14 Novembro 2023

A Amnistia Internacional considerou que é vital um acordo na cimeira ambiental COP28 que permita acabar com a produção e utilização de combustíveis fósseis, de forma a evitar uma catástrofe climática global e impedir a escalada de uma crise de direitos humanos sem precedentes que ameaça os direitos de milhares de milhões de pessoas.

A organização publicou o briefing “Combustíveis Fatais”, no qual defende a necessidade de um acordo que promova uma eliminação progressiva, total, justa, rápida e financiada dos combustíveis fósseis, reforçando a importância da transição para as energias renováveis que respeite os direitos humanos e facilite o acesso de todos à energia.

“Se novos projetos de combustíveis fósseis forem avante, não conseguiremos limitar o aquecimento global neste século a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais e evitar consequências climáticas catastróficas. A COP28 é o evento ideal para os Estados concordarem em ultrapassar a era dos combustíveis fósseis e deixar para trás o seu vergonhoso historial de danos climáticos e abusos dos direitos humanos”, afirmou Candy Ofime, Assessora Jurídica da Amnistia Internacional para a Justiça Climática.

“A COP28 deve definir um rumo rápido e equitativo para um futuro sustentável livre de combustíveis fósseis”

Candy Ofime

“Os combustíveis fósseis são finitos e a tentativa de extrair até à última gota de petróleo, pé cúbico de gás fóssil ou tonelada de carvão, prolonga e agrava os enormes danos que já causaram. Existem alternativas e a produção de energias renováveis está a crescer rapidamente, mas é necessário muito mais investimento. A COP28 deve definir um rumo rápido e equitativo para um futuro sustentável livre de combustíveis fósseis”, sublinhou.

 

Uma crise sem precedentes

A extração e a queima de combustíveis fósseis e a consequente acumulação de gases com efeito de estufa (GEE) na atmosfera, nomeadamente o dióxido de carbono, são a principal causa do aquecimento global, que está a tornar mais frequentes e intensos os fenómenos meteorológicos extremos, como as tempestades, as secas e as inundações.

Esta situação está a provocar a perda de vidas humanas, danos em infraestruturas, destruição dos meios de subsistência, perturbação dos ecossistemas e redução da biodiversidade, bem como o fracasso das colheitas e escassez de alimentos, a intensificação da concorrência pelos recursos, os conflitos e as deslocações, todos eles associados a uma série de violações dos direitos humanos.

A poluição atmosférica diretamente relacionada com a combustão de combustíveis fósseis contribuiu para 1,2 milhões de mortes em 2020. As comunidades que vivem perto de instalações de combustíveis fósseis são muitas vezes diretamente prejudicadas por poluentes conhecidos por causarem doenças respiratórias, consequências adversas na gravidez, doenças cardiovasculares e certos tipos de cancro. A extração de carvão gera resíduos tóxicos que podem contaminar as fontes de água. A queima de gás liberta poluentes atmosféricos tóxicos.

As pessoas que vivem nas “zonas de sacríficio”, mais expostas a estes danos, já estão muitas vezes sujeitas a formas de discriminação que se cruzam.

A exploração, a produção e o transporte de combustíveis fósseis implicam frequentemente uma poluição e uma degradação ambiental devastadoras. Há décadas que a Amnistia Internacional documenta os derrames de petróleo e os danos daí resultantes sofridos pelas comunidades do delta do Níger, onde a Shell e outras empresas afetaram os direitos humanos das comunidades locais.

Os povos indígenas são afetados de forma desproporcionada porque grande parte dos recursos de combustíveis fósseis que restam no planeta estão situados nas suas terras ancestrais, e as empresas exploradoras infringem frequentemente os direitos destas comunidades à informação, à participação pública e ao consentimento livre, prévio e informado. Por exemplo, a Amnistia Internacional mostrou como as comunidades Adivasi, na Índia, são afetadas pela extração de carvão.

Nos últimos anos, os defensores dos direitos humanos no domínio do ambiente, incluindo os que se opõem à produção e utilização de combustíveis fósseis, têm sido cada vez mais visados e alguns assassinados por causa da sua ação. Algumas empresas de combustíveis fósseis têm procurado silenciar os defensores do clima através da utilização das chamadas “ações judiciais estratégicas contra a participação pública” (SLAPP).

Muitas empresas de combustíveis fósseis procuram moldar a opinião pública através do greenwashing e da desinformação, escapam à regulamentação através do lobby de legisladores e reguladores e influenciam fóruns multilaterais como as COP, o que pode atrasar as ações dos Estados para enfrentar a crise climática. A COP28 é presidida pelo Sultão Al Jaber, o presidente-executivo da empresa petrolífera estatal dos EAU, o que representa um claro conflito de interesses.

 

A necessidade da transição energética

O briefing “Combustíveis fatais” recomenda que todos os recursos de combustíveis fósseis atualmente inexplorados permaneçam no solo para sempre. Os países industrializados e outros países com elevadas emissões de gases com efeito de estufa do G20, bem como os estados produtores de combustíveis fósseis com elevados rendimentos, devem concordar em liderar rapidamente o caminho da transição energética. Além disso, deve haver uma redução significativa na extração de combustíveis fósseis para fins não energéticos, como a produção de plásticos.

Os vastos subsídios que os Estados gastam para apoiar a utilização e produção de combustíveis fósseis devem terminar através de um processo que garanta a existência de proteções sociais adequadas para proteger os mais pobres e os mais marginalizados.

Não se pode permitir que as empresas de combustíveis fósseis e de energia dependam de tecnologias não comprovadas, como a captura e armazenamento de carbono, que os seus lobistas frequentemente promovem, para atrasar a mudança. Devem abster-se de fazer lobby junto dos legisladores e de fazer greenwashing, o que torna mais difícil para o público o acesso a informações precisas sobre a crise climática.

As instituições financeiras devem parar de investir em novas atividades que impulsionam a expansão dos combustíveis fósseis e eliminar gradualmente o financiamento existente num prazo alinhado com a meta acordada internacionalmente para manter o aquecimento global abaixo de 1,5°C neste século.

Os países desenvolvidos, que são também os maiores emissores de gases com efeito de estufa, devem cumprir os seus compromissos de fornecer um financiamento climático adequado aos estados em desenvolvimento para alcançarem uma eliminação progressiva, equitativa e consistente com os direitos humanos, facilitando uma transição justa para fontes renováveis

 

Contexto

A cimeira climática COP28 decorre de 30 de novembro a 12 de dezembro e realiza-se no Dubai, nos Emirados Árabes Unidos (EAU), um dos maiores produtores mundiais de petróleo e gás. A Secretária-Geral da Amnistia Internacional, Agnès Callamard, estará presente entre os dias 1 e 6 de dezembro.

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