21 Abril 2021

 

  • Egito triplicou o número de execuções anuais
  • A China utilizou a pena de morte para reprimir infrações relacionadas com os esforços de prevenção da Covid-19
  • A anterior administração dos EUA executou dez pessoas em menos de seis meses em 2020
  • Pelo terceiro ano consecutivo, 2020 foi o ano com menos execuções na última década.

Os desafios sem precedentes da pandemia de Covid-19 não foram suficientes para dissuadir a realização de execuções por 18 países em 2020, referiu hoje a Amnistia Internacional no seu relatório sobre a pena de morte em 2020. Ainda que tenha existido uma tendência geral de declínio, alguns países continuaram ou até aumentaram o número de execuções praticadas, o que revela um terrível desrespeito pela vida humana numa altura em que a atenção mundial se focava na proteção das pessoas contra um vírus mortal.

“Enquanto o mundo se concentrava em encontrar formas de proteger vidas da Covid-19, vários governos mostraram uma determinação perturbadora em recorrer à pena de morte e executar pessoas acontecesse o que acontecesse.”

Agnès Callamard, Secretária-Geral da Amnistia Internacional

Nos países executores de 2020 encontra-se o Egito que triplicou o seu número anual de execuções em relação ao ano anterior; e a China, que anunciou uma repressão dos crimes que afetassem os esforços de prevenção da Covid-19, resultando na condenação e execução de, pelo menos, um homem. Ao mesmo tempo, a Administração Trump retomou as execuções federais depois de um hiato de 17 anos e condenou à morte dez homens em menos de seis meses. A Índia, Omã, Qatar e Taiwan também retomaram as execuções.

“Lutar contra uma execução é já difícil no melhor dos tempos, mas a pandemia fez com que muitas pessoas no corredor da morte não pudessem ter acesso a uma representação legal presencial e muitos dos que pretendiam prestar apoio tiveram de se expôr a riscos consideráveis – mas absolutamente evitáveis – para a saúde.”

Agnès Callamard, Secretária-Geral da Amnistia Internacional

“A pena de morte é um castigo abominável e a prossecução de execuções no meio de uma pandemia realça, mais ainda, a sua crueldade inerente. Lutar contra uma execução é já difícil no melhor dos tempos, mas a pandemia fez com que muitas pessoas no corredor da morte não pudessem ter acesso a uma representação legal presencial e muitos dos que pretendiam prestar apoio tiveram de se expôr a riscos consideráveis – mas absolutamente evitáveis – para a saúde. O recurso à pena de morte nestas condições é um ataque particularmente flagrante aos direitos humanos”, disse Agnès Callamard, Secretária-Geral da Amnistia Internacional.

As restrições da Covid-19 trouxeram repercussões ao acesso a aconselhamento jurídico e ao direito a um julgamento justo em vários países, incluíndo os EUA, onde advogados de defesa afirmaram serem incapazes de realizar trabalho essencial de investigação ou de se encontrar pessoalmente com os clientes.

 

Os 5 principais países executores

A China classifica o número total das suas execuções e sentenças de morte como Segredo de Estado e impede o escrutínio independente. Por conseguinte, os números da Amnistia Internacional para todas as execuções conhecidas não incluem as realizadas neste país. Ainda assim, acredita-se que a China execute milhares de pessoas todos os anos, o que a torna, uma vez mais, no executor mais prolífico do mundo, à frente do Irão (246+), Egito (107+), Iraque (45+) e Arábia Saudita (27). O Irão, Egipto, Iraque e Arábia Saudita foram responsáveis por 88% de todas as execuções conhecidas em 2020.

O Egito triplicou o número de execuções anuais e tornou-se o terceiro executor mais frequente do mundo em 2020. Pelo menos 23 das pessoas executadas foram condenadas à morte em casos relacionados com violência política, após julgamentos extremamente injustos, marcados por “confissões” forçadas e outras graves violações de direitos humanos, nomeadamente tortura e desaparecimentos forçados. Em outubro e novembro, existiu um pico de execuções, onde as autoridades egípcias executaram pelo menos 57 pessoas – 53 homens e quatro mulheres.

No Irão, embora as execuções registadas tenham continuado a ser inferiores às dos anos anteriores, o país utilizou cada vez mais a pena de morte enquanto arma de repressão política contra dissidentes, manifestantes e membros de grupos étnicos minoritários, em violação do direito internacional.

