5 Maio 2024

 

  • No Dia da Mãe, a Amnistia Internacional homenageia as mães que não podem celebrar este dia com os seus filhos. Mães que estão presas de forma injusta e que sobrevivem em condições miseráveis; mães impedidas de manter a sua família segura; mães cujos filhos nunca mais lhes voltarão a casa.

 

A organização de direitos humanos lembra os casos das mães Narges Mohammadi, Ana Maria Santos Cruz, Dorgelesse Nguessan e, ainda, as “Mães de Sábado”, destacando como é possível qualquer pessoa juntar-se ao apelo por justiça, verdade e reparação para estas mulheres. Neste dia, que deveria ser de alegria e festejo em família, uma assinatura pode mostrar a estas mães que a sua história não foi, nem será, esquecida.

 

A mãe Narges Mohammadi

Narges Mohammadi é uma mãe e ativista iraniana, vencedora do prémio Nobel da Paz de 2023 e considerada pela Amnistia Internacional uma prisioneira de consciência. Há mais de 14 anos que enfrenta represálias das autoridades iranianas pelo seu trabalho em prol dos direitos humanos, tendo sido condenada a várias penas de prisão injustas. Na prisão, foi submetida a tortura e a outros maus-tratos pelas autoridades que, repetidamente, lhe têm também dificultado o acesso a cuidados de saúde. Na cerimónia de entrega do Nobel da Paz, o prémio foi recebido, em Oslo, pelos seus filhos que Narges não vê há vários anos. Kiana Rahmani, filha de Narges, referiu na altura: “Acho que nunca mais a vou ver”.

“Acho que nunca mais a vou ver”

Kiana Rahmani, filha de Narges

Narges Mohammadi enfrenta mais de dez anos de pena de prisão, resultantes de várias condenações pelo seu ativismo pacífico. Chegou a ser libertada em 2022, após uma campanha da Amnistia Internacional que apelava à sua libertação, mas voltou a ser detida. Mais recentemente, no início de agosto de 2023, condenaram-na a mais um ano de prisão por “espalhar propaganda contra o sistema” devido a documentos que escreveu no interior da prisão e que se tornaram públicos, detalhando a violência sexual contra mulheres manifestantes detidas durante a revolta “Mulher Vida Liberdade”. Narges tem um problema cardíaco e uma doença pulmonar que se carateriza por dificuldades respiratórias, mas ao longo dos seus períodos na prisão, tem-lhe sido negado e/ou atrasado o seu acesso aos cuidados de saúde adequados.

A Amnistia Internacional tem disponível uma petição que pede a libertação imediata da ativista e a retirada de todas as acusações contra si. Neste Dia da Mãe, assinar a petição pela liberdade de Narges é contribuir para a justiça e para o reencontro familiar há muito esperado.

 

Narges Mohammadi

 

A mãe Ana Maria Santos Cruz

Ana Maria Santos Cruz é mãe de três filhos – David, Pedro Henrique e Mariana. No entanto, Pedro Henrique (ativista brasileiro e defensor da justiça racial e dos direitos humanos) foi morto a 27 de dezembro de 2018, quando três homens encapuzados invadiram a sua casa e o alvejaram oito vezes na cabeça e no pescoço. Desde então, apesar das contínuas ameaças que lhe são dirigidas, esta mãe não desiste da sua luta por uma investigação e julgamento independentes e rigorosos, capazes de responsabilizar os envolvidos no assassinato do seu filho.

Esta mãe é também uma defensora dos direitos humanos. O seu passatempo preferido é escrever e ouvir música. A sua música preferida é a “Filho do Leão” dos Planta e Raiz, em que algumas frases até podem agora fazê-la lembrar de Pedro Henrique:“Alucinado pra cumprir a missão. Levar adiante o bem pra essa geração” e “No travesseiro quando deita a cabeça. Ele tem sonhos de um mundo melhor”.

“No travesseiro quando deita a cabeça. Ele tem sonhos de um mundo melhor”

Música 'Filho do Leão' dos Planta e Raiz, a preferida de Ana Maria

O ativismo de Pedro Henrique foi visto com maus olhos pelas autoridades. Além das intimidações policiais que lhe eram dirigidas, a polícia começou a controlar os seus movimentos. Entre 2013 e 2018, o ativista apresentou ao Ministério Público do Estado da Bahia pelo menos cinco denúncias relativas a ameaças e agressões de que foi vítima. A sua última queixa foi contra dois polícias que, segundo Pedro Henrique, o abordaram de forma violenta, tendo-o pontapeado, esbofeteado, esmurrado e ameaçado. As suas queixas não foram devidamente investigadas, e o Ministério Público só abriu um inquérito dois anos e cinco meses depois de o ativista ter sido morto.

O ativista vivia com a sua namorada, que se encontrava a descansar com ele na noite em que foi morto e que, posteriormente, veio a reconhecer os três homens como pertencentes à polícia. Os agentes suspeitos pelo assassinato de Pedro Henrique foram indiciados em 2019 mas, cinco anos depois, continuam a exercer a sua atividade profissional. É por este histórico de abusos policiais sofridos pelo filho, pela impunidade da atuação policial, pela desconsideração das denúncias feitas por Pedro Henrique que Ana Maria não deixa de criticar e denunciar a ação policial através das redes sociais e em entrevistas. A mãe de Pedro Henrique enfrenta já seis ações judiciais movidas por oficiais da polícia militar que pretendem usar os tribunais para restringir o seu direito à liberdade de expressão e para a silenciar.

