrevem e não podem ser vistos como actos políticos. Justiça e indemnizações para as vítimas de abusos dos Direitos Humanos cometidos no passado são um meio essencial para erradicar as violações dos Direitos Humanos e trazer paz às vítimas e aos seus familiares. Manobras e negociações políticas não devem colocar em risco esta realidade.

 A Amnistia Internacional congratula-se com as promessas realizadas pelo Governo brasileiro em divulgar todos os arquivos militares relevantes, principalmente aqueles relacionados com os casos de desaparecimento. A organização também pediu às autoridades para garantirem que os advogados que representam o Estado brasileiro deixem de proteger os responsáveis por violações dos direitos humanos no passado, recorrendo à lei de Amnistia de 1979, uma vez que todos os esforços devem ser feitos para desafiar as interpretações desta lei que têm sustentado a impunidade. 

Informação Adicional

 De 1964 a 1985, o Brasil foi governado por um regime militar, que chegou ao poder após um golpe que derrubou o presidente João Goulart. Durante o regime, centenas de activistas políticos, dirigentes sindicais, membros de ordens religiosas, bem como grupos da oposição desapareceram, foram arbitrariamente detidos, torturados e muitos chegaram mesmo a ser executados. O Brasil tem ficado atrás do resto da região na investigação destes crimes, utilizando uma interpretação polémica da lei de Amnistia 1979, em vigor no país, para proteger os responsáveis do regime por homicídios e práticas de tortura.

 A apresentação foi feita ao Supremo Tribunal Federal (STF) do país para contestar a interpretação de que a tortura, os desaparecimentos e execuções extrajudiciais cometidos por membros do regime foram actos políticos e, portanto, estão sujeitos a amnistia por parte da lei. A decisão ainda está pendente.

 As tentativas do Governo Federal para oferecer acesso limitado aos últimos arquivos militares e para identificar a localização de membros de um grupo armado da oposição, alegadamente executado pelo Exército no Araguaia, no Pará até agora têm sido rejeitadas por algumas vítimas e pelas suas famílias, uma vez que não fornecem total transparência e justiça. Alguns prisioneiros políticos do período de regime militar já receberam indemnizações.

 Em 2006, uma comissão especial sobre Homicídios e Desaparecimentos Políticos publicou um relatório intitulado “O direito à memória e à verdade”. No entanto, a 18 de Dezembro de 2009, o Governo brasileiro recorreu ao Tribunal Interamericano dos Direitos Humanos para encerrar o processo sobre o desaparecimento de activistas da oposição armada no Araguaia.

 O princípio VII dos princípios básicos e orientações sobre o direito a recurso e a indemnização por parte das vítimas de violações graves do Direito Internacional dos Direitos Humanos e do Direito Humanitário Internacional explica:

 Indemnizações para vítimas de violações graves do Direito Internacional dos Direitos Humanos e do Direito Internacional Humanitário inclui o direito da vítima para o seguinte, como previsto no Direito Internacional: (a) acesso efectivo e igualitário à justiça, (b) reparação adequada, efectiva e rápida do dano causado; (c) acesso a informação relevante que diga respeito às violações e a mecanismos de indemnização.

 Com relação ao passado de violações dos direitos humanos, os estados devem garantir que a verdade seja revelada, que seja feita justiça e que a indemnização seja garantida a todas as vítimas. Nesse sentido, verdade, justiça e reparação são três aspectos da luta contra a impunidade.

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