Muitos países na região Ásia-Pacífico continuaram a violar o direito internacional e as normas que proíbem o uso da pena de morte para crimes que não envolvam a morte intencional. No entanto, a pena de morte foi decretada para delitos relacionados com droga na China, Indonésia, Laos, Malásia, Singapura, Sri Lanka, Tailândia e Vietname; para corrupção na China e Vietname; e para blasfémia no Paquistão. No Bangladesh e no Paquistão, as penas de morte foram impostas por tribunais estabelecidos através de legislação especial e que seguem, geralmente, procedimentos distintos dos tribunais comuns. Nas Maldivas, cinco pessoas com idade inferior a 18 anos na altura da ocorrência do crime, permaneceram sentenciadas à pena de morte.

Os EUA foram o único país do continente americano a realizar execuções em 2020. Em julho, a Administração Trump realizou a primeira execução federal em 17 anos, e cinco estados condenaram sete pessoas à morte entre eles.

 

Execuções atingem o número mais baixo numa década

A nível global, pelo menos 483 pessoas foram executadas em 2020 (excluindo os países que classificam os dados da pena de morte como Segredo de Estado ou para os quais há informação limitada disponível – China, Coreia do Norte, Síria e Vietname). Por mais chocante que este número seja, é, ainda assim, o mais baixo de execuções registadas pela Amnistia Internacional em pelo menos uma década. Representa um decréscimo de 26% em comparação a 2019 e de 70% relativamente ao pico de 1.634 execuções em 2015.

Segundo o relatório, a queda nas execuções deveu-se a uma redução das mesmas em alguns países que ainda aplicam a pena de morte e, em menor medida, a alguns hiatos nas execuções que ocorreram em resposta à pandemia.

As execuções registadas diminuíram 85% na Arábia Saudita, de 184 em 2019 para 27 em 2020, e mais de metade no Iraque, de 100 em 2019 para 45 em 2020. Não foram registadas execuções no Bahrein, Bielorrússia, Japão, Paquistão, Singapura e Sudão – países que as aplicaram em 2019.

O número de penas de morte que se sabe terem sido impostas em todo o mundo (pelo menos 1.477) decresceu também em 36% comparativamente a 2019. A Amnistia Internacional registou diminuições em 30 dos 54 países nos quais tinham sido impostas sentenças de morte. Estas diminuições parecem estar associadas, em vários casos, a atrasos e adiamentos nos processos judiciais, devido à pandemia.

Exceção foi a Indonésia, cujo número de condenações à morte em 2020 (117) aumentou 46% relativamente a 2019 (80); e também a Zâmbia, que impôs 119 condenações à morte em 2020, mais 18 do que em 2019, tendo sido o valor mais elevado registado na África Subsariana.

 

Tempo para abolir a Pena de Morte

Em 2020, o Chade e o estado norte-americano do Colorado aboliram a pena de morte, o Cazaquistão comprometeu-se a aboli-la ao abrigo do direito internacional e os Barbados concluíram reformas para revogar a pena de morte obrigatória.

“Apesar da prossecução contínua da pena de morte por parte de alguns governos, o quadro geral em 2020 foi positivo.”

Agnès Callamard, Secretária-Geral da Amnistia Internacional

Até abril de 2021, 108 países aboliram a pena de morte para todos os crimes e 144 países aboliram-na na lei ou na prática – uma tendência que deve continuar.

“Apesar da prossecução contínua da pena de morte por parte de alguns governos, o quadro geral em 2020 foi positivo. O Chade aboliu a pena de morte, juntamente com o estado norte-americano do Colorado, e o número de execuções conhecidas continuou a diminuir – aproximando o mundo da remissão do castigo mais cruel, desumano e degradante dos livros de história”, disse Agnès Callamard.

“Com 123 estados – mais do que nunca – a apoiar o apelo da Assembleia Geral das Nações Unidas para uma moratória sobre as execuções, cresce a pressão sobre outros países para que sigam o exemplo. Virgínia tornou-se, recentemente, o primeiro estado norte-americano a revogar a pena de morte, enquanto vários projetos de lei para a abolir a nível federal dos EUA, estão pendentes no Congresso. À medida que a viagem para a abolição global da pena de morte continua, apelamos ao Congresso dos EUA para que apoie os esforços legislativos para eliminar a pena de morte.”

“Pedimos aos líderes de todos os países que ainda não revogaram esta pena, a fazerem de 2021 o ano em que acabam definitivamente com os assassinatos sancionados pelo Estado. Continuaremos a fazer campanha até que a pena de morte seja abolida em todo o lado, de uma vez por todas”, concluiu Agnès Callamard.

 

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