Não é possível devolver o filho a esta mãe. Mas é possível pressionar (com a assinatura na petição aqui) para que a impunidade em torno da morte de Pedro Henrique possa terminar e Ana Maria possa ter a verdade, justiça e reparação que merece.

 

Ana Maria Santos Cruz

 

A mãe Dorgelesse Nguessan

Dorgelesse é uma mãe solteira dos Camarões e há vários anos que passa este Dia da Mãe atrás das grades de forma injusta. Foi presa por participar pacificamente na sua primeira manifestação. A Amnistia Internacional tem apelado continuamente para a sua libertação, para que esta mãe se possa juntar à sua família, que depende dela para sobreviver. O seu caso pode ser conhecido aqui, onde também é possível assinar uma petição dirigida ao presidente dos Camarões que pede a sua libertação imediata.

Dorgelesse é uma mulher empreendedora e cabeleireira, que sempre sonhou em ter o seu próprio salão de beleza. Estava a preparar-se para que o seu negócio também integrasse um serviço de manicure, quando foi detida e deixou este sonho por cumprir. A 22 de setembro de 2020, as suas preocupações sobre o estado da economia do país motivaram-na a participar na sua primeira e única manifestação. Pouco depois da manifestação começar, as forças de segurança dos Camarões dispararam balas de borracha e gás lacrimogéneo, recorreram a canhões de água para dispersar os manifestantes e procederam à detenção de várias pessoas, entre as quais, Dorgelesse. Esta mãe foi levada para a esquadra e ficou numa cela com outras 22 pessoas em condições deploráveis.

A 22 de setembro de 2020, as preocupações de Dorgelesse sobre o estado da economia do país motivaram-na a participar na sua primeira e única manifestação, onde foi detida

Dorgelesse foi acusada de “insurreição, reunião, encontros e manifestações públicas” e julgada num tribunal militar, numa clara violação ao artigo 14º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos que os Camarões ratificaram. A 7 de dezembro de 2021, acabou por ser condenada a cinco anos de prisão e, apesar de já ter apresentado vários recursos desta decisão, nenhum foi ainda bem-sucedido. Atualmente, Dorgelesse vive em constante preocupação e desespero com a sua família, já que ela se responsabilizava pelo sustento dos familiares. O seu filho sofre de anemia falciforme e a família enfrenta sérias dificuldades para conseguir pagar a medicação de que precisa.

 

Dorgelesse Nguessan

 

As “Mães de Sábado”

Há quase 30 anos que as Mães de Sábado têm procurado incansavelmente saber o paradeiro dos seus familiares, vítimas de desaparecimentos forçados na Turquia nas décadas de 80 e 90. Desde maio de 1995, este grupo de manifestantes, maioritariamente composto por mulheres (algumas nos seus 80 anos), ficou conhecido como “Mães de Sábado”. O grupo tem organizado vigílias pacíficas semanais em Istambul (na Praça de Galatasaray), apelando por justiça para os familiares. Pedem ainda que as autoridades expliquem e sejam responsabilizadas pelo que aconteceu aos seus entes queridos.

Durante todos estes anos, cada Dia da Mãe tem sido marcado por uma revolta cada vez maior, de quem não sabe se algum dia conhecerá a realidade que enfrentaram os seus filhos e familiares. As “Mães de Sábado” são o símbolo da manifestação pacífica mais longa da história da Turquia e também da luta contra as restrições ilegais que foram impostas ao direito à reunião pacífica no país.

Testemunho de Emine Ocak, mãe de Hasan Ocak que desapareceu em 1995: “Nós vimos até aqui e sentamo-nos, em paz. As mães vêm para falar sobre os seus filhos perdidos. Irmãos e irmãs perguntam pelo túmulo para que possam chorar… As autoridades deviam responder a esta pergunta: porque é nos fizeram isto? Quem é que ferimos?

“Nós vimos até aqui e sentamo-nos, em paz. As mães vêm para falar sobre os seus filhos perdidos”

Emine Ocak

A 25 de agosto de 2018 (na 700ª vigília deste grupo), tudo mudou. A manifestação pacífica foi interrompida pela violenta intervenção da polícia, que usou gás lacrimogéneo e canhões de água para dispersar a multidão. Dezenas de participantes foram detidos e 46 pessoas, incluindo familiares das vítimas, foram injustamente acusadas de participarem numa “manifestação ilegal”, ao abrigo da Lei sobre Reuniões e Manifestações. O julgamento injusto e sem provas destas 46 pessoas continua até hoje, tal como a proibição de manifestações na Praça de Galatasaray que, desde 2018, se encontra vedada por barreiras da polícia.

Qualquer pessoa pode assinar uma petição com estes apelos aqui, contribuindo para que a verdade e justiça possam chegar até estas mães e que as vigílias possam, de novo, ocorrer em segurança, sem restrições ilegais e ameaças.

 

Hanım Tosun, uma das “Mães de Sábado”

 

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