14 Abril 2017

As autoridades do estado norte-americano do Arcansas têm de suspender prontamente a série de execuções iminentes de oito pessoas condenadas à morte, sete das quais em risco de serem executadas num período de 11 dias, a partir de 17 de abril, exorta a Amnistia Internacional, sustentando existirem questões legais preocupantes nestes casos e alertando que dois dos homens que enfrentam a pena capital sofrem profundos distúrbios mentais.

No estado do Arcansas não foram feitas nenhumas execuções ao longo de mais de uma década, mas as autoridades planeiam executar duas pessoas por dia nos próximos dias 17, 20 e 24 de abril e ainda outra a 27 de abril, porque o suprimento que dispõem do sedativo Midazolam, cujo uso no composto da injeção letal é extremamente controverso, tem data de validade a expirar no final do mês de abril.

“O agendamento destas execuções em datas tão próximas umas das outras não tem precedentes na história moderna dos Estados Unidos. Quatro meses apenas depois de os Estados Unidos terem registado o mais baixo total de execuções em 25 anos, o Arcansas está a preparar-se para contrariar esta tendência positiva numa corrida vergonhosa para se adiantar à data do fim de validade de uma droga”, critica a diretora da Amnistia Internacional para as Américas, Erika Guevara-Rosas.

A perita da organização de direitos humanos lembra que “não é tarde demais para o Arcansas suspender estas execuções”. “Esta ‘esteira rolante’ de morte, que está prestes a arrancar, demonstra com clareza como a morte sancionada pelo Estado está desalinhada do resto do mundo, em declínio global, conforme mais e mais governos, e mesmo estados norte-americanos, reconhecem [a pena de morte] como o anacronismo cruel que é”, prossegue.

Vaga de mortes sancionadas pelo Estado

As execuções de Don Davis e de Bruce Ward estão agendadas para 17 de abril. As de Ledell Lee e de Stacey Johnson para 20 de abril. As de Marcel Williams e de Jack Jones para 24 de abril. A de Kenneth Williams para 27 de abril. E, apesar de um juiz federal ter bloqueado a execução de Jason McGehee, também este homem está sob a ameaça de execução iminente, mesmo que não na data marcada originalmente para 27 de abril.

A Amnistia Internacional continua a apelar ao governador do Arcansas, Asa Hutchinson, para que comute as sentenças de morte de todos os oito homens.

Em alguns destes casos, falhas legais nos processos resultaram em julgamentos nos quais os jurados não receberam a informação necessária sobre as pessoas que os procuradores lhes pediam que condenassem à morte. Noutros, os presos têm diagnósticos de profundas deficiências mentais, o que significa que as suas execuções violam a lei internacional.

É o caso, por exemplo, do julgamento de Jack Jones, em que o júri não foi informado que lhe fora diagnosticado distúrbio bipolar pouco antes do crime cometido. E a Bruce Ward, que se encontra há mais de 25 anos no corredor da morte, foi diagnosticada esquizofrenia paranoide repetidas vezes, em 2006, 2010, 2011 e 2015 – o médico deste preso descreveu em julgamento os seus delírios de perseguição e de grandeza, defendendo que Ward não tem compreensão racional da pena que lhe foi pronunciada.

Executar alguém que não consegue compreender a razão, ou a realidade, da pena é uma violação da Constituição dos Estados Unidos. A execução de pessoas com deficiências mentais é também e claramente proibida na lei internacional.

No caso de Marcel Williams, o júri foi mantido totalmente no desconhecimento sobre a pobreza paupérrima, a privação e os abusos por que passou na infância. O único juiz que teve em conta estas circunstâncias concluiu que os advogados de Marcel Williams tinham falhado em toda a linha no seu dever de defesa do arguido em julgamento.

“Analisados no seu conjunto, estes casos podem servir de guia explicativo dos problemas sobre a pena de morte: arbitrariedade, representação legal inadequada, táticas de acusação questionáveis e discriminação racial e económica, tudo isto desempenhou um papel pesado nesta série de sentenças de pena de morte”, frisa Erika Guevara-Rosas.

A diretora da Amnistia Internacional para as Américas sustenta também que “o debate sobre o uso da injeção letal não se pode limitar a uma questão de afinação do processo de execução”. “A ideia de que a morte de um ser humano cometida pelo Estado de forma premeditada e a sangue-frio possa alguma vez ser ‘humana’ é um mito. E é mais do que chegada a hora de os Estados Unidos se juntarem à tendência global abolicionista”, exorta ainda.

Oito execuções marcadas para 11 dias

Estas oito execuções foram agendadas, a 27 de fevereiro passado, pelo governador Asa Hutchinson para serem feitas durante um período de 11 dias em abril de 2017.

A 6 de abril, o conselho técnico de liberdade condicional e suspensão de penas votou favoravelmente uma recomendação segundo a qual o governador do Arcansas deve comutar a sentença de morte de Jason McGehee, cuja execução está marcada para 27 de abril. Naquele mesmo dia, um juiz de um tribunal federal de primeira instância emitiu uma ordem judicial que impede as autoridades do Arcansas de levarem a cabo a execução antes de o governador tomar uma decisão sobre a recomendação que lhe foi feita pela comissão técnica – para o que corre um prazo de 30 dias desde a emissão desse mesmo parecer. É desconhecido neste momento se os procuradores do Arcansas vão recorrer da ordem do tribunal.

O Relatório Anual sobre a Pena de Morte no mundo em 2016, publicado pela Amnistia Internacional na passada terça-feira, 11 de abril, mostrou que os Estados Unidos, pela primeira vez desde 2006, não integravam o grupo dos cinco países que mais execuções fazem. Acresce que, em 2016, os Estados Unidos registaram o mais baixo número de execuções no país em 25 anos.

A última execução a ser feita no estado do Arcansas – e 27ª desde 1977 – ocorreu a 28 de novembro de 2005. Se as autoridades deste estado norte-americano fizerem as oito execuções agendadas para abril, somarão, em uma só semana e meia, 30% ao seu total de mortes judiciais nas últimas quatro décadas. E estarão a matar nesses 11 dias quase um quarto da atual população nos corredores da morte das prisões no Arcansas.

As execuções estiveram suspensas neste estado norte-americano devido a uma série de condicionantes sobre a injeção letal. E assim que expirar a data de validade do suprimento de Midazolam de que as autoridades dispõem atualmente, tornar-se-á extremamente difícil obterem mais, dadas as preocupações e objeções existentes sobre o papel que o sedativo teve em execuções recentes, submetendo os condenados a prolongadas horas de sofrimento. Em várias ocasiões foi documentado que os presos a quem foi administrado aquele sedativo tiveram dificuldades respiratórias e se retorceram em agonia durante muito tempo antes de morrerem.

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