4 Abril 2023

 

  • Conclusões do Comité Europeu para a Prevenção da Tortura evidenciam uso generalizado de violência, intimidação, detenção prolongada e práticas equivalentes a tortura contra migrantes e refugiados

O Comité Europeu para a Prevenção da Tortura (CPT), um organismo do Conselho da Europa, concluiu que as autoridades europeias recorreram a práticas que equivalem a tortura no tratamento a migrantes e refugiados que procuravam atravessar as fronteiras da União Europeia (UE). As constatações daquele que é o principal organismo anti-tortura da Europa reforçam os apelos para uma mudança urgente no trato dos migrantes, mais solidária e humana.

O relatório divulgado pelo CPT revela o uso generalizado de violência, intimidação e detenção prolongada, identificando “padrões claros de maus-tratos físicos” contra pessoas no contexto de operações de pushback (retornos forçados de refugiados e migrantes por uma fronteira). É também salientado um comportamento de desrespeito persistente pelas garantias legais básicas e pelo direito ao asilo em toda a Europa.

“Este relatório é mais uma prova das tantas evidências já encontradas que comprovam as violações graves e sistemáticas de direitos humanos perpetradas pelas autoridades contra migrantes e refugiados nas fronteiras dos Estados europeus. As conclusões do CPT corroboram os testemunhos de milhares de pessoas que foram vítimas de violência nas fronteiras terrestres e marítimas da Europa”, esclarece Eve Geddie, Chefe do Gabinete Europeu da Amnistia.

“As conclusões do CPT corroboram os testemunhos de milhares de pessoas que foram vítimas de violência nas fronteiras terrestres e marítimas da Europa”

Eve Geddie

São identificadas tendências gerais nas fronteiras da Europa, embora o relatório não especifique os países onde as mesmas têm lugar. O CPT cita casos em que os migrantes foram agredidos pelas autoridades, guardas fronteiriços e outros agentes da lei com bastões ou disparos acima das suas cabeças. Estas autoridades forçaram os migrantes a entrar em rios gelados com as mãos atadas, obrigaram-nos a andar descalços, em roupa interior ou mesmo nus nas zonas fronteiriças, e recorreram a cães treinados para os ameaçar e perseguir.

Estas práticas cruéis e ilegais pelas autoridades nacionais, utilizadas regularmente em circunstâncias de retornos sumários ilegais ou operações de pushback, têm o objetivo de evitar que pessoas em necessidade de proteção internacional cheguem aos seus países. As deduções do CPT sobre a natureza enraizada destes abusos são corroboradas pela investigação da Amnistia Internacional nas fronteiras da Europa, mais recentemente, em Espanha, na Croácia, na Polónia, na Lituânia, e na Letónia.

Este relatório é lançado quando o Parlamento lituano está atualmente a debater um projeto de lei que visa legalizar os pushbacks no âmbito da sua legislação nacional. Se for aprovada, esta medida irá impedir a possibilidade de proteção internacional para pessoas que tenham atravessado a fronteira do país de forma irregular, obrigando-as a regressar, à força, a locais onde poderão enfrentar o risco de tortura.

Desde o verão de 2021, a Lituânia, Polónia e Letónia invocaram os estados de emergência para legalizar a recorrência constante aos pushbacks nas suas fronteiras com a Bielorrússia, expondo um grande número de migrantes e refugiados à violência física, aos regressos sumários e às condições de detenção desumanas. Neste período, pelo menos 37 pessoas morreram na fronteira da Bielorrússia com a Polónia, havendo mais vítimas mortais na fronteira com a Letónia e a Lituânia.

As conclusões do CPT de que, por norma, as autoridades não investigaram devidamente as alegações de tortura, maus-tratos e outros abusos levados a cabo nas operações fronteiriças, refletem as anteriores provas da Amnistia Internacional.

“A tamanha violência e intimidação detalhadas neste relatório são, infelizmente, demasiado familiares. A falta de responsabilização pelas graves violações de direitos humanos permitem a perpetuação deste ciclo de violência. Este modo de atuação é um desrespeito flagrante pelas vidas das pessoas que procuram proteção por parte dos países europeus” realça Eve Geddie.

“A falta de responsabilização pelas graves violações de direitos humanos permitem a perpetuação deste ciclo de violência”

Eve Geddie

“Há uma necessidade urgente de assegurar investigações céleres e independentes das denúncias de alegações deste tipo de violência. É também fundamental responsabilizar os perpetradores e estabelecer mecanismos consistentes e independentes de monitorização das fronteiras”.

 

Contexto

Em março de 2022, a Amnistia Internacional relatou como centenas de refugiados e migrantes, entre os quais famílias com crianças pequenas, ficaram retidos na floresta entre a Bielorrússia e a Polónia, procurando sobreviver sob temperaturas negativas, sem abrigo, comida, água ou cuidados médicos. Estas pessoas enfrentaram repetidos e violentos pushbacks por parte dos guardas fronteiriços polacos que dispararam balas reais por cima das suas cabeças e recorreram a cães da polícia sem açaime para os forçar a entrar em rios e pântanos gelados.

As autoridades fronteiriças da Letónia e da Lituânia submeteram refugiados e migrantes a abusos semelhantes nas suas fronteiras, realizando ataques cruéis e desnecessários com bastões ou tasers. Há casos de migrantes e refugiados que foram atingidos com pedras e balas de borracha, ou espancados quando se deitavam no chão semiconscientes após terem sido atingidos com gás lacrimogéneo num espaço fechado.

A repressão violenta por parte das autoridades espanholas e marroquinas em Melilla, em 2022, resultou em, pelo menos, 37 mortos e dezenas de feridos. Algumas pessoas que tinham conseguido chegar a território espanhol foram imediatamente expulsas pelos guardas fronteiriços espanhóis, sem um processo adequado para avaliar os riscos para a sua segurança. Em alguns casos, foram ignoradas as necessidades de cuidados médicos destes migrantes.

Em 2022, a Amnistia Internacional relatou como as autoridades polacas detiveram milhares de requerentes de asilo que atravessaram o país vindos da Bielorrússia. Muitas destas pessoas foram sujeitas a abusos, incluindo sedação forçada, em instalações superlotadas e sem condições dignas.

Na Letónia, a Amnistia Internacional descobriu que, além dos violentos pushbacks, as autoridades fronteiriças detiveram arbitrariamente refugiados e migrantes em locais secretos na floresta, confiscando, com regularidade, os seus telefones – uma prática que pode equivaler a desaparecimento forçado. Em alguns casos, as pessoas só podiam abandonar a zona fronteiriça depois de concordarem em regressar aos seus países “de forma voluntária”, frequentemente após longos períodos na floresta, ou depois de sofrerem agressões ou ameaças físicas. Outras pessoas foram enganadas ou forçadas a assinar papéis que atestavam o seu regresso, depois de serem transferidas para instalações de detenção ou esquadras da polícia.

Agir Agora

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